A economia brasileira criou menos vagas formais em 2012, mas o perfil delas não mudou. Assim como nos últimos quatro anos, a geração de postos de trabalho foi sustentada por empregos com baixa remuneração, que pagam até dois salários mínimos.
Segundo dados do Cadastro Geral de Empregados e Desempregados (Caged), que não incluem informações enviadas com atraso ao Ministério do Trabalho, foram abertas 1,3 milhão de vagas nesse grupo de renda de janeiro a dezembro. Como nas faixas salariais seguintes o saldo entre admitidos e demitidos foi negativo, o total de novos postos com carteira assinada no país somou apenas 868,2 mil no ano.
Esse balanço considera as informações encaminhadas ao Ministério do Trabalho no prazo regular, conhecida como série sem ajuste. Nas série que considera informações enviadas com atraso (com ajuste), o ano encerrou com saldo total de 1,3 milhão de novas vagas, mas o ministério não detalha a composição por faixa salarial.
Especialistas observam que os constantes reajustes do mínimo, que subiu 7,5% acima da inflação no ano passado, “empurram” boa parte dos trabalhadores para a base da pirâmide salarial. Mais importante do que esse movimento, no entanto, a estrutura ocupacional do país, dependente do setor de serviços, determina a má qualidade salarial dos novos empregos e seria, segundo esses analistas, um ponto negativo do mercado de trabalho, a despeito do desemprego nas mínimas históricas e do avanço acentuado do rendimento real dos ocupados – fatores que levam muitos economistas a enxergar uma situação próxima do “pleno emprego” no Brasil.
Caio Machado, da LCA Consultores, nota que, enquanto a indústria – setor que tradicionalmente paga salários mais altos – perde participação no Produto Interno Bruto (PIB) e, consequentemente, contrata menos, o setor terciário e a construção continuam aquecidos e na dianteira da criação de vagas formais, estrutura para a qual não vê perspectiva de grandes mudanças nos próximos anos. Em 2012, os serviços responderam por mais da metade do total de 1,3 milhão de novos postos criados, na série com ajuste, seguidos pelo comércio, com 28% das vagas, e pela construção civil (11%).
A indústria de transformação foi responsável por fatia bem menor do saldo total do Caged, de 6,6%, e se destacou como o ramo da economia com maior baixa de empregos formais ante 2011. Enquanto, na média, a geração líquida de postos foi 33% menor no ano passado, a diferença entre admitidos e demitidos nas fábricas encolheu 61%. “O aumento do mínimo foi muito forte em 2012, mas a composição do crescimento do emprego explica melhor a concentração de vagas nas faixas salariais mais baixas”, diz Machado.
Em que pese a maior participação dos serviços na criação de novos empregos, o pesquisador Rodrigo Leandro de Moura, do Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getulio Vargas (Ibre-FGV), avalia que o reajuste nominal de 14% do mínimo concedido no ano passado, assim como os índices observados nos anos anteriores, é o principal fator por trás da maior geração de ocupações com remuneração baixa, já que as correções provocam o efeito estatístico de aumentar o saldo de vagas nas camadas salariais inferiores.
Além de “distorções” causadas pela política de valorização do salário mínimo e do maior peso dos serviços na ocupação, o diretor-técnico do Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos (Dieese), Clemente Ganz Lúcio, afirma que o aumento da formalização também explica a geração mais expressiva de vagas com remuneração até dois mínimos. Com o recuo da informalidade, diz Lúcio, salários na base da pirâmide e indexados ao piso foram incorporados ao universo dos profissionais com carteira assinada.
De acordo com a Pesquisa Mensal de Emprego (PME), do IBGE, a proporção de empregados com registro em carteira na iniciativa privada saltou de 39,7% em 2003 para 49,2% em 2012 nas seis principais regiões metropolitanas do país. Nos últimos anos, o ritmo de avanço da formalização tem perdido ímpeto, mas, segundo economistas, a maior quantidade de ocupados com carteira assinada já é uma tendência consolidada no mercado de trabalho brasileiro. “Uma parte desses postos que aparecem no Caged é nova do ponto de vista do registro em carteira, mas eles já existiam antes como postos informais”, nota o diretor do Dieese.
Para João Saboia, professor do Instituto de Economia da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), o avanço da formalização e a política de ganhos reais do mínimo dão mais proteção aos trabalhadores, mas a oferta de empregos, fortemente concentrada em postos que pagam até dois mínimos, é um ponto negativo do mercado de trabalho brasileiro, que, no entanto, não deve mudar. “Enquanto a geração de empregos estiver concentrada em setores que tradicionalmente não pagam bem, e a indústria perder postos, não podemos esperar outra coisa.”
Ganz Lúcio, do Dieese, faz análise semelhante. Mesmo com os constantes reajustes do piso salarial acima da inflação, diz, o salário mínimo ainda é muito baixo. Com base no valor apurado pela cesta básica de janeiro, a entidade estima que o mínimo deveria ser de R$ 2.674,88 ao mês, quase quatro vezes o valor de R$ 678, que entrou em vigor no mês passado.