Governo e empresas de navegação acreditam que o projeto de lei 3129/2020 vai gerar novas discussões durante a tramitação do texto do BR do Mar, que ainda não foi encaminhado ao Congresso. A senadora Kátia Abreu (PP-TO), que anteriormente apresentou outros projetos relacionados à cabotagem, apresentou propostas que incluem mudanças no afretamento por tempo e eliminação gradativa do Adicional ao Frete para Renovação da Marinha Mercante (AFRMM). O PL da parlamentar prevê alterações no marco regulatório da navegação (Lei 9432/1997) e na lei de criação da Agência Nacional de Transportes Aquaviários (Antaq).
A Associação Brasileira dos Armadores de Cabotagem (Abac) espera que o BR do Mar venha mais estruturado, já que contou com contribuições por mais de um ano e diálogo com diferentes agentes setoriais. Para o presidente da Abac, Cléber Lucas, o texto do PL passa de forma não muito clara por pontos já discutidos entre agentes e governo dentro do programa do governo federal. A Abac, porém, considera que o projeto da senadora pode ser uma provocação de temas a serem tratados pelo Congresso quando o BR do Mar for apreciado.
A associação enxerga como ponto mais sensível no PL da senadora a proposta de alteração das regras do AFRMM. A Abac entende que, na cabotagem, esse assunto já está pacificado, na medida em que os usuários já não contribuem com esse adicional devido à existência de um mecanismo de não incidência sobre eles. “Mexer em um ponto sem dar tratamento à política como um todo, pode ficar desarranjado e pouco eficaz. Atende alguns setores talvez, mas não é um projeto que se possa dizer equilibrado. E mostra como a cabotagem não é elementar”, comentou Cléber.
O PL 3129/2020 traz propostas para incrementar o afretamento de navios a casco nu e visando afastar entraves para o afretamento a tempo de navios estrangeiros, quando não houver navio nacional para atender a demanda. A Associação dos Usuários dos Portos do Rio de Janeiro (Usuport-RJ) considera que o projeto foi “cirúrgico” e, caso avance e seja efetivado, vai retirar amarras regulatórias na modalidade afretamento por tempo, aumentando a oferta de serviços, desde que as empresas de navegação tenham condições de igualdade para competir. “Esse PL retira amarras colocadas por quem não interessa desenvolvimento da cabotagem”, afirmou o secretário para assuntos de transportes marítimos da associação, Abrahão Salomão, que é sócio-diretor da Posidonia Shipping.
Na última segunda-feira (8), o ministro da Infraestrutura, Tarcísio de Freitas, disse o PL pode agregar ao debate que o governo pretende encaminhar no Congresso. “Quando vemos a senadora Kátia Abreu, que é entusiasta do assunto e tem preocupação com o agronegócio, propondo projeto para tratar de cabotagem, percebemos que já está valendo a pena a provocação que estamos fazendo. Vamos mandar para lá outro projeto e, no final dos contas, haverá um misto do que estamos propondo com que ela está propondo e esse debate dentro da Câmara e do Senado vai resultar na modernização que tanto queremos”, afirmou Freitas, em entrevista à Agência Infra.
Na ocasião, Freitas disse que muitos debates sobre a cabotagem foram necessários para o governo formar convicção de questões mais específicas, algumas consolidadas há décadas. Ele citou discussões sobre para quais segmentos a política de indústria naval foi efetiva e se a proteção da indústria naval não contribuiu para construção de mais embarcações de cabotagem. O ministro ponderou que o programa em si é diferente do projeto de lei BR do Mar. Ele destacou a medida aprovada em 2019 que zerou a alíquota de imposto de importação sobre aquisição de navios de cabotagem no exterior como passo importante para o desenvolvimento desse modal.
Segundo o ministro, foram necessárias discussões sobre o afretamento abordando, por exemplo, se será exigido lastro em bandeira nacional, ou se o navio deve ser afretado por viagem sem suspensão de bandeira, e se o governo deve partir para abertura total do mercado ou por etapas. “Se abríssemos integralmente o setor sem a exigência de lastro em bandeira nacional, não ficaríamos vulneráveis às flutuações do mercado mundial em termos de atração? A partir do momento que determinada rota e determinado preço para determinado produto se mostrasse mais vantajoso, haveria fuga da frota para outros mercados e geraria desabastecimento aqui?”, indagou Freitas.