O grupo Camargo Corrêa encerra o ano sob o impacto da crise econômica brasileira. Houve dispêndio alto no Estaleiro Atlântico Sul (EAS), que até hoje não trouxe nenhum retorno aos seus acionistas. A Camargo chegou a ter 45%; hoje são 33% do capital do EAS.
A receita líquida prevê crescimento em torno de 6%, porém o resultado operacional consolidado projeta uma queda de 4% a 5%. “Além da retração de alguns segmentos, como construção pesada e imobiliária e cimento, todos os negócios foram pressionados em suas margens de ganho”, diz Vitor Hallack, presidente do conselho de administração da holding Camargo Corrêa S.A.
O conglomerado paulista está presente, além de engenharia e construção, em companhias de infraestrutura, geração e distribuição de energia, calçados e vestuário, cimento, têxtil, construção naval e incorporação imobiliária. As principais empresas são InterCement, a construtora Camargo Corrêa, CPFL Energia, Alpargatas e CCR. Esse grupo respondeu por 90% da receita consolidada da companhia em 2014.
Desde 2014, com o desfecho da Operação Lava-Jato, que investiga pagamentos de propina em contratos de obras da Petrobras, o grupo enfrenta o pior período em sua história. Sua construtora foi uma das empresas envolvidas no escândalo e teve executivos presos. Fez vários acordos com os órgãos da concorrência e da Justiça, arcando com pesadas indenizações e assumindo compromissos de adoção de compliance.
Hoje há uma outra frente de ataque na companhia: equacionamento do endividamento, agravado pelo impacto do câmbio sobre uma grande parte dos vencimentos em moeda estrangeira – dólar e euro. A alavancagem financeira prevista para o fim do ano é de 5,4 vezes a geração do Ebitda, que deverá fechar em R$ 4,52 bilhões. Portanto, a dívida líquida vai superar a faixa de R$ 24 bilhões.
Hallack observa que é uma fotografia do perfil financeiro hoje, com impacto de R$ 2 bilhões de variação cambial. Mas ressalva que isso pode mudar, me um ou dois anos, com o câmbio se estabilizando em patamares de R$ 3,50 a R$ 3,70. Ele informa que a dívida de curto prazo (360 dias) acaba de ser equacionada com empréstimo de 5,5 anos de prazo e dois de carência. “Estamos tranquilos quanto a isso”, diz.
A dívida total tem prazo médio de cinco anos e meio. O executivo, à frente do conselho da holding desde 2006, reforça que esse perfil é resultado de uma estratégia adotada lá atrás, tendo como premissas vários indicadores de crescimento do país que acabaram atropelados na crise por pressão nas margens dos negócios, taxa de juros e alta dependência de operações no país.
“Estamos saindo de um ciclo de investimento maciço de 2009 para cá”, exemplifica Hallack. “Naquele ano, adotamos um plano de investir R$ 27 bilhões até 2013. Fizemos R$ 19,3 bilhões, diretamente. E, de lá para cá, a média anual ficou em R$ 2 bilhões”.
Grande parte da dívida é fruto dos aportes feitos na aquisição da cimenteira portuguesa Cimpor, o que tornou a Camargo um player internacional desse setor. O grupo também triplicou sua participação na CPFL. Houve também um dispêndio alto no Estaleiro Atlântico Sul (EAS), que até hoje não trouxe nenhum retorno aos seus acionistas. A Camargo chegou a ter 45%; hoje são 33% do capital do EAS.
No atual cenário, com os impactos nos negócios e com o atual nível de endividamento, o grupo impôs um forte rigor nas decisões de investimento, diz o executivo, lembrando que, em outras condições, poderia estar investindo mais.
Hallack diz estar tranquilo e garante que não há um pacote de ativos à venda para fazer frente aos compromissos. Na estratégia de crescimento lá atrás, relembra, foi mencionado que poderia se desfazer de alguns ativos que não fossem mais estratégicos, como ocorreu: Usiminas, banco Itaú e Cavo. É hoje o caso da Alpargatas, a fabricante das sandálias havaianas. “Vai depender da oferta. É uma joia, a maior marca brasileira. Se houver proposta interessante, vamos reagir”, afirma.
O grupo tem um adviser para coordenar as ofertas. Segundo informações de fontes próximas, há vários interessados e uma negociação deve ser fechada até meados de dezembro. A Camargo tem o controle, com 67%. Do capital total, tem 44%. “É possível, mas não é certo”, comenta Hallack.
Quanto a CPFL e CCR, diz não haver nenhum plano de desmobilização de suas participações. Já a InterCement mantém um processo de busca de investidor minoritário, uma vez que a Camargo detém mais de 95% das ações da empresa. “Filosoficamente, somos um grupo associativo”, diz.
É na companhia de cimento, que tem operações na Argentina, Paraguai, Brasil, Portugal e alguns países da África, que está concentrada parte significativa da dívida consolidada do grupo, expressa em dólar e euro. O Brasil, que era a região mais rentável desse negócio, perdeu peso: o Ebitda, de 50% no ano passado, vai para cerca de 30% em 2015. A receita líquida, de 44% para 33%.