O Fundo de Marinha Mercante (FMM) fechou 2019 com R$ 14,4 bilhões de superávit acumulado e tem R$ 32,8 bilhões aplicados em projetos. Rafael Furtado, membro do conselho diretor do fundo (CDFMM), apontou a necessidade de uma demanda perene para que exista maior compatibilidade da receita com os incentivos concedidos ao setor naval por meio de financiamentos. Ele avalia que a receita foi sendo incrementada nos últimos anos sem que os investimentos seguissem a mesma ordem. Para o membro do conselho, é preciso diagnosticar onde a indústria é competitiva e o que precisa ser alterado para ela evoluir e os incentivos ocorreram da maneira mais adequada possível. Em 2019 foram entregues 53 embarcações com recursos do fundo no ano passado, ante 54 em 2018, 54 no ano anterior e 119 em 2016.
Na cabotagem, foram entregues 32 embarcações de cabotagem com financiamento do FMM desde 2007, das quais 26 foram petroleiros da Transpetro e apenas seis não foram destinadas a navios que operam no setor de O&G. “Precisamos entender onde estão as dificuldades e fazer política pública. (…) Até que ponto se justifica ter um fundo para financiar seis embarcações de cabotagem (contêineres e carga geral) ao longo de 10 anos? Precisamos entender onde estão as dificuldades, ter diálogos com ministérios, armadores e indústria naval para evoluir”, comentou.
Furtado observa necessidade de o projeto de lei do programa de incentivo à cabotagem (BR do Mar) chegar ao Congresso com a maior brevidade possível a fim de que as soluções saiam também com maior celeridade. “Se o PL não chegar no Congresso, pouco podemos contribuir”, avaliou Furtado que participou do Webinar “BR do Mar e Indústria Naval – “Desafios para seu Fortalecimento”, promovido pela Frente parlamentar mista de logística e infraestrutura (Frenlogi).
O Plano Decenal da Empresa de Pesquisa Energética (EPE) para o período 2021-2025 trouxe a perspectiva de entrada de 20 novas plataformas no Brasil. Considerando cada plataforma custando US$ 1,3 bilhão, seria possível gerar uma demanda de mais de R$ 32 bilhões se fossem executadas integrações em estaleiros nacionais. “Temos superávit no FMM. Se conseguirmos captar ao menos parte da construção dessas plataformas, já se esgotariam os recursos que temos para o FMM”, estimou Furtado.
Ele acrescentou que essa demanda poderia gerar no curto prazo demanda de 20 petroleiros e 20 a 30 embarcações de apoio marítimo. No caso dos barcos de apoio, possivelmente essa demanda seria absorvida, num primeiro momento, pelas cerca de 60 a 70 embarcações que se encontram sem contratos de operação. Furtado também apontou necessidade de uma atenção especial ao setor agrícola, com análise adequada sobre carga tributária incidente sobre movimentação de fertilizantes importados e na construção de embarcações. O membro do CDFMM disse ainda que existem alternativas de utilização de recursos do FMM relacionadas ao descomissionamento de embarcações e financiamento de embarcações para exportação.
O Sindicato Nacional da Indústria da Construção e Reparação Naval e Offshore (Sinaval) defendeu a revisão da política do setor e que os recursos sejam melhor empregados. “Conversando dentro do governo e da Petrobras nos dizem que a indústria naval tem que ser competitiva. Países asiáticos demoraram 30 anos para serem competitivos, com demanda perene. Não temos como sermos competitivos no Brasil. Como disputar preço com a China?”, questionou o vice-presidente executivo Sinaval, Sérgio Bacci.
De acordo com o Sinaval, somente 15 dos 42 estaleiros nacionais estão funcionando atualmente, alguns deles inclusive estão em recuperação judicial. Somente no Rio de Janeiro, o número de trabalhadores caiu de 30 mil em 2014 para três mil atualmente. Nesse período, o número de empregos na indústria caiu de 82 mil para menos de 15 mil postos diretos de trabalho. Bacci lembrou que, durante 10 anos, foram construídos mais de 250 barcos de apoio (Prorefam) e mais de 20 navios de cabotagem para transporte de petróleo e derivados (Promef), além da construção de navegação interior que continua a barcaças e empurradores.
“A indústria naval não pode mais viver de soluço e do dirigente de plantão do país para saber se as indústrias vão ter incentivos. Precisamos efetivamente de política de Estado industrial para abranger todos os setores da economia do país. Precisamos ter demanda perene, conteúdo local e linhas de financiamento com garantias (fundo garantidor)”, afirmou. Bacci ressaltou que nos Estados Unidos e em países asiáticos os estaleiros só funcionam com a mão do governo em algum grau.