A USUPORT-RJ não concorda que a atuação da ANTAQ na navegação de longo curso tenha sido pautada pelo estrito cumprimento de suas competências, seja na regulação, seja na supervisão, muito menos na fiscalização. O mesmo se aplica aos serviços de cabotagem.
Nota distribuída pela USUPORT-RJ: “Na semana passada, foram publicadas algumas matérias com o posicionamento da ANTAQ em relação à recente decisão do Tribunal de Contas da União (TCU), que determinou a regulação dos armadores estrangeiros que exploram a nossa navegação de longo curso.
A USUPORT-RJ tem profundo respeito pela Agência Nacional de Transportes Aquaviários (ANTAQ) e seus servidores. Porém, jamais se calará diante de alegações não condizentes com a realidade do setor “a ser regulado”. A ANTAQ tem mais de 14 anos de existência, portanto, essa omissão não vem de hoje. Tanto a Lei º. 10.233/2001 que a criou, quanto o Decreto nº. 4.122/2002 que regulamenta suas atividades estão em vigor há mais de 14 anos, determinando que a Agência supervisione, regule e fiscalize os armadores estrangeiros. Mais que isso, a Lei e o Decreto determinam que a ANTAQ combata condutas anticompetitivas e formação de cartéis. Ou seja, tudo que consta da decisão do TCU, que a ANTAQ não fez até agora, está no ordenamento jurídico e não pode ser encarado com surpresa. A ANTAQ vem, há mais de 14 anos, sistematicamente, desrespeitando as leis brasileiras, deixando de cumprir seus deveres mais básicos.
Mesmo diante de tantas evidências negativas, para a Agência começar a pensar em regular a navegação de longo curso, foram necessárias críticas e denúncias, incluindo a intervenção do Tribunal de Contas da União (TCU), que, “com pesar”, verificou omissão da autarquia no cumprimento de suas competências. Então, como se vê, não é só a USUPORT-RJ que considera a ANTAQ omissa com os usuários da navegação de longo curso. A partir da leitura do Voto da Ministra Relatora, acompanhando por unanimidade pelos demais Ministros da Corte, fica evidente que o TCU também enxergou enorme omissão da ANTAQ.
Além da USUPORT-RJ e do TCU, os usuários dos serviços também enxergam grande omissão da Agência, principalmente, quando pagam fretes sem acompanhamento para evitar combinação de preços e formação de cartéis; sobretaxas impostas pelos armadores à revelia da Agência; sobre preços e regras impostas por intermediários; demurrages e detentions caríssimas e milionárias; câmbios convertidos com taxas abusivas e; Terminal Handling Charge (THC) sem comprovação e fiscalização de seu caráter ressarcitório.
Na navegação de longo curso, tudo acontece sem que a ANTAQ supervisione, fiscalize e regule tais cobranças em cumprimento às Leis. Os usuários enxergam omissão quando constatam que, depois de mais de 14 anos, a Agência ainda não publicou uma norma sequer que puna externalidades negativas, condutas oportunistas e lesivas praticadas por armadores, principalmente estrangeiros, que hoje dominam quase 100% da nossa navegação internacional.
Também enxergam omissão, quando os navios de linhas regulares cancelam escalas centenas de vezes por ano, sem justificativas, atrasando embarques de dezenas de milhares exportadores, entregando cargas de outras dezenas de milhares de importadores em portos diferentes dos pactuados. A omissão fica evidente quando são obrigados a assinar termos de compromisso leoninos, verdadeiros contratos de confissão de dívidas, com eleição de foro na cidade de Santos-SP, aumentando ainda mais as despesas dos usuários com os processos. Enxergam omissão, quando se recusam a assinar esses termos leoninos, ou a pagar cobranças não previstas e têm suas cargas e/ou documentos retidos, usados como verdadeiros reféns.
Ora, uma Agência Reguladora com mais de 14 anos de existência, que não publicou até hoje um normativo sequer que regule os serviços de transporte na navegação de longo curso e na cabotagem; uma Agência que, até hoje, mesmo tendo sido provocada pelo Conselho Administrativo de Defesa Econômica (CADE) em algumas oportunidades, não publicou um normativo que trate de defesa da concorrência, deve ser considerada omissa sim. A ANTAQ defende a concorrência em discursos, mas, na prática, nada fez e nada faz pela sua existência.
A verdade é que a ANTAQ constatou a existência de usuários na navegação de longo curso no final de 2013 e, efetivamente, começou a fazer esboçar reação para fazer algo no segundo semestre de 2014, sendo que, recentemente, arquivou uma denúncia sobre omissões de portos (mesmo tendo todas as condições de investigar) sem um ato fiscalizatório sequer, limitando-se a trocas de mensagem burocráticas internas visando encontrar justificativas para o arquivamento. O arquivamento foi necessário, pois, se encontrasse culpados, não poderia puni-los, vez que não existe normativo para tratar de casos assim. Hoje, quem pode ser multado por este tipo de ato dos armadores são os terminais, caso não avisem a Agência.
