A 17ª edição da Navalshore – Feira e Conferência da Indústria Marítima trouxe um cenário de otimismo com a perspectiva de novas frentes de trabalho e desafios que vão desde o fortalecimento do marco regulatório e políticas adequadas de conteúdo local até melhores condições de financiamento, capacitação e um olhar antenado com o processo de transição energética que está em curso no mundo. No evento, realizado em agosto, no Rio de Janeiro (RJ), os agentes destacaram o momento de bons diálogos e a necessidade de políticas que estimulem encomendas e um aumento consciente do conteúdo local.
Na abertura da Navalshore, o presidente do Sindicato Nacional da Indústria da Construção e Reparação Naval e Offshore (Sinaval), Ariovaldo Rocha, destacou que estão se abrindo novas frentes que, quando estiverem consolidadas, vão representar oportunidades de crescimento e de desenvolvimento tecnológico para estaleiros e fornecedores. Para o vice-presidente da Federação das Indústrias do Estado do Rio de Janeiro (Firjan), Raul Sanson, os ânimos da indústria estão renovados com as perspectivas de investimentos para os próximos anos, com expectativa de encomendas e maior participação da indústria nacional.
O então ministro de Portos e Aeroportos (MPor), Márcio França, afirmou que, desde o primeiro dia de governo, a orientação do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) é dar uma atenção especial à construção naval e ao escoamento da produção do interior do país até os portos. França, que deixou a pasta em setembro, falou que a Petrobras é, historicamente, uma grande contratante da construção naval, mas que existem outros segmentos com grande potencial de demandas. Ele citou o transporte na região Norte, que possui carências para a renovação de frota, tanto no transporte de granéis sólidos, quanto no transporte de passageiros.
O presidente da Transpetro, Sérgio Bacci, reforçou que tornar a indústria mais forte passa por uma política de estado de longo prazo, que inclui linhas de créditos acessíveis, regras adequadas de conteúdo local e encomendas perenes. No evento, Bacci detalhou o TP25 — programa da Transpetro que pretende encomendar a construção de 25 navios de cabotagem em estaleiros nacionais. Segundo Bacci, a meta a ser perseguida demandará aproximadamente R$ 12,5 bilhões de investimentos.
O pacote para renovação da frota da Transpetro vem sendo desenvolvido em conjunto com a holding Petrobras. A expectativa da Transpetro é lançar o edital para contratação dos navios em janeiro de 2024. “Estamos desenhando o edital, fazendo consultas para ver a capacidade dos estaleiros. Feita essa fase, em janeiro, mais tardar em fevereiro soltar o edital da licitação”, declarou Bacci, durante a Navalshore.
O novo programa para renovação e expansão da frota da Transpetro foi batizado de TP25, em referência ao nome da empresa, que completou 25 anos em junho, e ao número de navios que a empresa pretende construir no Brasil, bem como ao ano de 2025, quando a administração da Transpetro espera bater quilha dos primeiros navios desse plano. O escopo prevê gaseiros e navios de transporte de produtos claros e escuros, de 7.000 a 48.000 TPB (toneladas de porte bruto). Bacci acrescentou que manterá o padrão de navios MR1, MR2 e gaseiros que já operam atualmente. “Basicamente, é o que já foi construído no passado. São navios já utilizados pela Petrobras”, explicou.
Bacci voltou a dizer que as encomendas vão respeitar as condições rígidas de governança. Ele acrescentou que sua gestão abriu diálogo e vai colaborar em parceria com órgãos de controle como a Controladoria Geral da União (CGU) e o Tribunal de Contas da União (TCU). “Não será a qualquer preço, não será a qualquer prazo. Tenho conversado muito com os estaleiros. Não podemos errar de novo. É muito próximo o que aconteceu. Então precisamos acertar”, afirmou Bacci.
Ele ressaltou que acertar significa chegar a preços adequados e enfatizou a necessidade da política setorial olhar para a geração de empregos locais e dos benefícios para o país, a despeito da construção no Brasil ser mais cara do que construir na China. “Vamos pagar mais caro do que na China, mas esse é o custo que temos que pagar para gerar emprego no país”, ponderou Bacci.
Ele disse ainda que a construção desses navios terá papel econômico e será importante para ajudar a Petrobras a equilibrar a quantidade de embarcações estrangeiras afretadas e, consequentemente, conseguir pagar menos nesses contratos. A frota que opera para a Petrobras, segundo ele, é composta por mais de 100 navios afretados. “Queremos com esses navios (TP25) ajudar a balizar as taxas de afretamento que a Petrobras paga aos armadores internacionais”, afirmou Bacci.
O Banco Nacional do Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) observa o setor de petróleo e gás aquecido com a previsão de entrada de operação de novas plataformas que vão demandar embarcações de apoio marítimo para atendê-las. O banco de fomento e principal agente financeiro do Fundo da Marinha Mercante (FMM) também avalia que a alteração na Lei 10.893/2004, no ano passado, possibilitou o apoio a investimentos na construção e integração de módulos e ao desmantelamento de embarcações, que antes não era possível. Há uma expectativa também com o programa ‘TP25’ da Transpetro.
