BR do Mar traz poucas definições sobre aspectos como tonelagem, tipos de cargas e regimes trabalhistas para marítimos em navios afretados a tempo.
Já em análise no Congresso Nacional, o Projeto de Lei (nº 4199/2020), BR do Mar ainda traz algumas indefinições que, segundo especialistas, podem causar insegurança no investidor. Algumas dessas indefinições dizem respeito a informações mais detalhadas sobre tonelagem, tipo de carga, bem como sobre o trabalho de marítimos brasileiros em embarcações de bandeira estrangeira.
De acordo com a engenheira e sócia da Leggio Consultoria, Camila Affonso, alguns pontos devem ser definidos e normatizados posteriormente à aprovação do PL. Um dos aspectos guardados para ser estabelecido por ato do poder executivo é definir a proporção de tonelagem para afretamento por tempo para subsidiária integral estrangeira. Com o projeto será permitido o afretamento, porém, até uma determinada tonelagem. Ele lembrou que ao longo de 2019, o Ministério da Infraestrutura já havia apresentado propostas para estes quantitativos de forma direta, porém isto foi retirado do projeto.
Outro ponto ainda sem definição no projeto se refere ao tipo de carga que será liberada para o afretamento por tempo para cumprimento de contratos de longo prazo. Segundo ela, a proposta é que esta questão também seja definida só posteriormente. “Isso gera indefinição, pois para que as empresas que atuam no setor tomem decisões, como adquirir novos ativos ou realizar contratos de longo prazo, por exemplo, elas precisam saber até quanto poderão afretar por tempo”, frisou. Ela disse que este tipo de indefinição pode acabar gerando uma cautela nas empresas para investir no segmento.
Apesar de alertar para a necessidade de clareza desses aspectos, Camila afirmou que, provavelmente, deixar estas medidas mais específicas para depois tenha sido uma estratégia do governo para não atrasar a aprovação do programa. Isso porque a discussão desses aspectos quantitativos tende a ser complexa e tomar tempo excessivo. Ela disso ainda que outra possibilidade seja fazer uma flexibilização gradual da tonelagem de afretamento por tempo permitida.
O advogado e sócio do escritório Willer Tomaz Advogados Associados, Willer Tomaz, ressaltou que embora não existem detalhes no projeto sobre o tratamento dos marítimos brasileiros, é importante frisar que o Brasil aderiu ano passado à Convenção sobre o Trabalho Marítimo (C186). Na convenção estão previstas, segundo ele, as condições mínimas para o trabalho a bordo dos navios, além de diversos direitos sociais como, por exemplo, à assistência médica, tratamento, provisão dos remédios necessários e de aparelhos terapêuticos, além de hospedagem e alimentação fora de casa, entre outros.
Porém, a própria C186 faz inúmeras remissões às legislações nacionais dos países signatários ou a acordos de negociação coletiva, no que se refere a outros direitos. Isso significa que a convenção não se presta a dirimir todos os conflitos possíveis envolvendo direitos trabalhistas dos marítimos. No entanto, ele acredita que mesmo que ocorra a inserção de dispositivos ampliativos no texto do PL 4199/2020, com o pretexto de clarear e garantir outros direitos não oferecerá melhor solução. “Tenderá, em verdade, a agravar os entraves da legislação brasileira, mantendo o país em posição ruim no plano internacional, frustrando assim os objetivos da proposta”, disse.
Na avaliação de Tomaz, o que deve haver é uma mudança de mentalidade, pois a legislação trabalhista brasileira é “perniciosa”. Ele entende que a despeito de visar proteção do trabalhador, ela acaba por gerar incertezas e inseguranças jurídicas, bem como ônus inibitórios ao desenvolvimento da indústria naval. “Este fator tem sido preponderante na diminuição das frotas de navios estrangeiros na costa brasileira e, ao fim e ao cabo, das oportunidades de trabalho”, criticou.