A Sete Brasil, contratada pela Petrobras para construir um pacote bilionário de sondas de perfuração, tenta fechar esta semana, com o apoio de acionistas e de credores, um intrincado quebra-cabeças. Amanhã, a Sete vai submeter aos acionistas, em assembleia geral extraordinária (AGE), um plano de reestruturação que busca definir de que forma a empresa vai renegociar a sua dívida, hoje na casa dos US$ 4,5 bilhões, e qual será o novo plano de negócios da companhia. Sem pagar a um grupo de cinco estaleiros desde novembro de 2014, aos quais deve US$ 1,2 bilhão, a Sete tem pressa em encontrar saídas para uma crise que se arrasta há meses sem solução.
Sergio Bacci, presidente da Associação Brasileira das Empresas de Construção Naval e Offshore (Abenav), disse que qualquer tentativa de renegociação dos afretamentos precisa considerar a oferta de sondas no mercado. “Assim como a oferta de sondas no mercado aumenta com a queda nos preços [do petróleo], essa oferta diminui quando os preços voltam a subir.”
Caso o plano de reestruturação da Sete Brasil seja aprovado amanhã pelos acionistas, será preciso que a proposta, apresentada em documento de 170 páginas, passe também pelo crivo dos credores da companhia, na sexta-feira. Se o plano for rejeitado pela AGE, precisará ser refeito até o fim de junho, quando vence o prazo acertado com seis bancos credores que aceitaram prorrogar o vencimento de dívidas de curto prazo da Sete de US$ 3,6 bilhões por 90 dias. O acordo com os bancos surgiu como contrapartida à prorrogação dos empréstimos. O acerto ocorreu em 31 de março e vale até 30 de junho. É dentro desse período que será preciso encontrar uma fórmula que permita à empresa superar a crise. Caso contrário, a Sete Brasil poderá tornar-se alvo de execuções de garantias pelos credores.
Endividada e sem dinheiro para desenvolver seu projeto, que previa a construção de 29 sondas, 28 das quais para a Petrobras, com investimentos totais de US$ 25,5 bilhões, o futuro da Sete Brasil virou uma incógnita, assim como o de vários dos estaleiros contratados. Ao mesmo tempo, o preço do petróleo, em recuperação, despencou nos últimos meses, criando dúvidas no mercado se, no atual cenário, a Petrobras poderia tentar renegociar com a Sete Brasil as taxas de afretamento (aluguel) das sondas. “Se a Petrobras quiser sustentar o plano de negócios dela tirando dos acionistas da Sete Brasil, vai quebrar a companhia”, disse fonte do setor. Procurada, a Petrobras não se pronunciou.
O presidente da Sete Brasil, Luiz Eduardo Carneiro, disse ao Valor que a empresa trabalhou nos últimos 45 dias na elaboração do plano de reestruturação. Ele não quis detalhar os pontos contidos no trabalho. Pessoas próximas aos acionistas disseram que a proposta considera várias alternativas. Inclui aspectos sobre como financiar a companhia e sobre a disponibilidade de recursos para desenvolver a construção das sondas.
No mercado doméstico, a companhia não desistiu de obter, em algum momento, financiamento do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), assim como o apoio de longo prazo do Banco do Brasil e da Caixa Econômica Federal (CEF). “Há negociações com todos os credores para colocar mais recursos na empresa”, limitou-se a dizer Carneiro.
Além da questão de como financiar o projeto, o plano de reestruturação da Sete Brasil vai focar em pontos relacionados à performance dos estaleiros e fará uma avaliação sobre o estágio das sondas hoje em construção.
Carneiro admitiu que “dificilmente” o plano da empresa de construir 29 sondas de perfuração será mantido. Ele não quis dizer qual será o tamanho do novo portfólio, pois no plano de reestruturação da companhia há vários cenários sendo avaliados.
No mercado, há informações de que a carteira poderia ser reduzida para algo entre 16 e 19 unidades. Segundo Carneiro, a dívida total da Sete Brasil com os estaleiros, que somava US$ 850 milhões em fevereiro, alcançou US$ 1,2 bilhão. A dívida cresceu porque há dois estaleiros que, mesmo sem receber da Sete Brasil, continuaram a trabalhar nas obras. São eles KeppelFels, de Angra dos Reis (seis unidades) e Jurong, do Espírito Santo (sete unidades). Ambos são controlados por capitais de Cingapura.
Nos demais estaleiros, porém, a situação é incerta. O Estaleiro Atlântico Sul (EAS), de Pernambuco, cancelou de forma unilateral o contrato que tinha com a Sete para construir sete sondas. Não está claro até agora se o EAS poderá deixar definitivamente o projeto ou se poderá executar somente parte das unidades. São todas possibilidades em aberto até o momento.
Outros estaleiros estão em situação semelhante. Um deles é o Enseada, da Bahia, que interrompeu as obras de construção do estaleiro, fechou as portas e demitiu milhares de trabalhadores. Outro caso parecido é o do Estaleiro Rio Grande (ERG), cujo grupo controlador, a Engevix, enfrenta dificuldades financeiras depois de ser envolvido na operação Lava-Jato. Tanto o Enseada como o ERG poderão terminar com um número menor de unidades ou até mesmo serem excluídos do projeto.
No financiamento, uma possibilidade considerada é que os credores aceitem transformar parte da dívida com vencimento a curto prazo em crédito de longo prazo. Mas a empresa precisa também de novos recursos, o que passa pelo aporte de potenciais investidores, entre os quais aparecem os asiáticos. Hoje, além da dívida, a Sete tem disponibilidade de caixa suficiente apenas para fazer frente a compromissos de despesas gerais e administrativas.
Em relação ao Jurong, envolvido nas denúncias da operação Lava-Jato, Carneiro disse que, legalmente, existe um contrato entre o estaleiro e a Sete Brasil que está sendo seguido. “Mais adiante vamos ver o que será decido pela Justiça e nos adequaremos ao que for decidido.” O executivo disse ainda que não poderia falar sobre como deve ficar a situação de cada estaleiro, em termos de encomendas, pois há várias opções sobre a mesa para serem decididas por acionistas e credores. Mas as indicações são de que, em confirmando-se a redução da carteira de encomendas, Keppel Fels e Jurong consigam garantir os contratos que possuem.
Para Bacci, da Abenav, o corte nas encomendas pode até ocorrer, mas depois será preciso garantir novas obras. “Esperamos que seja um passo atrás para dar dois passos à frente depois.”