Déficit na balança de serviços é recorde em 2013

  • 30/01/2014

O crescimento do consumo interno na última década, a falta de empresas nacionais fazendo fretes no comércio exterior e a alta substancial de viagens para fora fizeram a balança de serviços do Brasil atingir ano passado o maior déficit registrado pelo Banco Central desde o início da elaboração da conta, em 1947. Em dez anos, o saldo negativo aumentou dez vezes e alcançou US$ 47,5 bilhões, cifra equivalente a mais da metade do déficit em transações correntes registrado em 2013.

Para este ano, a previsão é que o saldo negativo em serviços seja parecido com o do ano passado, mas com composição um pouco diferente. A Copa do Mundo deve ajudar a reduzir o déficit em turismo e as plataformas da Petrobras vão elevar as despesas com aluguel de bens.

Segundo analistas, fatores estruturais fizeram a atividade interna demandar mais serviços do exterior, ampliando o déficit, concentrado em 3 dos 14 segmentos da balança divulgada pelo BC. Transportes e aluguel de equipamentos respondem à dinâmica interna e são vistos como gargalos da economia revelados com o crescimento da última década. Por outro lado, o saldo negativo provocado pelas viagens internacionais representa vazamento da poupança interna para fora. O “tripé”, somado, registrou despesa de US$ 47,4 bilhões acima da receita em 2013.

O único segmento no qual o Brasil tem bom desempenho é o de serviços empresariais, com superávit de US$ 10 bilhões. O resultado pode ser atribuído à atuação de grandes construtoras nacionais no exterior. Serviços de arquitetura e engenharia prestados por subsidiárias, ou terceirizadas também brasileiras, a elas lá fora entram na conta como receita para a balança.

O segmento de transportes, que abriga principalmente custos de fretes com importações – que não são contabilizados na balança comercial – teve déficit de US$ 9,7 bilhões ano passado. Quatro anos antes, o saldo negativo era a metade desse valor. “O aumento das importações, forte nos últimos anos, e a falta de empresas nacionais que realizem esse serviço explicam o incremento. Quanto mais o país importa, maior o déficit em transportes”, diz Rafael Bistafa, economista da Rosenberg & Associados

Aluguel de equipamentos apresentou o pior resultado. O saldo negativo de US$ 19 bilhões dobrou em quatro anos, influenciado pelo crescimento da aviação comercial nacional e o uso de plataformas de petróleo.

Com o aumento da demanda por viagens, fruto do incremento da renda no país, as companhias do setor importaram aeronaves de fabricantes estrangeiros para acompanhar a demanda por meio de contratos de leasing. No caso das plataformas, para utilizar o benefício fiscal que o Repetro oferece a alguns setores da indústria, a Petrobras as embarca apenas no papel para subsidiárias no exterior via balança de bens.

Depois, são importadas pela matriz com contratos de aluguel, que entram na conta de serviços. As plataformas não deixam o país fisicamente, mas o movimento contábil garante o benefício fiscal, que, se ajuda as exportações em bens, aumenta as importações em serviços nesse caso. A estatal exportou US$ 7,7 bilhões em plataformas em 2013.

Francisco Pessoa, economista da LCA Consultores, afirma que apesar de o Banco Central não especificar quais dados formam os resultados dos setores, no fim do ano passado o peso dos aluguéis das plataformas já foi sentido na balança. O impacto total, contudo, será percebido neste ano. Nos anos anteriores, as exportações de plataformas ficaram em cerca de US$ 1,5 bilhão por ano.

“Não vejo melhora na conta de aluguéis no curto prazo. A Embraer não produz as aeronaves que as companhias brasileiras precisam e a Petrobras, mesmo com uma manobra fictícia, vai continuar usando o benefício fiscal e turvando a conta em função da construção de novas plataformas para a exploração do pré-sal até o fim da década”, afirma Pessoa.

O gasto com viagens internacionais é o único dos três setores com tendência de queda no déficit, em função da desvalorização cambial ocorrida ao longo do segundo semestre e do aumento para 6,38% do IOF em gastos no exterior, implementado pelo governo para além do cartão de crédito, que já estava sujeito a essa alíquota.

No ano passado, brasileiros gastaram no exterior US$ 18,6 bilhões a mais do que estrangeiros em território brasileiro. Quatro anos antes, o déficit foi de US$ 5,6 bilhões. “Esse é o gasto que mais preocupa o governo, por isso tomou-se a medida impopular de aumentar o imposto. Ao contrário dos outros dois setores, que estão respondendo à dinâmica interna da economia, o aumento do déficit com viagens é, na prática, vazamento de poupança interna”, diz Bistafa.

O dólar mais caro e a Copa do Mundo, que vai aumentar a entrada de divisas com o turismo no país, devem segurar a expansão do déficit em 2014. A Rosenberg prevê saldo negativo de US$ 17,5 bilhões no segmento. Silvio Campos Neto, da Tendências Consultoria, estima déficit de US$ 17 bilhões.

A importação de produtos, apesar de desacelerar, vai crescer neste ano, assim como os aluguéis. Os dois setores devem ter saldo negativo ligeiramente maior, neutralizando o recuo com viagens, segundo o economista da Tendências.

Ele afirma que o aumento, ano a ano, do déficit em serviços na última década é “tendência estrutural” da economia brasileira. Por isso, essa parte substantiva do balanço de pagamentos do país não deve ajudar o resultado das contas externas nos próximos anos.

“Transportes, aluguéis e viagens geram a distorção no resultado de serviços e em todos eles o Brasil não possui grande especialidade e escala: não temos empresa de frete competitiva, com menor custo que a estrangeira, não atendemos à demanda interna com equipamentos e nosso turismo não é muito desenvolvido. Não é algo que será resolvido de uma hora para outra”, afirma Campos Neto.

 

Fonte: Valor Econômico – Rodrigo Pedroso

 

30/01/2014|Seção: Notícias da Semana|Tags: , |