Barcos de apoio para Petrobras devem inicialmente mobilizar, ao menos, 3 estaleiros. Incentivo ao conteúdo local, fluxo de caixa de projetos e capacitação da mão de obra estão na agenda setorial.
Representantes de grandes estaleiros têm a expectativa de que, ainda este ano, comece a surgir uma demanda significativa para a construção de embarcações de apoio. A avaliação é que o anúncio da Petrobras sobre a contratação de 38 barcos de apoio movimentou o mercado e pode ser o início de uma retomada das encomendas. Como o edital da empresa para contratação de 12 PSVs (transporte de suprimentos) estabelece a fabricação de, no máximo, quatro embarcações por vencedor, pelo menos, três estaleiros serão ocupados somente com esta demanda inicial. Outra esperança é que ocorra o lançamento do edital para construção de navios para a Transpetro, com contratação até o final de 2024.
A Petrobras tem intenção de publicar, até o final do ano, um edital para a contratação de mais 10 OSRVs (combate a derramamento de óleo), além dos 12 PSVs anunciados em março. A empresa estima aproximadamente US$ 2,5 bilhões em investimentos em até 38 embarcações de apoio marítimo, com geração de 28 mil empregos diretos. Já a Transpetro espera lançar, até o final de maio, o edital de licitação para a construção de quatro navios hand para a frota da empresa. O presidente da Transpetro, Sergio Bacci, disse que os projetos constam no plano estratégico da Petrobras (2024-2028) e estão na fase final de aprovação junto à governança da holding.
Além dos quatro navios, estão em estudo outros oito gaseiros e quatro navios MR1. Bacci disse que, possivelmente, esses 12 projetos passarão para a área de governança no segundo semestre e terão os editais publicados em 2025. A Transpetro tem interesse de ampliar a frota própria com a incorporação de gaseiros e navios de transporte de produtos claros e escuros, de 7.000 a 48.000 TPB (toneladas de porte bruto), padrão de navios MR1 e MR2 que já operam atualmente para a companhia.
Os anúncios foram feitos por Bacci e pelo presidente da Petrobras, Jean Paul Prates, na semana passada, durante o evento ‘Fortalecimento da indústria naval nacional e o setor energético offshore’, promovido pelo Instituto Brasileiro de Petróleo e Gás (IBP), no Rio de Janeiro. Na ocasião, foi lançado o Mapa de Estaleiros do Brasil, parte da iniciativa integrada entre os setores de petróleo, gás, energia e naval para levar ao mercado informações sobre a infraestrutura dos estaleiros e projetos no país.
O presidente da Associação Brasileiras das Empresas da Economia do Mar (Abeemar), João Azeredo, que participou da segunda retomada da indústria em 2010, observa convergência de ideias e aproximação institucional dos diferentes segmentos em prol da retomada da indústria. Após o evento do IBP, ele comentou que também nota mais ponderação nas discussões e propostas mais concretas e com objetivo de se tornarem duradouras.
“Veremos o resultado disso tudo quando as licitações estiverem na rua e os estaleiros estiverem contratados e contratando gente. Estamos caminhando institucionalmente e governamentalmente, com uma série de medidas para reduzir a assimetria entre o Brasil e os concorrentes asiáticos, tentando desatar as amarras para a indústria”, analisou Azeredo, que também é vice-presidente do Sindicato Nacional da Indústria da Construção e Reparação Naval e Offshore (Sinaval), em entrevista à Portos e Navios.
Azeredo considera importante começar o processo de retomada da indústria o mais rápido possível, fazendo voltar a girar ‘um motor que está parado’. Ele entende que o mais importante, no estágio atual, é haver previsibilidade ao longo de escala de encomendas para aumentar a competitividade da construção naval brasileira.
Nos diálogos com o governo sobre conteúdo local, o Sinaval tem defendido tratamentos diferentes dependendo do segmento de embarcações. No caso da contratação de FPSOs, o sindicato é a favor de incentivos para que o conteúdo local aumente gradativamente, em vez de punições às empresas em forma de multas. Outro assunto importante é a capacitação de mão de obra, que também tem um grupo de trabalho dedicado.
O estaleiro Enseada (BA) vê com grande interesse novas demandas para construções de embarcações como os PSVs anunciados pela Petrobras. “São projetos de menor complexidade que se encaixam bem neste momento, no qual parte da indústria de construção naval e offshore brasileira procura retomar suas atividades”, comentou o CEO do Enseada, Ricardo Ricardi. Ele disse que o estaleiro está pronto para mobilizar sua estrutura, mão de obra e toda a cadeia de suprimentos associada para o caso de novas obras de navios. “Acumulamos ao longo da história grandes feitos e já empregamos diretamente cerca de 9 mil pessoas entre os anos de 2013 e 2014. Estamos prontos para atender às novas demandas do mercado”, afirmou.
Para Ricardi, os desafios da Enseada se assemelham ao que ocorrerá com praticamente todo o mercado de construção naval e offshore no país, que vem de um ciclo de baixíssima demanda ao longo dos últimos anos. A expectativa da empresa é que a retomada desta indústria aconteça com a requalificação de parte da mão de obra e com o reinício do processo de ganhos de produtividade. “Apesar disto, não temos dúvidas que estes desafios serão superados com êxito pelo Enseada”, destacou.
Ricardi contou que, durante o último ano, o Enseada dedicou-se à elaboração de propostas comerciais relacionadas a projetos de construção naval e offshore de valores muito expressivos, as quais seguem em avaliação pelos potenciais clientes, além de ter executado serviços de reparo naval e de operações logístico-portuárias. O terminal de uso privado (TUP) operado pela companhia encerrou 2023 com 2 milhões de toneladas movimentadas, com destaque para o início das operações de graneis vegetais.
A expectativa da Ecovix é que a intenção da Petrobras e da Transpetro se concretize e efetivamente haja demanda para os estaleiros nacionais, inclusive para a construção de cascos e navios completos, não só parte deles. O diretor operacional da Ecovix, Ricardo Ávila, afirmou que o Estaleiro Rio Grande (RS) está pronto para atender a essas demandas. Ele destacou que a estrutura vem sendo utilizada desde 2021 e demandará pequenos ajustes, a depender do tipo de projeto que for demandado.
“A cadeia de suprimentos para projetos desse porte ainda é muito forte no Brasil e poderá atender sem dúvidas. Com relação à mão de obra, entendemos que com o cadastro que temos e com a recente execução de projetos na região, não teremos problemas para mobilizar”, avaliou. Um dos principais desafios, segundo Ávila, é o fluxo de caixa típico desses projetos, que são negativos no início.
“Essa é uma discussão forte no setor. É preciso que haja acesso mais fácil a financiamentos e que o FMM [Fundo da Marinha Mercante], a exemplo do que fez recentemente para os projetos de Sergipe Águas Profundas, da Petrobras, liberando quase R$ 9 bilhões, viabilize linhas de crédito para estaleiros nacionais”, analisou o diretor operacional.
A Ecovix informou que, em 2023, o ERG realizou quatro reparos de embarcações de tipos variados, empregando algo em torno de 700 pessoas. “No momento, estamos com um projeto de desmantelamento (P-32), mas estamos muito aquém de nossa capacidade. Precisamos de projetos que sejam mais adequados ao tamanho da infraestrutura que temos e que, no passado, já empregou mais de 10 mil pessoas”, defendeu Ávila.