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  • 08/09/2014

Consolidação da indústria naval mantém aquecido o mercado para classificadoras navais

Uma indústria naval revitalizada, com encomendas e investimentos aquecidos, novos estaleiros e muita demanda por mão de obra. Prova disso é que em 2014, a Transpetro deve bater o recorde de recebimento de novas embarcações e até 2020, a frota passará dos atuais 60 para 110 navios. O atual momento do setor é um prato cheio para as sociedades classificadoras. Responsáveis pela regularização, controle e certificação de embarcações nos aspectos relativos à segurança da navegação, as sociedades classificadoras embarcaram na expansão da indústria naval brasileira e hoje veem o país como um importante polo do setor.

É o caso da britânica Lloyds Register, que acredita, e muito, na indústria naval brasileira e nas perspectivas para o futuro. De acordo com o vice-presidente marítimo para a América do Sul, José Carlos Ferreira, os projetos em andamento e em processo de maturação oferecem muitas oportunidades às classificadoras, assim como aos seus braços de consultoria e apoio à indústria. Fundada em 1760 como uma sociedade de classificação de navios, a LR agora opera em diversos setores da indústria, com mais de nove mil funcionários em 78 países. Segundo Ferreira, a revitalização da indústria colocou o Brasil em evidência para a companhia. “Estamos em fase de investimentos para a ampliação da gama de serviços que prestamos. Nossa expectativa é atingir altos níveis de crescimento nos próximos anos, não somente no volume de nossas operações, mas também na diversidade dos serviços que oferecemos”, afirma Ferreira.

O momento é compartilhado pelo diretor executivo comercial do Bureau Veritas, Sérgio Mello. Para ele, o cenário para as classificadoras é tão interessante quanto o da indústria naval. “É o melhor possível, com uma carteira de oportunidades muito grande”.

O Bureau Veritas é uma das mais antigas sociedades de classificação e membro-fundadora da International Association of Classification Societies (IACS), instituição que reúne as 10 maiores sociedades de classificação do mundo. A rede mundial da empresa conta com mais de mil vistoriadores navais, atendendo às demandas de vistoria em todos os portos da navegação comercial mundial.

Para Mello, o potencial vem se materializando e não poderia haver momento de melhor expectativa para as classificadoras. “O país vive um renascimento da indústria naval, o que é um pouco atípico. Essa indústria se concentrou nas últimas décadas na Ásia, e o Brasil resolveu tomar essa indústria como polo de atividade, o que foi uma boa decisão”, afirma o diretor.

O Registro Italiano Navale (Rina), presente no Brasil desde 1994, também aumentou as apostas no Brasil nos últimos cinco anos. A empresa atuou durante muitos anos focada em serviços para os clientes, como armadores de navios estrangeiros que vinham para o país. “Não estávamos focados no mercado interno como classificadora. De uns anos pra cá, o mercado brasileiro se transformou e chamou a nossa atenção”, destaca o gerente geral para a América do Sul do Rina, Maurizio Nigito.

A forte competitividade entre as empresas é uma das marcas do segmento. Para o executivo, a forte concorrência deste mercado é vista como algo benéfico, pois demanda constante desenvolvimento de cada organização que atue ou pretenda atuar no setor. “Como em qualquer outro mercado, o crescimento da concorrência também conduz à disputa por preços. Isso tem seu lado positivo, pois obriga as organizações a investirem em eficiência. Além disso, exige parcimônia para que a indústria retire da atividade de classificação a melhor contribuição possível no tocante ao quesito tecnologia”, destaca o vice-presidente.

Hoje, as atividades do Lloyds no Brasil estão distribuídas entre os serviços prestados à indústria, com destaque para classificação de navios e plataformas, certificação de sistemas de gestão, análise e mitigação de riscos, consultoria especializada, apoio técnico especializado a atividades de perfuração, treinamento, serviços Asme, e outros.

O Bureau Veritas está destinando forças para a indústria offshore. “Temos vantagens competitivas nas unidades de perfuração em geral. É onde temos maior sucesso e onde vamos continuar desenvolvendo e acompanhando de forma avançada. Nos candidatamos a qualquer tipo de unidade offshore”.

Atualmente, a empresa possui na carteira quatro navios Panamax e oito gaseiros, encomendas do Promef, três porta-contêineres e 20 comboios da Transpetro, além de outros contratos. A empresa também realiza cursos de gestão de qualidade e análise de risco. “A Petrobras e outros programas trouxeram uma grande demanda, que gera um ambiente propício para essa explosão de atividades. Temos hoje uma carteira extensa, com grandes atores, estaleiros renovados e novos construídos. O que nos dá um dinamismo enorme”, afirma Sérgio Mello.