Até 2022, o entendimento era que o FMM não podia fazer financiamento de determinados investimentos. A chefe do departamento de gás, petróleo e navegação do BNDES, Elisa Lage, explicou que, a partir da modificação, está expresso na lei e na resolução do Conselho Monetário Nacional (CMN) que os recursos do FMM podem ser destinados a outras aplicações e investimentos referentes ao desenvolvimento da marinha mercante e da indústria da construção e reparação naval brasileira.
“O BNDES está aguardando essa demanda. Já iniciamos conversas e estamos abertos para receber as empresas, entender como são esses projetos e verificar a melhor possibilidade de apoiá-los”, disse Elisa, durante painel da Navalshore. Ela acrescentou que, antes da alteração da lei, o BNDES já defendia que os recursos do FMM fossem aplicados nesses investimentos para dinamizar o setor.
A chefe do departamento do BNDES contou que o banco já fomenta operações para investimentos em construção e integração de módulos. Elisa lembrou que a Petrobras anunciou que pretende descomissionar 50 plataformas até 2030 e contou que o BNDES já conversa com os vencedores do leilão promovido pela companhia para o desmantelamento da P-32 (Ecovix e Gerdau). “Estamos conversando com vencedores do bid e vendo a capacidade de financiar esses investimentos. Entendemos que os grandes fornecedores de sucata podem ter interesse em fazer o desmantelamento desses navios e que eles poderiam ser apoiados com linhas de financiamento do FMM”, comentou Elisa.
Ela acrescentou que existe muita demanda por redução de emissão e eletrificação em plataformas. A Petrobras anunciou a previsão de entrada em operação de 16 novas plataformas até 2030 e o BNDES verifica que esses projetos envolvem questões relacionadas à pegada de descarbonização do setor como um todo. Elisa disse ainda que, nas conversas com empresas de apoio marítimo, já é possível notar uma busca por embarcações mais eficientes, tanto para modernização de embarcações visando a redução de emissões, como também para a expectativa do tipo de tecnologias que estarão no escopo das novas construções.
“Temos notado a busca por menor consumo de energia e por redução de emissões. Sentimos na oferta das embarcações, quando empresas demandam financiamento. Isso vem da demanda puxada um pouco pelas petroleiras, que precisam reduzir as emissões e vai chegando ao armador”, analisou Elisa.
O BNDES também projeta, mais para frente, a possibilidade de operações de crédito para indústria naval voltadas para estruturas flutuantes por geração eólica offshore, segmento que passa por período de regulamentação. “Na falta de demandas por navios e módulos, víamos interesse dos estaleiros de se mostrarem presentes e atender a esse mercado. Talvez agora, com demandas de embarcações e módulos, isso fique mais em stand-by aguardando marco regulatório e investimentos mais à frente. Mas entendemos que isso poderia ser apoiado com recursos do FMM”, afirmou Elisa.
O Sindicato Nacional das Empresas de Navegação Marítima e a Associação Brasileira das Empresas de Apoio Marítimo avaliam que o país precisa de uma política pública setorial cada vez mais forte para continuar a crescer. “O setor quer responder à demanda. O apoio marítimo é essencial na cadeia de O&G e será em qualquer indústria offshore”, disse a vice-presidente executiva do Syndarma/Abeam, Lilian Schaefer.
O diretor da Agência Nacional de Transportes Aquaviários (Antaq), Wilson Lima Filho, disse que sopram ventos favoráveis à navegação e à construção naval no Brasil. Ele acrescentou que existem oportunidades para a indústria associadas ao mar e aos portos que incluem o ciclo de vida dos ativos. “O futuro do Brasil está na Economia Azul”, projetou Lima Filho.
A Navalshore 2023 teve os patrocínios Master da Transpetro e Platina da International Akzo Nobel e superou a expectativa de público, ultrapassando a marca de 12 mil visitantes que marcaram presença nos três dias de evento. A 18ª edição da Navalshore será realizada de 20 a 22 de agosto, no Expomag, no Rio de Janeiro. A Navalshore é realizada desde 2004 no Rio de Janeiro. Um público total superior a 140 mil pessoas já passou pela feira, reunindo profissionais, empresários e representantes do poder público. Paralelamente à feira, a cada edição são promovidos cursos, workshops e conferências, tendo sido realizados mais de 600 destes eventos.
A mais importante feira do setor na América do Sul é ponto de encontro obrigatório para empresas e profissionais que atuam na indústria marítima. A Navalshore Organização de Eventos, em 17 edições, foi a responsável pela exibição de mais de quatro mil marcas de fornecedores de produtos e serviços para a indústria naval do mundo inteiro, promovendo negócios e desenvolvendo parcerias. Tem como principal parceira a revista Portos e Navios, provedora do conteúdo e referência editorial da indústria marítima no Brasil, fundada em 1958.