A crise econômica brasileira, a necessidade de sua recuperação e a defesa do conteúdo nacional estão produzindo um fenômeno raro na relações trabalhistas: a união por um mesmo ideal dos sindicatos de trabalhadores com os sindicatos, associações, instituições e federações de empresas e empregadores. Nos próximos dias, será publicado um anúncio de página inteira em alguns jornais conclamando esta união em defesa da criação de novos empregos e do conteúdo nacional, que é o pilar central dessa união.
As últimas ações efetivas da Petrobras, apoiadas francamente pelo IBP e por declarações do novo presidente da Agência Nacional do Petróleo, defendendo uma adequação nas regras do conteúdo nacional nas obras a serem contratadas pela estatal, além de uma posição dúbia e insegura do Ministério das Minas e Energia, despertaram a angústia do empresariado. Eles se organizaram e fundaram o movimento Produz Brasil, levantando uma bandeira contra a força das petroleiras e suas influências junto ao governo e à ANP, para que não se enviem as obras das plataformas de Libra e Sépia para o exterior.
O início do movimento nasceu a partir de uma declaração do presidente da Petrobras, Pedro Parente, quando disse que os preços para construir as plataformas no Brasil eram 40% superiores aos de construí-las no exterior. Esse número causou desconfiança no mercado. Pareceu aleatório porque não foi apresentado nenhum dado real que pudesse ser confirmado. A Abimaq, inclusive, informou que nenhuma empresa recebeu consultas sobre preço de equipamentos. E também nenhuma empresa de engenharia de montagem foi consultada. Mesmo assim, baseado nesta premissa apresentada por Parente, a Petrobras manifestou o desejo de levar as obras para o exterior, fechando os olhos para a crise que o país passa, com quase 13 milhões de desempregados, com a indústria naval brasileira quase a zero em suas atividades.
O Petronotícias teve a informação da união de trabalhadores e patrões em primeira mão e foi ouvir o Presidente do Sindicato dos Metalúrgicos do Rio de Janeiro, Jesus Cardoso, um dos líderes desse movimento inédito na economia brasileira:
Como está o mercado para os metalúrgicos neste momento?
Não é nem neste momento. Na verdade, é desde o final de 2014, quando já se apresentava um mercado decrescente, no setor naval, na Petrobras, paralelamente à questão da lava jato. A gente não sabe se foi o ovo ou a galinha, mas coincidiu de os dois mercados declinarem, um final de 2016 ruim, por consequência de um 2015 péssimo. O setor naval é um mercado dizimado. A gente imaginava que em 2016 iríamos sair do fundo do poço. Para 2017, a gente imagina que o fundo do poço já chegou, a indústria naval no Rio está dizimada. Na nossa região, aqui no Rio, chegamos a ter em 2014 entre 15 mil e 18 mil funcionários no setor naval, sem contar com aquelas empresas que prestaram serviços para a Petrobras em Itaguaí, como a EBE e a EBSE. Temos ainda o Eisa, o Rio Nave… Se formos somar isso tudo e mais aquelas empresas terceirizadas, aquela coisa toda, nós perdemos quase 20 mil empregos. Do final de 2015 até o final de 2016, passaram pelo sindicato mais de 20 mil trabalhadores relacionados, em sua grane maioria, ao setor naval e em torno da Petrobras.
Vocês tiveram um embate com a Petrobras nas negociações salariais. Como foi este momento?
Desde quando mudou a presidência da Petrobras, quando entrou o banqueiro, o Bendine, que as pessoas só o chamavam de Maldine, não se queria diálogo com o trabalhador. Já era difícil. Com a entrada agora do Pedro Parente, a coisa ficou ainda mais restrita. Na verdade, nós estamos fazendo um movimento para reatar, reabrir as portas da Petrobras para o diálogo. Até esta questão agora da licitação só com empresas estrangeiras. Vai ter um ato amanhã (31) na porta do Comperj. Vamos paralisar aquilo tudo, não deixar os funcionários da Petrobras entrarem no Comperj. Ao mesmo tempo, estamos fazendo um ato coletivo, incluindo o sindicato do Rio, de Niterói, estamos tentando trazer Angra também, e junto com os sindicatos dos patrões também …
Mas por que vocês vão tentar impedir a entrada dos funcionários da Petrobras no Comperj?
Para que a empresa possa nos receber e fazer uma negociação. A negociação é justamente isso. Conteúdo nacional, como fazer para a Petrobras voltar a investir de novo, para poder destravar algumas questões que ela colocava empecilho. E que ainda coloca. É para destravar o diálogo. Por exemplo, a Transpetro, que negociava diretamente, tinha as portas abertas. Hoje a Transpetro tem um presidente, mas ela virou uma subsidiária de fato. Tinha autonomia num passado recente, mas agora ela precisa de autorização para negociar.