Até o dia 04 de julho de 2014, a Agência, com mais de 12 anos de existência naquela oportunidade, sequer sabia quantos armadores estrangeiros de linhas regulares (do segmento de contêineres) operavam no Brasil e, ao que tudo indica, não conseguiu, no curso do processo, demonstrar ao TCU que sabe quantos aqui operam atualmente.
A verdade é que, até hoje, a ANTAQ não tem o menor controle sobre a exploração econômica do tráfego aquaviário em rotas de linhas regulares na navegação de longo curso, principalmente, no segmento de contêineres, responsável por atender à massa de usuários. A autarquia não tem controle sobre os consórcios entre armadores estrangeiros (joint ventures) e, com efeito, se torna incapaz de determinar se esses consórcios são criados derreter a concorrência, consequentemente, prejudicando os usuários dos serviços. Enquanto isso, nos Estados Unidos e na Europa, os armadores vem amargando severas punições dos reguladores por atos como estes.
Por conta de suas interpretações das normas, a Agência se nega a realizar os acordos previstos no Art. 178 da Constituição, afirmando que convenções internacionais de segurança da navegação e a Convenção para a Facilitação do Tráfego Marítimo Internacional tornam o dispositivo constitucional e a Lei nº. 9.432/1997 desnecessárias, embora sempre mencione os acordos bilaterais existentes, quando lhe é conveniente.
Admite em parecer técnico que navios estrangeiros, inclusive porta-contêineres de armadores tradicionais, operam no Brasil com tripulação trabalhando em regime de quase escravidão e sem direitos trabalhistas respeitados, que o fato é prejudicial aos armadores nacionais, e nada faz, mesmo reconhecendo que se trata de um dos fatores de concorrência desleal, que retira navios nacionais do mercado, que desemprega brasileiros e contribui para dizimação da nossa Marinha Mercante. Ainda que tenha ciência que é seu dever zelar para que direitos humanos não sejam violados, pelos tratados internacionais dos quais o Brasil é signatário, pela nossa Constituição e Leis Trabalhistas que repudiam o trabalho escravo, permite que navios estrangeiros nessas condições entrem em águas jurisdicionais brasileiras e transportem nossas riquezas. Isso está acontecendo hoje, agora.
Se cumprisse o que determina o Art. 178 da Constituição e a Lei nº. 9.432/1997 e celebrasse os acordos, dentro dos princípios de reciprocidade, principalmente com os mais de 30 paraísos fiscais, seria possível proibir a entrada de navios com trabalhadores nessas condições de violação de direitos humanos.
Afirmar que está fazendo algo, que está tomando medidas para organizar o setor, não faz com que a omissão histórica da ANTAQ termine. Aliás, a sociedade já está cansada de passar por problemas e receber como resposta que o Estado está tomado providências. A desculpa é sempre a mesma de quando morrem cidadãos nas filas dos hospitais, quando aumentam os índices de violência, ou quando o Estado deixa de cumprir seus deveres. A sociedade está cansada de respostas midiáticas. Até hoje a ANTAQ não cumpriu as Leis. Em síntese, foi isso que o TCU disse em sua decisão.
Enquanto a ANTAQ afirma estar trabalhando, os usuários estão pagando milhões de dólares por dia, bilhões por ano, em cobranças sem fiscalização, supervisão e regulação. As externalidades negativas, as condutas oportunistas e lesivas estão acontecendo hoje, agora e continuarão até que a ANTAQ edite um normativo eficaz. A propósito editar normativo não basta. Ele precisa ser eficaz, para que não tenhamos pela frente a repetição da Resolução nº. 2,389/12-Antaq em relação ao THC, que produziu efeitos favoráveis apenas aos armadores estrangeiros.
De nada adianta sair da inércia e mergulhar na demora. Os usuários precisam de regulação para ontem, pois os prejuízos estão sendo pagos hoje. Por total ausência de normas, quem regula a navegação de longo curso e a nossa cabotagem são os armadores estrangeiros.
A USUPORT-RJ não tem esperanças que o normativo que regulará os armadores será publicado em 2016. Talvez, apenas em 2017, pois precisará novamente ser submetido à audiência, porque a primeira proposta da Agência não contemplou a regulação dos intermediários do setor.
Atenciosamente,
André de Seixas
Diretor-Presidente
Associação dos Usuários dos Portos do Rio de Janeiro – USUPORT-RJ”