O leilão de venda dos ativos do Estaleiro Caneco, fundado em 1886 e cuja falência foi decretada 120 anos depois, em outubro de 2006, está confirmado, hoje, em uma sala do Tribunal de Justiça do Rio (TJ-RJ). Mas há dúvidas se o pregão será bem-sucedido com alguma empresa se dispondo a pagar o valor mínimo fixado no edital, de R$ 417,5 milhões. O Caneco está no centro de uma discussão jurídica entre o administrador judicial da massa falida e a Prefeitura do Rio, que, este mês, publicou decreto desapropriando a área do estaleiro, situado no bairro do Caju, na zona portuária do Rio.
Ontem, a massa falida da Indústrias Reunidas Caneco S.A. obteve decisão liminar da 17ª Vara da Justiça Federal, no Rio, suspendendo os efeitos do decreto de desapropriação publicado pelo prefeito Eduardo Paes, no dia 18 de julho. O decreto determinou a desapropriação do Caneco em favor da Companhia de Desenvolvimento Industrial do Estado do Rio de Janeiro (Codin), empresa de capital misto vinculada à Secretaria estadual de Desenvolvimento Econômico. Antes de conhecer a decisão da Justiça Federal, o secretário estadual de Desenvolvimento, Julio Bueno, disse que a Codin teria o papel de ser a gestora da área do Caneco e ser a responsável por vender o terreno para várias empresas.
A avaliação da Secretaria de Desenvolvimento é que seria difícil surgir um comprador para o Caneco depois que os ativos do estaleiro se tornaram objeto de desapropriação pela Prefeitura. A questão é como alguém se interessaria pela área sabendo que poderia ser desapropriado logo em seguida por um valor que ainda não se sabe qual é, mas possivelmente inferior ao estabelecido no leilão. Em 2012, o Estado do Rio também publicou decretos de desapropriação do Caneco, os quais terminaram anulados pela Justiça, que entendeu que o pedido cabia ao município.
Ontem, o juiz Eugenio Rosa de Araujo, da 17ª Vara Federal, determino, sob pena de multa diária de R$ 10 mil, que o município do Rio “se abstenha, de qualquer modo, de prosseguir nos atos decorrentes da declaração de utilidade pública até final do julgamento”. O juiz permitiu o ingresso na ação da União como assistente da massa falida do Caneco. O juiz afirmou que o terreno declarado de utilidade pública para fins de desapropriação é acrescido de marinha e, portanto, viu necessidade de preservar o patrimônio da União.
O juiz disse que a área só poderia ser considerada patrimônio municipal via “desafetação” promovida por lei específica, o que é “improvável” no caso. A decisão considerou a realização do leilão do Caneco hoje. O secretário Julio Bueno, que está em contato com o município, afirmou, depois de saber da liminar, que a Prefeitura vai “brigar” para cassá-la.
A Procuradoria Geral do Município não retornou até o fechamento desta edição. A assessoria do Tribunal Federal Regional (TRF-2) informou que a decisão da primeira instância da Justiça Federal estava válida até o começo da noite de ontem.
O administrador judicial do Caneco, Bruno Galvão Rezende, disse que existem empresas que demonstram interesse “concreto” em adquirir o estaleiro no leilão. Hoje já existem empresas operando na área do antigo Caneco. Uma delas é o Estaleiro Rio Nave, que aluga parte da área do antigo Caneco em contrato válido por dez anos, renovável por mais dez, até 2024. O presidente da Rio Nave, Mauro Campos, disse que a empresa entrou com ação na justiça para fazer valer o direito de renovação do aluguel, o que ainda não foi julgado.
“Temos a posse, mas não a propriedade da área”, disse Campos. Para ele, a desapropriação é uma forma de resolver esse problema. O leilão também encaminharia essa questão, mas o problema é o valor mínimo fixado que é o dobro da primeira avaliação para a desapropriação do terreno, feita em 2012, da ordem de R$ 200 milhões. Campos disse que a Rio Nave tem vários projetos de construção de navios em carteira, entre os quais quatro petroleiros para a Pancoast em contrato de US$ 300 milhões. A Rio Nave planeja investir entre US$ 80 milhões e US$ 100 milhões para aumentar a produtividade.