O governo parece ter finalmente acordado para a importância da correção dos rumos do comércio internacional de serviços para a melhoria das contas externas. O elevado e crescente saldo negativo do comércio de serviços é responsável por aproximadamente metade do déficit em conta corrente, que atingiu US$ 104,8 bilhões em 2014, o equivalente a 4,47% do Produto Interno Bruto (PIB), de acordo com o Banco Central (BC).
O déficit de serviços representou 46% do déficit em conta corrente do ano passado, segundo o BC. O percentual chegou a ser maior no início da década, beirando os 70%, e diminuiu não por um motivo animador, mas sim porque a balança comercial se deteriorou e passou a ter também influência importante no déficit em conta corrente.
O setor de serviços já representa cerca de 70% do PIB e 78% dos empregos formais, mas não tem uma importância proporcional no comércio internacional do país. Nos últimos seis anos, as exportações brasileiras de serviços mantiveram uma posição equivalente a 1,7% do PIB; e as importações cresceram um ponto, para 3,7%. Na balança externa do país, as exportações de serviços representam apenas 15% para 85% de bens; nas importações, os serviços pesam mais, 27,5%, com 72,5% para bens.
Ainda assim, há espaço a ocupar em um mercado crescente. Estimativas da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) indicam que o comércio de serviços diretos e indiretos representam entre 50% e 60% do valor total do comércio exterior entre os países desenvolvidos; e, segundo a Organização Mundial do Comércio (OMC) a corrente de comércio de serviços no mundo gira em torno de US$ 9 trilhões.
A participação brasileira é acanhada, apesar do impacto nas contas externas. No ano passado, o fluxo de corrente do comércio exterior de serviços do Brasil foi de US$ 126,9 bilhões, 5% acima dos US$ 120,7 bilhões de 2013. As exportações de serviços cresceram 6,3% para US$ 39,8 bilhões, colocando o país na 31ª. posição no ranking mundial, liderado pelos Estados Unidos e Reino Unido. Já as importações aumentaram 4,6% para US$ 87 bilhões, com o Brasil na 17ª posição de uma lista também encabeçada pelos Estados Unidos, seguidos pela China.
Mas o Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio (Mdic) está disposto a mudar esse quadro e está aperfeiçoando as estatísticas a respeito do comércio internacional brasileiro de serviços, com o objetivo de reunir informações detalhadas para municiar o planejamento de ações na área e construir uma agenda para alavancar os negócios em conjunto com o setor privado.
Nos dados de 2014 do BC se sobressaem entre as despesas da balança de serviços os crescentes gastos dos brasileiros com viagens ao exterior. Já no Siscoserv, o principal item na importação de serviços é o arrendamento mercantil ou locação de máquinas e equipamentos, com US$ 20,2 bilhões em 2014, principalmente para a cadeia de petróleo e gás, seguido pelo transporte aquaviário de cargas (US$ 5,4 bilhões) e pelo licenciamento de direitos autorais (US$ 3,6 bilhões). Já nas exportações se destacam os serviços gerenciais, de consultoria gerencial, relações públicas e comunicação social, com US$ 2,2 bilhões; e outros serviços profissionais, técnicos e gerenciais não classificados, com US$ 2,1 bilhões.
O governo começou a se movimentar em julho de 2012, com o lançamento do Sistema Integrado de Comércio Exterior de Serviços, Intangíveis e Outras Operações que Produzam Variações no Patrimônio Líquido (Siscoserv), desenvolvido pelo Mdic em conjunto com a Secretaria da Receita Federal. É o equivalente para serviços ao Sistema Integrado de Comércio Exterior (Siscomex), lançado 20 anos antes. As informações recolhidas e sistematizadas foram divulgadas neste mês para municiar as discussões a respeito de como ampliar a competitividade do Brasil na área e devem compor também o Plano Nacional de Exportação, em elaboração pelo governo.
Neste ano, o déficit no setor de serviços deve arrefecer com a desaceleração econômica. Mas isso não é motivo para o projeto marcar passo. Se as fontes de despesas parecem bem detalhadas, as de receita precisam ser aperfeiçoadas, ainda mais porque será nessa frente que o governo terá que atuar mais. Um exemplo é a exportação de serviços de engenharia pelas empreiteiras brasileiras que operam no exterior, que ainda não foram devidamente contabilizadas.