Para a classificadora brasileira Registro Brasileiro de Navios e Aeronaves (RBNA), o desafio é conseguir uma fatia maior do mercado, dominado pelas gigantes internacionais. Criada há 32 anos, atualmente a empresa está focada em conquistar a internacionalização e busca associar-se à IACS para expandir sua atuação. “Entrar nesse patamar é difícil, precisamos atender a um conjunto de exigências enorme. Já estamos com o processo encaminhado e esperamos conquistar a certificação do IACS até o final de 2015”, afirma o diretor técnico do RBNA, Luiz Mattos.

Hoje as atividades da companhia estão concentradas na certificação, regulação e controle de navios de cabotagem, apoio portuário e navegação interior na Amazônia.

A italiana Rina, que manteve um crescimento de cerca de 12% no faturamento nos últimos dois anos, pretende crescer muito mais. A empresa atualmente realiza a análise de risco para a Caixa Econômica, referente à construção das 29 sondas de perfuração da Petrobras, que estão sendo construídas em cinco estaleiros no Brasil.

A companhia também desenvolve inspeção e atividades de certificação ISO, ambiental e de conteúdo local em unidades offshore.

A grande aposta no mercado brasileiro vem acompanhada de desafios que permeiam todo o setor naval. Entre eles, a grande demanda por mão de obra especializada.

De acordo com o diretor do Lloyds Register, um dos principais gargalos encontrados pelas sociedades classificadoras nos últimos anos é justamente o de atender ao crescente número de oportunidades, consequência dos altos níveis de investimentos em óleo e gás.

“Uma das maiores dificuldades reside na formação de equipes técnicas. A demanda do mercado por profissionais de engenharia é muito alta, gerando níveis de rotatividade acima do usual, e tornando mais desafiador para as sociedades classificadoras a formação e manutenção de equipes com experiência apropriada”, explica Ferreira.

Para ele, as empresas que oferecem melhores perspectivas de carreira, e melhores oportunidades de crescimento e sedimentação do conhecimento profissional acabam levando vantagem na disputa por profissionais qualificados.

Estabelecida há 30 anos no Brasil, o Bureau Veritas não se sente tão prejudicada pela falta de executivos especializados e conta com uma equipe forte e preparada. “Não temos problema com pessoal, porque fomos capacitando nossa equipe ao longo dos anos e não sofremos com o que hoje é um dos principais desafios dessa indústria”, afirma Sérgio Mello.

O executivo admite, no entanto, que as dificuldades no setor são consequência do próprio aquecimento do mercado. “São muitos atrasos e projetos que param no meio, e as coisas que não se materializam no tempo que foram planejadas”.

Mello afirma que o setor sofre com as dores do crescimento. “São projetos muito sofisticados e grande parte da carteira está ligada à indústria offshore, uma indústria que está se recompondo e que exige altos índices de conteúdo local”, destaca o diretor.

Para ele, um dos grandes desafios desse segmento é a inovação, tida como uma das chaves para a competitividade no âmbito mundial. Foi de olho nesse problema que o Bureau Veritas foi uma das criadoras do Comitê Offshore para Pesquisa, Desenvolvimento e Inovação (Copedi), que reúne hoje cerca de 30 organizações que desejam cooperar na condução de atividades de desenvolvimento tecnológico no setor offshore no Brasil.

O comitê nasceu da vontade de diversas empresas brasileiras de cooperarem na condução de ações para o desenvolvimento da tecnologia offshore no Brasil. Esse modelo de atuação, já bem-sucedido fora do Brasil, além de gerar uma otimização dos recursos, acarreta em maior sucesso de iniciativas inovadoras, pois possibilita a cooperação de clientes e fornecedores dentro de um mesmo projeto. O comitê conta atualmente com a adesão de mais de 30 empresas de diversos setores (petrolíferas, EPCI, fabricantes, certificação, ensaios) e instituições de pesquisa e conta com o apoio do Instituto Brasileiro do Petróleo (IBP).

Além das reuniões plenárias com as empresas membros, o Copedi organiza regularmente seminários técnicos nos quais são discutidos temas importantes para o desenvolvimento offshore no Brasil e onde projetos de P&D são propostos para os participantes. “Participamos ativamente do desenvolvimento das ferramentas e o grupo traz resultados muito significativos”, destaca Mello.

Maurizio Nigito também acredita que o grande desafio do país é se tornar competitivo em relação aos outros players da indústria naval. “Para isso é preciso muito treinamento e uma mão de obra muito especializada”. Nigito defende ainda o aumento da produção de equipamentos, que são em sua maioria fabricados no exterior. “O Brasil necessita fortalecer a indústria de fornecedores para aumentar a produção interna. Para isso, precisa desenvolver novas tecnologias e trazer conhecimento do exterior”, afirma.

Luiz Mattos, do RBNA, também destaca a defasagem tecnológica como o grande gargalo do mercado. “As exigências de conteúdo local foram boas para dar emprego. Mas em termos de tecnologia, o mando ainda é de fora. Ainda temos que evoluir muito para nos tornarmos competitivos internacionalmente”, diz.

 

Fonte: Portos e Navios

 

08/09/2014|Seção: Notícias da Semana|Tags: |