Indústria naval brasileira: um problema sem solução no curto prazo?

  • 11/01/2017
Edson Carlos Rocha da Silva - Presidente do Sindicato dos Metalúrgicos de Niterói - Foto: Paulo Botelho

Edson Carlos Rocha da Silva – Presidente do Sindicato dos Metalúrgicos de Niterói – Foto: Paulo Botelho

Apesar dos esforços de dirigentes sindicais e patronal, o setor da construção naval do país navega em águas turvas e sem rumo. O setor carece de uma política nacional e o governo ainda quer flexibilizar as regras de conteúdo local com argumentos que não se sustentam e que visam privilegiar a construção de embarcações fora do país, conforme disse o presidente do Sindicato dos Metalúrgicos de Niterói, Edson Carlos Rocha da Silva.

“Nesse momento, nós analisamos a indústria naval com grande decepção, principalmente para a juventude brasileira que vinha se formando, buscando entrar para o setor porque viam o segmento em franco crescimento. De repente, em menos de dois anos, o setor sucumbiu na base. Nós estamos na luta para refazer o trabalho que já tinha sido feito no início da década de 2000”, disse, acrescenta o setor não vê vontade política para resolver o problema.

Quanto a corrupção no setor, ele frisou que, ao invés de se condenar os culpados por corrupção, ou seja, pelo CPF, os culpados estão sendo condenados pelo CNPJ. “É inadmissível quando um juiz condena pelo CNPJ. Ele está condenando uma enormidade de trabalhadores, famílias no Brasil onde o crime que eles cometeram foram se formar como profissionais da área do setor naval e, agora, de repente, depois de o setor gerar 80 mil empregos no país, sucumbir em menos de dois anos, perdendo cerca de 60 mil postos de trabalho. Isso é uma grande decepção para os trabalhadores do setor”.

Nessa entrevista exclusiva ao site de notícias do MR News, Edson, que também é secretário de Administração e Finanças da Confederação Nacional dos Metalúrgicos da CUT (CNM CUT), fala sobre os problemas do setor como, por exemplo, a atual política da Petrobras, sobre os estaleiros, a falta de proposta do governo federal entre outros assuntos.

Diante desse quadro recessivo, com a Petrobras cortando investimentos, qual a saída para a construção naval do país?

– Infelizmente, quando a gente retomou a indústria naval, nós a alavancamos em cima de uma demanda de uma única empresa, que não é uma demanda pequena. É grande. A Petrobras precisa de muita obra da indústria naval. Como disse antes, não há vontade política e já começam a levar a indústria naval para fora do país. Por exemplo, a licitação que está se enrolando a cada dia que passa, parecendo “bacurau”. Amanhã eu vou, amanhã eu vou, e nunca vai. A licitação não sai nunca, porque era no mês de dezembro, passou para janeiro e agora ninguém sabe quando vai ser. Estão enrolando para deixar de fazer 65% de conteúdo local em Libra e Sépia, que garantiriam empregos para o povo brasileiro. Se um empresário não é correto, tira e coloca outro que queira e acredite no Brasil. Parece que os governantes brasileiros não acreditam no Brasil, não acreditam no seu povo e quando tiram o sustendo de seu povo, eles estão trabalhando para outros países e não para o povo brasileiro.

Há alguma política do governo federal para resolver esse problema?

– Já existia, o conteúdo nacional. Mas, hoje, estão querendo desconsiderar no caso de Libra e Sépia, porque o cara disse que já estava acordado, que descobriu um poço de 65% de conteúdo nacional. E, agora, de repente, querem levar tudo para fora do país. A quem diga que tudo já está combinado com a China e conteúdo nacional zero. Essas pessoas não sabem que essa lei foi criada para gerar empregos e para as indústrias ficarem no Brasil. E vem um jato de água fria, dizendo que vai levar as obras para fora do país. E como ficam as pessoas que investiram na indústria brasileira? Ninguém tem consideração com dada disso. Quando o pessoal fala dos políticos é justamente por causa disto. Eles só penam neles e não pensam em ninguém. Não pensam no povo brasileiro.

Como o sindicato analisa a atual política da Petrobras de mandar construir cascos fora do país?

– Chega a ser vexatório uma coisa desse tipo. Tive um encontro na Austrália no mês de novembro passado. E nesse encontro os australianos me fizeram a seguinte pergunta: Edson, o Brasil construiu vários estaleiros, com diques enormes para fazer cascos, para a fabricação de FPSO, plataformas de petróleo. Por que novamente estão buscando cascos em Cingapura? Então é uma pergunta que respondo com vergonha de ser brasileiro. Por que o governante principal do país permitiu uma coisa dessas? Essa política da Petrobras de fazer obras fora do país, principalmente de navios sondas que poderiam estar sendo feitos no Brasil. Nas os cascos estão vindos de Cingapura para serem terminados no Espírito Santo. Tem um estaleiro pronto para fazer na Bahia que foi fechado porque não tem interesse do governo atual. É inadmissível ouvir uma coisa dessa e ter que ficar pasmo com esa política da Petrobras que é absurda.

Alguns estaleiros estão fechando e vários outros estão sem encomendas. O que o governo poderia fazer, em sua opinião, para evitar as demissões?

– Claro. O que o governo pode fazer é obrigar a Petrobras a cumprir o conteúdo Nacional esse é o primeiro ponto. O segundo ponto é o governo brasileiro tem que parar de deixar navios estrangeiros de fazer a cabotagem na costa brasileira. É preciso fazer uma política de cabotagem. Os países que tem mar, que tem navegação interior, quem navega nos rios e na costa são navios do próprio país. E tem que ser construídos no país. Isso faz a máquina girar e quiçá, daqui por diante, fazer uma política de desmonte  de navios. Quem construiu  tem que desmontar. Tem que respeitar essa regra. Organiza-se  o desmonte de navios. Para fazer uma indústria sustentável depende disso tudo. Navio desmontado vira sucata  e que o país mais tem é siderúrgicas querendo sucatas.

O reparo naval é uma saída para o setor no curto prazo?

– Certamente. No curto prazo o reparo naval é o viés nesse exato momento. Só que alguns navios estão começando a ser paralisados na Baía de Guanabara. Na Baía do Espírito Santo está cheio de navios parados porque a Petrobras está cancelando os contratos e os armadores estão sem dinheiro, inclusive para fazer os reparos nas embarcações certificadas para voltar ao trabalho offshore. Então, não é como estalar dos dedos. A gente tem que fazer a máquina rodar. O cara não vai reparar uma embarcação se não houver contratos. Então, por que está se cancelando os contratos com as embarcações que já estão no Brasil e tentando trazer navios de fora. A Antaq e outros órgãos têm que ficar de olhos abertos para nós garantirmos o nacionalismo. A gente precisa de empregos nacionais. O reparo naval é sim uma grande solução nesse momento.

Fonte: MR News
11/01/2017|Seção: Notícias da Semana|Tags: |