Esta pergunta, que vale alguns bilhões de dólares e milhares de empregos no Brasil, precisa ser respondida pelo Governo Federal através de uma Política de Estado.
Historicamente, a indústria naval brasileira sempre viveu de soluços. São anos de bonança com obras e empregos e, depois, anos de terra arrasada, com grande desemprego, como estamos passando nos últimos quatro anos.
Mundialmente, os países que têm a indústria naval como um segmento importante implementam políticas para o desenvolvimento e a manutenção dessa indústria, o que é de conhecimento de quem entende minimamente do assunto, como podemos demonstrar abaixo.
Na China, o governo central é sócio dos estaleiros e garante, através de intervenção direta, que os preços praticados sejam muito mais baratos que os observados no mercado mundial, somando-se a isso, ainda, o fato de que os empregados chineses não têm os benefícios que hoje são pagos por toda a indústria brasileira.
No Japão, observa-se uma estreita cooperação do setor marítimo com o sistema bancário do país, fazendo com que os financiamentos sejam concedidos com taxas de juros muito atrativas, chegando a ser perto de zero por cento ao ano. A alta produtividade da indústria naval, adquirida após mais de 20 anos de investimentos no setor, e a existência de uma indústria de navipeças com atendimento praticamente de 100% das necessidades fazem com que a indústria daquele país seja muito procurada por armadores internacionais.
Na Coreia do Sul, os preços são cerca de 13% a 40% mais baixos que os próprios custos de produção, devido ao apoio governamental e à ampliação e instalação dos estaleiros como unidades de produção no ‘estado da arte’, com especialização no nicho de navios de grande porte, especialmente os VLCCs. Mas isso só foi possível, também, após 30 anos de investimentos no setor incentivados pelo governo local.
Nos EUA, o “Jones Act” é o compromisso de Estado da economia americana com o crescimento do emprego e a soberania nacional. Essa lei, basicamente, obriga que a cabotagem seja feita por navios de bandeira americana produzidos em estaleiros americanos e de propriedade de cidadãos americanos.
Como podemos ver, os países que têm uma indústria naval forte, independentemente de seu espectro político, só são fortes nessa indústria devido à intervenção do Estado. Não é razoável, portanto, supor que teremos uma indústria naval forte no Brasil se não tivermos o apoio de uma Política de Estado patrocinada pelo Governo Federal.
O Governo atual cobra do setor que ele seja competitivo. Podemos afirmar que, em igualdade de condições, somos competitivos — mas só em igualdade de condições, porque, enquanto tivermos os custos trabalhistas e tributários que temos e não forem sanadas as deficiências na infraestrutura logística do país que encarecem nossos custos, aliados à falta de navipeças no Brasil, não teremos como sermos competitivos, apesar da excelente qualidade da mão de obra brasileira.
A indústria naval precisa de perenidade em encomendas por pelo menos 20 anos, pois, sem isso, não conseguiremos atingir os índices internacionais de produtividade. Precisamos de linhas de crédito competitivas e de um Fundo Garantidor para estruturação de financiamentos, além de um conteúdo local adequado para que tenhamos uma indústria de navipeças no Brasil em condições de atender nossas necessidades para que, com isso, possamos baratear nossos custos.
Além disso, precisamos de uma reforma tributária eficaz para que possamos ter preços competitivos com os praticados no mercado internacional e, com isso, não dependermos somente da demanda local.
Escutamos constantemente que esta indústria já foi muito ajudada pelo Governo e não decolou. Isso não é verdade, pois quem conhece nossa indústria sabe que entregamos mais de 500 embarcações em pouco mais de oito anos: navios petroleiros, gaseiros, de apoio marítimo (PSVs, AHTSs, PLSVs e outros), bem como várias plataformas marítimas, completas ou com montagem e integração de módulos. E tudo isso foi feito com qualidade muito superior às obras navais que hoje recebemos, vindas da China e de outros países asiáticos.
No Brasil, setores como a indústria automobilística e a agricultura recebem subsídios diretos do Estado brasileiro há muitas dezenas de anos e não vemos nenhuma perspectiva de modificação nessa prática, apesar do discurso de que o mercado tem de ser o parâmetro. No caso desses dois setores, não só o mercado, mas também os subsídios, é que ditam o crescimento.
Portanto, a resposta à pergunta que vale bilhões de dólares e milhares de empregos no Brasil, que a indústria naval aguarda, deve vir da vontade de criar uma Política de Estado adequada por parte do Governo Federal.
Ariovaldo Rocha – Presidente do Sindicato Nacional da Indústria da Construção e Reparação Naval e Offshore (Sinaval)
Publicado em Portos e Navios