Na revisão do PIB P&D sai do consumo e vira investimento

  • 03/02/2014

Entre o fim deste ano e início de 2015, serão conhecidos novos dados do Produto Interno Bruto (PIB) de 2010 em diante. O Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) prepara uma ampla mudança nas contas nacionais com base em uma revisão da metodologia estabelecida em 2008. Como acontece nas grandes revisões periódicas, novos dados vão ser incorporados a partir de 2010, com a possibilidade de reestimativa da série inteira até 1995. “De 2010 para frente é o cálculo novo”, diz o coordenador de Contas Nacionais do IBGE, Roberto Olinto. “Para trás, vamos recalcular até 1995, reestimando a série inteira e incorporando o que for possível. É possível que haja mudanças de 95 para cá”.

Essas revisões mais longas do PIB acontecem com certa frequência e em diversos países. Em julho de 2013, por exemplo, os EUA revisaram a série histórica do PIB desde 1929. O Escritório de Análises Econômicas (BEA, na sigla em inglês) anunciou mudanças metodológicas importantes, como uma nova categoria de investimento, ligada a produtos de propriedade intelectual, como software, pesquisa e desenvolvimento e entretenimento. No México, a atualização da base de dados agora ocorre de cinco em cinco anos. No Brasil, a última grande revisão das contas nacionais foi feita em 2007 e os números foram recalculados desde 2000. As mudanças seguem conceitos discutidos internacionalmente pelos países, em um debate coordenado pelas Nações Unidas.

Na revisão brasileira de 2007, a principal mudança foi atualizar a estrutura de pesos (ponderação) dos setores na economia que até então eram baseados no censo econômico de 1985. Em 2007, ele passou a incorporar os dados das pesquisas chamadas “estruturais” – pesquisas divulgadas em bases anuais, como a Pesquisa Anual de Serviços (PAS), Pesquisa Industrial Anual (PIA) e a Pesquisa Anual do Comércio (PAC).

Dessa vez, uma das mudanças conceituais mais importantes, “talvez uma das mais fortes dessa revisão”, segundo Olinto, será a inclusão dos investimentos em pesquisa e desenvolvimento (P&D) na conta da formação bruta de capital fixo (FBCF), ao lado dos investimentos em máquinas e equipamentos e na construção civil. Até 2009, os gastos em P&D eram incorporados aos gastos do governo ou de empresas privadas. “Isso vai aumentar o PIB porque sai do custo e vai para a FBCF. Quanto, eu não sei”, diz Olinto. O investimento em P&D representa algo como 2% da FBCF, que, por sua vez, equivale a 19% do PIB.

Claudio Hamilton, diretor de Estudos e Políticas Macroeconômicas do IPEA e especialista em contas nacionais, vê a incorporação como um dado positivo, que deve ajudar a elevar a conta de investimentos e facilitar a comparação com países desenvolvidos. “Gastos feitos para encontrar petróleo, mesmo que não se descubra nada, não significam dinheiro jogado fora. É investimento porque se obteve uma informação não trivial que vai ajudar a não incorrer no mesmo erro”, exemplifica. Segundo ele, na Inglaterra, 16% do investimento é ativo intangível.

Outra mudança relevante é que a Pesquisa de Orçamentos Familiares (POF) que está norteando os números hoje é de 2002/2003 e será substituída pela de 2008/2009 nas contas revisadas. “Isso deve trazer novidades importantes porque os processos de distribuição de renda começam a pegar fogo justamente em 2002”, diz Hamilton. Olinto diz ainda que os dados das chamadas pesquisas estruturais vão ser os mesmos.

Alguns melhoramentos, no entanto, devem ser feitos como a incorporação da PCI, a Pesquisa de Consumo Intermediário feita para uso interno do órgão.

Trimestralmente, o PIB ganhará, no conjunto de informações sobre consumo, ajuda da nova Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílio (Pnad) Contínua. O Instituto também passará a incorporar alguns dados do Imposto de Renda de Pessoa Física, nos dados anuais, mas a ideia é que essa informação complemente dados pelo lado do consumo.

Embora muitos não tenham se dado conta, os números do PIB que todo mundo olha a cada trimestre são parciais. O PIB de 2013, por exemplo, a ser conhecido em 27 de fevereiro, é um PIB estimado a partir de um conjunto de informações incompleto e vai ser revisto mais duas vezes em uma janela de dois anos.

Em novembro do ano passado teríamos conhecido as “revisões rotineiras” feitas no PIB: a primeira revisão do produto de 2012 e a segunda, e última, revisão do PIB de 2011. Em razão justamente da revisão mais ampla, esses números ainda não foram divulgados. Atualmente, o último ano com dado definitivo para o PIB brasileiro é 2009.

Nos EUA, a última revisão, divulgada no ano passado, mostrou que o PIB americano encolheu menos que o estimado na recessão entre o quarto trimestre de 2007 e o segundo trimestre de 2009: caiu 2,9%, e não 3,2%. Por aqui, por exemplo, a revisão de 2007 fez com que, em 2005, a alta do PIB tenha passado de 2,9% para 3,2%. Bráulio Borges, economista da LCA, explica que nessas situações é raro que o PIB seja revisado para pior. “Na maior parte das revisões, o PIB é revisto para cima porque se incorpora mais informações. Não é manipulação”, diz. Para Francisco Pessoa, também da LCA, é preciso olhar os números com cuidado. “PIB não é uma foto de 16 megapixels, é um quadro impressionista”.

 

Fonte: Valor Econômico – Flavia Lima e Denise Neumann

 

03/02/2014|Seção: Notícias da Semana|Tags: , , , , , , |