Gasto com importação de insumos supera exportação industrial

  • 19/03/2014

No ano passado, pela primeira vez, as receitas recebidas pelas exportações da indústria de transformação foram insuficientes para pagar os gastos do setor com a importação de insumos, peças e componentes, segundo estudo divulgado pela Confederação Nacional da Indústria de Transformação (CNI) e Fundação Centro de Estudos de Comércio Exterior (Funcex). Essa relação negativa indica que o aumento das importações de matérias-primas não serviu para incrementar as exportações e foi usado para abastecer o mercado interno.

A relação entre as exportações e os insumos – chamada de exportação líquida – foi apenas levemente negativa na indústria de transformação, de menos 0,1%, mas ela vem em trajetória negativa desde 2004 e 2005, e confirma que o país perdeu espaço nas cadeias globais de produção. Do total de 21 segmentos do setor de transformação analisados, 11 exportaram um valor inferior ao gasto com insumos comprados no exterior no ano passado. Na indústria geral, com a ajuda do setor extrativo, essa relação vira positiva.

Entre insumos e produtos finais importados pelo Brasil, a participação da importação no consumo doméstico de bens industriais alcançou 22,3%, crescendo, apesar da desvalorização do real, em relação ao recorde anterior de 20,7%, registrado em 2012. Isso significa que um em cada cinco produtos consumidos no país tem sido produzido fora do Brasil. Ao mesmo tempo, o novo patamar do câmbio ainda foi insuficiente para, sozinho, dar impulso às exportações, cujo peso no faturamento da indústria ficou praticamente estável para a indústria geral, em 19,8%, e cresceu levemente, de 15,7% para 16,1% no setor de transformação.

“O problema não é o tamanho das importações, mas o fato de que elas não estão gerando mais recursos, via exportações”, pondera o professor Jorge Arbache, da Universidade de Brasília (UnB). “Estamos importando apenas para abastecer o consumo interno”, acrescenta, ponderando que os dados refletem a ausência do Brasil nas cadeias globais de produção. Nessa situação, diz ele, em que as importações não geram valor, elas representam uma fraqueza. Na média, 24% dos insumos industriais já são importados.

No ano passado, no total do comércio exterior de bens industriais (insumos e produtos acabados), o déficit brasileiro bateu novo recorde, chegando a US$ 54 bilhões. Por segmento, o resultado é fortemente concentrado em produtos de alta e média alta tecnologia, onde o déficit chega a US$ 93 bilhões, resultado parcialmente compensado pelos resultados em áreas de menor complexidade tecnológica. “Inserção em cadeias globais não é feita com baixo custo, é preciso inovação, tecnologia, capacidade de fazer a própria inserção”, diz Arbache, afirmando que nem custo baixo o Brasil tem nesse momento.

Gráfico Valor - Indústria de Transformação

O movimento da indústria é distinto do que sugere uma política efetiva de inserção positiva de um país no comércio global, de acordo com Julio Gomes de Almeida, ex-secretário de Política Econômica da Fazenda. O quadro atual é de grandes empresas comprando produtos no exterior para abastecer o mercado interno. “As cadeias globais são sobretudo dominadas por multinacionais, que dividem a produção em nível mundial. Todas elas estão instaladas no Brasil, mas o país é utilizado como mercado e não como parte do processo de produção”, diz.

 

Fonte: Valor Econômico – Denise Neumann e Rodrigo Pedroso | De São Paulo

 

19/03/2014|Seção: Notícias da Semana|Tags: , , |