A abertura, ontem, da Rio Oil & Gás, no Rio, foi marcada por um embate entre o governo e a indústria de petróleo, que cobrou mudanças para tornar o setor mais competitivo em termos internacionais. As petroleiras, representadas pelo Instituto Brasileiro de Petróleo, Gás e Biocombustíveis (IBP), mostraram preocupação com as dificuldades enfrentadas pelo setor. E aproveitaram para apresentar o documento“Agenda Prioritária 2014-2015”, com uma série de propostas. Uma das principais sugestões da agenda, que será encaminhada aos presidenciáveis, é a fixação de um calendário de longo prazo para a realização de leilões de áreas exploratórias.
“A indústria espera que o governo, via Conselho Nacional de Política Energética, sinalize qual a participação efetiva que espera dos demais atores [além da Petrobras]. E que oportunidades e em que tempo serão oferecidas [a esses atores], sob risco de desmbolização de empresas e da não atração de novos investidores ao Brasil”, disse, na abertura do evento, o presidente do IBP, João Carlos de Luca. A presidente da Petrobras, Graça Foster, não compareceu.
Em resposta a De Luca, o secretário de petróleo e gás do Ministério de Minas e Energia (MME), Marco Antônio de Almeida, que representou no evento o ministro Edison Lobão, anunciou a realização da 13ª Rodada de Licitações de Blocos Exploratórios da Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP) para o primeiro semestre do ano que vem. O leilão deve incluir áreas em terra e também em águas profundas, disse Almeida.
A notícia foi recebida com entusiasmo contido. Na última edição da Rio Oil & Gas, em 2012, a indústria havia cobrado a falta de leilões. Em 2013, o governo fez três licitações, mas depois houve uma“descontinuidade”, na visão do IBP, uma vez que, até ontem, o governo não havia feito novos anúncios.
Para realizar o leilão até junho de 2015, será preciso garantir todas as aprovações, inclusive do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama), para aprovação na reunião do CNPE de dezembro, estimou a diretora-geral da ANP, Magda Chambriard.
Entre as principais críticas da indústria, estão a atuação da Petrobras como operadora única do pré-sal, a política de preços de derivados no mercado interno e as exigências de conteúdo local.
“A Petrobras tem volume extraordinário de reservas garantidas que já lhe dão uma situação invejada por qualquer petroleira”, disse De Luca. Ele reafirmou que a exigência de que a estatal opere sozinha os campos licitados daqui para a frente no pré-sal pode ser prejudicial para a empresa, uma vez que pode obrigar a companhia a investir para explorar regiões que não seriam uma escolha natural em um ambiente de recursos limitados.
O presidente do IBP também falou da política de preços de derivados no mercado interno. Disse que, nos últimos anos, a Petrobras perdeu receita de R$ 60 bilhões a R$ 80 bilhões com a defasagem de preços dos combustíveis no país, em relação ao valor praticado no mercado internacional.
De Luca afirmou ainda que, quando a Petrobras deveria estar totalmente concentrada no seu “colossal programa de investimentos”, a empresa se vê obrigada a tomar “medidas saneadoras” com relação às recentes denúncias de corrupção na estatal.
O executivo chamou também a atenção para a situação “preocupante” de “dificuldades” de setores da cadeia de óleo e gás. “Vejo um paradoxo. O Brasil tem potencial enorme do pré-sal, com recursos comprometidos para investimentos. E o sentimento é que o conjunto [da indústria] não vai bem.”
Almeida, do MME, respondeu às demandas levantadas por De Luca e foi taxativo ao garantir que “o governo brasileiro apoia a Petrobras irrestritamente nesse sentido [operação única]”. Almeida admitiu problemas financeiros na estatal, mas os considerou normais para uma empresa do porte da Petrobras.“Não acreditamos que problema de preços hoje seja central para o setor”.
“Uma indústria como a nossa precisa de previsibilidade regulatória”, defendeu De Luca. O IBP também defendeu certa flexibilização do sistema de conteúdo local. De Luca assegurou que não defende a redução desse conteúdo, mas o aperfeiçoamento do modelo vigente com investimento na criação de“capacidade nova” na cadeia nacional de fornecedores para atender à demanda de bens e serviços pela indústria.
Almeida fez questão de dizer que não considera que uma rodada anual de blocos seja necessariamente o ideal e destacou que o governo não pretende mexer na política de conteúdo local.
Mas o fato é que o clima da indústria já foi melhor. Uma das apreensões entre participantes da feira é de que, caso as demandas citadas pelo IBP não sejam encaradas, o Brasil perca espaço internacional. O secretário-geral do IBP, Milton Costa Filho, lembrou que o Brasil não vem sendo destacado nos eventos internacionais. “Estamos fora da agenda mundial”.
Segundo ele, um dos “rivais” brasileiros pode ser o México, que recentemente aprovou a quebra do monopólio da estatal Pemex.
“Ouvimos que todas as empresas estão interessadas no Ártico; nos Estados Unidos, na parte de fontes não tradicionais, e no México também. E o Brasil não é mencionado”, disse.
O vice-presidente de novos negócios para Américas da Shell, Jorge Santos Silva, observou que o Brasil é uma “boa oportunidade” de negócios, mas não a única. “Há novas oportunidades nas Américas, incluindo o Brasil, mas também o México e outras”, disse. “Teríamos muito prazer em utilizar produtores locais, mas é preciso ter competitividade e preços competitivos”, acrescentou.
Fonte: Valor Econômico – Rodrigo Polito, André Ramalho, Francisco Góes e Rafael Rosas, Rio de Janeiro