Um acordo tácito entre grandes bancos busca encontrar uma saída organizada para a crise envolvendo os grupos Odebrecht e Andrade Gutierrez, além de outras companhias investigadas na Operação Lava-Jato. O que une as instituições é o propósito de evitar um calote generalizado, que poderia trazer riscos ao próprio sistema financeiro, dada a magnitude da dívida de alguns desses grupos.
Conceder crédito novo segue fora do radar, mas a ideia é evitar soluções drásticas que impliquem o vencimento antecipado das dívidas – bilionárias, em muitos casos – dessas empresas com os bancos.
Nas instituições financeiras, o entendimento é que, se alguém esticar demais a corda, pode acabar ampliando as dificuldades das companhias e deflagrar um calote generalizado. O cenário considerado ideal, na visão do sistema financeiro, é que os grupos mantenham um mínimo de liquidez enquanto se reorganizam, de forma que as perdas sejam limitadas. “Vejo um grande risco para o setor bancário, mas acredito ser possível contorná-lo”, diz um experiente banqueiro.
É dado como certo que as construtoras terão de encolher para sobreviver. Para isso, as companhias precisarão vender ativos, desistir de novos projetos e até devolver concessões que ainda não haviam obtido financiamento, afirma um graduado executivo de banco.
Projetos que já estavam com financiamento contratado ou em fase de estruturação continuam sendo tocados, mas com muito mais rigor. Segundo um executivo de um banco estrangeiro, os limites de crédito disponíveis anteriormente não foram revistos, mas a liberação dos recursos tornou-se muito mais lenta e criteriosa.
A análise tanto da diretoria de crédito quanto do compliance (área que assegura o cumprimento de normas) dos bancos foi aprofundada. A tomada de decisões também foi desconcentrada e agora passa por um número maior de pessoas numa tentativa de tornar mais fácil a identificação de eventuais problemas, afirma esse executivo. Reuniões de comitês responsáveis por análise de crédito corporativo também estão mais frequentes, conta um outro banqueiro.
Um sinal disso foi visto semana passada, quando cinco empresas – Odebrecht, Camargo Corrêa, Andrade Gutierrez, Queiroz Galvão e Techint – desistiram do contrato de montagem eletromecânica da usina de Angra 3, alegando atrasos da Eletronuclear nos pagamentos.
Escritórios de advocacia relataram ao Valor que algumas operações recentes foram aprovadas com cláusulas que preveem a possibilidade de vencimento antecipado caso a empresa seja condenada por corrupção. Embora falte clareza sobre como isso funcionaria na prática, há nos bancos a percepção de que a regra ajuda a aliviar pressões sobre as áreas de controladoria para liberar crédito a empresas envolvidas na Lava-Jato.
Segundo um advogado diretamente envolvido na reestruturação das empreiteiras, os bancos estão engajados na busca de soluções e “não viraram as costas” para as companhias. Como exemplo, cita a renovação de alguns acordos de “standstill”, período em que os credores deixam de cobrar as empresas, que estavam próximos de acabar. Em contrapartida, nas operações em que é possível, houve um esforço generalizado para se acrescentar novas garantias, que vão desde bens e avais dos sócios das empresas. “Os credores têm pedido tudo o que podem.”
É sob esse maior escrutínio que se encontra o financiamento de duas operações importantes para a Odebrecht. Uma delas é um empréstimo sindicalizado de US$ 1,5 bilhão para as obras da linha 2 do metrô do Panamá, negociado com os bancos Citi, Deutsche Bank, Mizuho e Tokio Mistsubishi UFJ. A outra é um contrato de US$ 4,2 bilhões para o consórcio responsável pela construção de um gasoduto no Peru – do qual a empresa brasileira tem 75%.
Em ambos os casos, os bancos não retiraram dinheiro já acenado, mas colocaram o pé no freio para fazer uma análise mais cautelosa. Quando Marcelo Odebrecht, presidente da empreiteira, foi preso, há dois meses, o financiamento ao metrô panamenho estava nos últimos acertos. Até agora, porém, o dinheiro não saiu.
Por outro lado, a Odebrecht Óleo e Gás obteve, no mês passado, US$ 804 milhões junto a um grupo de bancos estrangeiros para financiar a construção de plataforma para a Petrobras e outros sócios no Campo de Libra. Fonte de um banco que participou da operação afirma que os recursos só saíram por se tratar de um financiamento de projeto, no qual o risco dos credores está blindado pela plataforma. “Não estamos correndo o risco do grupo.”