O grupo Enseada Indústria Naval protocolou, na última sexta-feira (27/1), o pedido de Recuperação Extrajudicial (RE) da empresa na Justiça do Rio de Janeiro. O objetivo é reestruturar a dívida junto aos credores da companhia e permitir a retomada da operação de seu estaleiro, o Unidade Paraguaçu, na Bahia.
A situação do Enseada ilustra o contexto de crise da indústria naval brasileira, motivada não apenas por uma conjuntura global de retração das atividades de óleo e gás, mas pela paralisação das obras da Sete Brasil, um dos maiores projetos de construção offshore já idealizados no país e no mundo.
A Sete Brasil foi criada em 2010 para gerir ativos com investimentos na área offshore, sobretudo aqueles relacionados ao pré-sal. O projeto original previa a construção de 29 sondas país, o que serviu de estímulo para a construção de quatro estaleiros: o Atlântico Sul (EAS), em Pernambuco, o Jurong Aracruz (ES), o Rio Grande (Ecovix), no Rio Grande do Sul, além do Unidade Paraguaçu. É verdade que o EAS já tinha saído do papel com os navios da Transpetro, mas eram as sondas da Sete Brasil que garantiriam avanço tecnológico e demanda de longo prazo.
Em medidas diferentes, todos esses estaleiros já passaram ou passam por situação financeira delicada devido à suspensão dos contratos com a Sete Brasil, sendo, em alguns casos, obrigados a mirar outras áreas de negócios para sobreviver.
Em comunicado, o Enseada afirma que está buscando contratos de manutenção e reparo e agregando novas atividades a seu plano de negócios, em áreas como logística e de construção e montagem para a indústria de energia eólica.
“Estamos muito confiantes que conseguiremos estabilizar a dívida da companhia e focar na conquista de novos projetos e na retomada de nossas operações industriais na Bahia”, explica Fernando Barbosa, presidente da Enseada Indústria Naval.
Formado pelas empreiteiras Odebrecht, OAS e UTC Engenharia – todas alvo de investigações na Operação Lava Jato –, o grupo Enseada foi criado inicialmente para atender aos contratos de construção de seis navios-sonda da Sete Brasil e de conversão dos cascos de quatro FPSOs da Petrobras (P-74, P-75, P-76 e P-77).
O estaleiro em Maragogipe (BA) foi construído para executar o contrato com a Sete Brasil, mas pouco ou nada se fez no local. Segundo informações da contratante, apenas duas das seis unidades encomendadas ao Enseada – Ondina e Pituba – saíram do papel até o momento e suas obras estão em andamento no Japão.
Já as obras dos cascos das plataformas foram encomendados ao Estaleiro Inhaúma, no Rio de Janeiro, arrendado pela Petrobras. Somente dois deles (P-74 e P-76) foram executados no local e, mesmo assim, chegaram incompletos aos integradores Techint (Paraná) e EBR (Rio Grande do Sul).
Outra empresa diretamente afetada pela “quebra” da Sete Brasil foi o Ecovix. No fim de dezembro, a companhia do grupo Engevix, à qual a Sete encomendou três navios-sonda, entrou com pedido de recuperação judicial. A empresa tem hoje R$ 8 bilhões em dívidas e mantém cerca de 100 funcionários, após demitir mais de 3 mil pessoas.
Em 2016, o Estaleiro Brasfels (RJ) demitiu centenas de funcionários, a maioria envolvida na construção de sondas semissubmersíveis da Sete Brasil. Em seu último relatório financeiro, o grupo KeppelFells, proprietário do estaleiro em Angra dos Reis (RJ), associa a queda de 22% de sua receita na comparação anual à suspensão dos contratos com a empresa brasileira.
Assim como o Enseada, o Estaleiro Jurong Aracruz, no Espírito Santo, foca no segmento de manutenção e reparo para manter suas atividades em meio à baixa de pedidos. A suspensão dos contratos com a Sete Brasil representou uma queda de mais de US$ 3 bilhões no backlog da holding cingapuriana Sembcorp Marine, que fez provisões da ordem de US$ 330 milhões associadas aos contratos.
Além da suspensão de contratos para construir navios-sonda da Sete, o EAS foi impactado pelo cancelamento de petroleiros encomendados pela Transpetro nos últimos meses. Por outro lado, o empreendimento pernambucano ganhou fôlego com a assinatura de contratos para fabricação de oito Suezmax para a South American Tanker Company, no final de 2016.
Segundo dados do Sinaval, o número de empregados na indústria naval brasileiro caiu mais de 50% entre o final de 2014 e novembro de 2016, passando de 82 mil para 38 mil pessoas no período.