Mão de obra pressiona o PIB potencial

  • 07/04/2014

A taxa de investimento aquém do necessário e a baixa produtividade continuam impondo dificuldades a um crescimento mais forte e sustentável da economia brasileira, mas um terceiro fator de restrição ao Produto Interno Bruto (PIB) potencial do país ganhou importância em 2013. Para um grupo de economistas consultados pelo Valor, o indicador – que, na teoria, mede o quanto a atividade pode crescer sem pressionar a inflação – perdeu força no ano passado, bastante influenciado pela saída de pessoas do mercado de trabalho. Hoje, segundo os analistas ouvidos, o PIB potencial do Brasil estaria entre 2% e 3,5%.

Embora o produto potencial de uma economia, que mede a expansão da capacidade produtiva do país, seja uma variável de estimação imprecisa – ou, no jargão dos economistas, “não observável” – seu cálculo, geralmente, é feito com base na evolução de três componentes: estoque de capital, Produtividade Total dos Fatores (PTF) e oferta de mão de obra.

Este último item já vinha sendo apontado como mais um entre os vários gargalos de oferta no período recente devido à redução da taxa de desemprego. A saída de pessoas aptas a trabalhar da População Economicamente Ativa (PEA), no entanto, acentuou a influência negativa do contingente de mão de obra sobre o PIB potencial.

O economista-chefe da LCA Consultores, Bráulio Borges, estima que o produto potencial caiu para 3% em 2013, após ter oscilado em uma faixa mais próxima de 3,5% entre 2008 e 2012. Comparando o ano passado com a média daquele período, Borges calcula que a oferta de trabalhadores tirou 0,4 ponto percentual do PIB potencial. O contingente de pessoas disponíveis para trabalhar, segundo ele, avançou 1% no ano passado, após ter aumentado a uma média de 1,6% ao ano de 2008 a 2012.

A diminuição da taxa de natalidade e a absorção pela economia brasileira de um “exército industrial de reserva” de desempregados já vinham determinando um avanço mais modesto do estoque de mão de obra, mas a novidade mais recente seria o encolhimento do número de pessoas que participam do mercado de trabalho, sustenta Borges. “Muitas pessoas deixaram de trabalhar para estudar e podem voltar ao mercado mais produtivas, mas essa seria uma visão mais otimista”, diz.

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A moderação no ritmo de expansão do estoque de mão de obra do país foi mencionada recentemente pela Standard & Poor’s ao rebaixar a nota de crédito soberana brasileira. No relatório que aponta os motivos para a decisão, a agência de classificação de risco afirma que as perspectivas de crescimento baixo para o Brasil nos próximos anos levam em conta a taxa de investimento de “apenas” 18% do PIB e uma desaceleração no ritmo de expansão da força de trabalho.

Para a Tendências Consultoria, o PIB potencial do Brasil ficou estável no ano passado em relação a 2012, em 3%, mas a composição do número foi diferente: o crescimento da oferta de trabalho desacelerou de 2,2% para 0,7% entre um ano e outro, enquanto a PTF deixou queda de 1,9% para alta de 0,2% e o estoque de capital fixo cresceu a taxas parecidas (3,8% em 2012 e 3,6% em 2013).

Segundo a economista Alessandra Ribeiro, a taxa de desemprego atual encontra-se abaixo de seu nível natural, que não acelera a inflação. Nas contas da consultoria, essa variável, que também não é “observável”, estaria na casa de 5%. “Isso já torna o cenário complicado, mas a desistência de pessoas que poderiam trabalhar piora significativamente o quadro.”

Cálculos da Tendências mostram que a saída de jovens de 18 a 24 anos teve impacto negativo de 0,7 ponto na PEA em 2013, mas a economista destaca que parcela de 25 a 49 anos, que representa 61% da força de trabalho, contribuiu com apenas 0,2 ponto para a alta da população ativa. Para Alessandra, a volta dessas pessoas que saíram do mercado de trabalho à ativa deve fazer com que o crescimento efetivo da economia volte para a casa de 3% nos próximos anos, mas o impacto da mão de obra mais qualificada na produtividade e, consequentemente, no PIB potencial, deve ser “marginal”.

O economista-chefe da Pezco Microanalysis, João Ricardo Costa Filho, tem opinião semelhante a de Borges, da LCA. Segundo Costa Filho, a saída de pessoas da força de trabalho gerou uma inflexão no PIB potencial – que, de acordo com seus cálculos, está em 2% -, mas pode ter consequências benéficas na produtividade mais para frente. Em sua avaliação, porém, outros gargalos mais importantes precisam ser resolvidos para que o potencial de crescimento tenha um salto maior, como o de infraestrutura. “Se não tivéssemos problemas para distribuir nossas mercadorias, poderíamos ter taxas de potencial entre 3,5% e 4%.”

Para Felipe Salles, do Itaú Unibanco, a questão demográfica impõe uma restrição estrutural a contribuições maiores da oferta de trabalhadores para o PIB potencial daqui em diante. O economista não tem uma estimativa precisa para esse indicador, mas avalia que, em ciclos de maior fôlego da economia, o mercado tende a superestimá-lo, da mesma forma que o subestima quando a atividade cresce menos. No ciclo atual, diz Salles, o PIB potencial estaria em uma faixa ampla, entre 2% e 3,5%.

Esse intervalo, de acordo com Salles, pode mudar se o país conseguir aumentar sua taxa de investimento. Em uma hipótese aproximada, o economista do Itaú calcula que, se a relação entre os investimentos e o produto aumentasse em cinco pontos, o PIB potencial seria elevado em cerca de um ponto. Em sua opinião, a queda mais brusca da taxa de poupança doméstica, que ficou em 13,9% do PIB no ano passado, é um movimento preocupante, que precisa ser revertido.

No cenário traçado por Guilherme Maia, da Votorantim Corretora, o PIB potencial, atualmente em 2,6%, deve caminhar lentamente para algo mais próximo de 3,5% num prazo longo, de cinco a seis anos, influenciado por um ganho de fôlego gradual do fator “capital”. Nas projeções de Maia, a oferta de mão de obra vai crescer a uma média de 0,5% ao ano na próxima década, após ter subido apenas 0,2% em 2013, enquanto o produto potencial convergirá, também vagarosamente, para a casa de 3,5%.

Maia pondera, no entanto, que suas estimativas de longo prazo não consideram a hipótese de um aumento da produtividade como reflexo da maior qualificação dos trabalhadores atualmente fora do mercado. “Nenhum ganho de produtividade vai vir de forma tão brusca. Esses movimentos são mais estruturais e, além disso, ainda temos problemas de qualidade da educação no país”, lembra o economista.

Fonte: Valor Econômico – Arícia Martins, de São Paulo
07/04/2014|Seção: Notícias da Semana|Tags: , |