O Estaleiro Atlântico Sul (EAS), que pertence às construtoras Camargo Corrêa e Queiroz Galvão, quer romper o contrato para a construção de sete sondas do pré-sal. O estaleiro enviou, na sexta-feira, um comunicado à Sete Brasil, companhia criada pela Petrobras para gerenciar as compras de sondas para o pré-sal, informando sua intenção de cancelar o negócio em função da inadimplência da companhia, que desde novembro está sem pagar os cinco estaleiros responsáveis pela construção de 29 sondas. O valor dos contratos somam US$ 25 bilhões. Somente o contrato da EAS é estimado, em valores atuais, em US$ 6 bilhões.
A situação financeira da Sete Brasil vem se deteriorando desde que o ex-executivo da companhia, Pedro Barusco, se tornou delator da Operação Lava Jato e a Petrobras ameaçou cancelar a compra das sete sondas, justamente às referentes ao contrato com o EAS, em dezembro passado. Estas questões estavam superadas, até que mais recentemente veio à tona o conteúdo da delação de Barusco, que implica os estaleiros em suposto pagamento de propina, o que acabou por impedir que o BNDES liberasse recursos do financiamento de longo prazo para a Sete.
Desde novembro, a empresa já deixou de pagar em torno de R$ 2 bilhões aos cinco estaleiros contratados para construir as sondas. Sem a entrada de recursos, alguns desses estaleiros estão reduzindo a produção, demitindo pessoas, ameaçando ir à Justiça e agora a EAS quer cancelar o contrato.
Em nota enviada ao Estado, a Sete Brasil confirmou a intenção do EAS de cancelar o contrato, mas informou que a empresa não tem suporte legal para tomar essa decisão. O departamento jurídico da Sete Brasil já está estudando as medidas que deverão ser adotadas contra essa decisão. Procurada, a EAS não respondeu aos pedidos de entrevista. A Queiroz Galvão e a Camargo Corrêa informaram que é a EAS que tem de se pronunciar sobre o assunto.
Os atuais executivos da Sete Brasil e seus acionistas estão em um esforço para tentar aprovar o financiamento com o BNDES e assinar o contrato com a Petrobras, que também está pendente. Para isso, tentam desvincular os antigos executivos, que teriam recebido as propinas, da empresa. O mesmo fazem alguns estaleiros, tentando separar os negócios dos agentes acusados de corrupção.
Na nota enviada ao Estado, a Sete reforça esta posição e diz que só está na atual situação em decorrência do que foi apontado na Operação Lava Jato. “Esse é o nosso principal obstáculo. A liberação do primeiro desembolso do BNDES, de US$ 3,2 bilhões, estava para ser feita, mas o banco voltou atrás após o depoimento de delação premiada de Barusco (ex-gerente de engenharia da Petrobras e ex-diretor da Sete Brasil)”, disse uma fonte ligada à empresa.
Essa mesma fonte reforça a tese de que a companhia é “vítima” dessa situação e que os próprios estaleiros que prestam contrato, a partir do depoimento do Barusco, prejudicaram a companhia. “Também estamos estudando medidas legais que podem ser tomadas com essas declarações”, disse a fonte, referindo-se ao fato de os estaleiros terem pago propinas, conforme depoimento de Barusco. “Nós, da Sete Brasil, não estamos envolvidos na Operação Lava Jato”, disse.
Estaleiros
Além da EAS, outros quatro estaleiros prestam serviços para a Sete Brasil – o Enseada, que pertence às construtoras Odebrecht, OAS e UTC e o grupo japonês Kawasaki; o Rio Grande, da construtora Engevix; o estaleiro BrasFels, do grupo Keppel, de Cingapura, e o Jurong, também de Cingapura.
Criada em 2011, a Sete Brasil tem entre seus principais sócios os bancos BTG, Bradesco e Santander, os fundos de pensão Previ (dos funcionários do Banco do Brasil), Petros (da Petrobras), Funcef (da Caixa Econômica Federal) e Valia (da Vale), o FI- FGTS e a própria Petrobras.
No início de fevereiro, vieram à tona os termos da delação premiada do ex-diretor da Sete, Pedro Barusco, e todos os estaleiros foram envolvidos na Operação Lava Jato. Eles teriam pago propinas à empresa para fechar os contratos. Essas declarações barraram o a liberação do financiamento do BNDES. O dinheiro serviria para garantir a construção do primeiro bloco de sondas.
O BNDES deixou para a próxima diretoria a decisão sobre a operação de socorro à Sete Brasil, uma das principais fornecedoras da Petrobras. Também caberá a atual diretoria da Petrobras fazer o negócio ir adiante, isso porque a empresa ainda precisa dar o seu aval para a compra das sondas. Um dos motivos de o ex-presidente do Banco do Brasil, Aldemir Bendine, ter sido colocado no posto, inclusive, segundo entendem acionistas e fornecedores da Sete, foi justamente para tentar resolver a situação da Sete.
A empresa tem mais de US$ 4 bilhões em financiamentos de curto prazo com os bancos, entre eles o próprio Banco do Brasil. A quebra da empresa poderia acarretar em prejuízos de R$ 28 bilhões. Só os acionistas colocaram R$ 8,3 bilhões.
Demissões
No último dia 13, o estaleiro Enseada, no Recôncavo Baiano, enviou uma carta aos funcionários dizendo que a indústria naval vive uma crise sem precedentes e que os atrasos de pagamento da Sete Brasil tornaram sua situação insustentável. A empresa demitiu naquele dia 350 trabalhadores, acentuando a crise no setor.
No ano passado, os atrasos da Sete já fizeram a Enseada tomar a decisão de parar a construção do estaleiro e cerca de 4 mil funcionários que trabalhavam na obra foram demitidos. A empresa está desde novembro sem pagar o Enseada e a dívida já chega a R$ 500 milhões. Com a inadimplência de seu único cliente, está impossível obter crédito. Segundo o Sindicato da Indústria Naval, só em janeiro deste ano, foram cortados três mil postos diretamente ligados ao setor.
Também sem receber, o estaleiro Rio Grande, da Engevix, reduziu o ritmo da produção e a empresa só não demitiu porque tem outros contratos em andamento e conseguiu transferir seus funcionários para trabalhar em outras embarcações. Os atrasos da Sete com o Rio Grande chegam a R$ 180 milhões, e a estimativa é de que atinjam R$ 250 milhões.
Fontes afirmam que o mesmo valor é devido ao estaleiro Jurong, do grupo SembCorp, de Cingapura, e outros R$ 900 milhões estão em atraso com os outros dois estaleiros, o Atlântico Sul, e o estaleiro BrasFels. E as demissões também já começam a ocorrer no Atlântico Sul.
Fonte: O Estado de São Paulo – Josette Goulart, Mônica Scaramuzzo, Cley Schols