Vocês querem negociar com quem na Petrobras?
Queremos falar com o próprio Pedro Parente ou alguém que de fato que tenha autonomia para poder modificar essa realidade que eles estão querendo apresentar. Alguém com poder de decisão.
Houve o Movimento Produz Brasil, que reuniu diversas associações, federações e instituições empresariais, mas os sindicatos dos trabalhadores não entraram nesta busca por mais empregos. Por quê?
Nós apoiamos esses atos e queria dizer que estamos nos organizando, nos cotizando para publicar um anúncio de página inteira nos principais jornais para fechar esta lacuna. Estaremos juntos com o Sinaval, a Firjan e a Fiesp para unir os sindicatos dos trabalhadores e os patronais levantando a mesma bandeira, defendendo o conteúdo nacional. Afinal, o conteúdo nacional beneficia as empresas e beneficia também os trabalhadores. Nós queremos que as obras fiquem aqui, porque nós temos qualificação para isso. Este é só o start para outros objetivos. É para a Petrobras entender que nessa hora não tem divisão. Nessa hora tem a união para poder trazer os empregos para cá. Das 30 empresas convidadas para a obra do Comperj, pelo menos 21 delas tem problemas de ordem de corrupção. Então, se for valer este argumento, de que não pode se relacionar com as empresas do Brasil por conta disso, também não pode se relacionar com as empresas lá de fora. Nesse meandro não tem santo. Veja o exemplo do Trump. Além de literalmente fazer um muro, ele está querendo dar força para empresas americanas. Primeiro eles. E eles foram o arauto da Globalização. Eles perceberam que globalizando estão tirando os empregos de lá. Por que nós temos que abrir? A maioria das obras têm que ficar aqui. O ato é neste sentido. Para a Petrobras entender que se o formato não é o ideal, que se negocie, e não se elimine com tudo. E que eles nos recebam também.
Como o sindicato vê a reforma trabalhista?
A gente acha que a CLT é uma vitória do povo brasileiro. É uma das leis mais avançadas do mundo. Não se pode retirar direitos dos trabalhadores, como 13º e férias. Nós estamos abertos para poder avançar e ter emprego. Não pode é causar prejuízos do jeito que eles querem, onde o mais forte vai vencer o mais fraco. Assim a gente não aceita. Quando você tenta retirar isso, os direitos, de uma forma bruta, nós somos contra. Mas se tiver uma forma de trazer mais empregos, nós apoiamos. O que for burocrático e entrave para que as coisas avancem e a gente tenha mais emprego, somos a favor da modernização na busca do emprego. Na verdade, nós temos níveis de burocracia que tornam o custo muito alto. Temos que encontrar meios para diminuir esta burocracia e este custo.
Como o sindicato vê a venda dos ativos da Petrobras?
Nós aqui do sindicato do Rio de Janeiro somos contra. A Petrobras – o Parente deve saber, porque é uma pessoa inteligente – foi criada dizendo que o petróleo é nosso. Do Brasil. O Brasil é feito de gente. Somos todos nós. No futuro, talvez não seja. Mas estamos no presente e o petróleo é muito importante. Vender ativos enfraquece a Petrobras como empresa, como instituição. Independente desta questão da Lava Jato. Não pode usar esse argumento para se desfazer dos ativos. Ele já vem com este intuito desde a época do governo Fernando Henrique, quando foi ministro, quando queriam até mudar o nome da empresa. Quando você não reconhece o histórico da empresa, quando você comanda, não vai ser diferente. Então somos contra. Pode-se melhorar o que é hoje, requalificar, se adequar ao mercado, tudo isso. Se as refinarias de Pernambuco, do Comperj, precisam se adequar, que se faça, mas não se vendam ativos. A BR dá lucro. Qual o objetivo de você vender uma empresa que dá lucro? Nós temos que ver se não é entregar o patrimônio brasileiro para o estrangeiro. Estados Unidos e Inglaterra, justamente que lideraram a globalização, estão num movimento contrário. O momento é trabalhar para dentro. E o presidente da Petrobras que está aí está fazendo um movimento contrário.
Como está vendo o futuro do país?
Eu queria colocar que defendemos que se puna quem é corrupto, quem cometeu crimes. Mas precisamos destravar o mercado. Com este desemprego, estamos na beira de uma convulsão social. Já está ocorrendo. Nos presídios. Aqui no Rio de Janeiro, com policiais, professores, servidores sem receber salários. Precisamos de uma retomada das obras no Brasil. Nós, como sindicato e como entendedor do sentimento do trabalhador, fazemos este apelo. Independente dessa situação de Brasília, da Lava Jato, que se tenha um movimento neste sentido. Nós estamos fazendo, nos unindo com as empresas para esse grande objetivo. É um momento histórico que estamos vivendo. Precisamos de um final feliz.