Para especialistas, o país precisa avançar em regulamentação e resolver questões tributárias para deixar de perder boas oportunidades nessa atividade. Avaliação é que maioria dos estaleiros na Europa não tem porte para desmantelamento de navios de grande porte.
O Brasil reúne estaleiros, prestadores de serviços e profissionais em condições de formar uma cadeia de logística reversa para desmantelamento de embarcações. A avaliação de engenheiros e especialistas no tema é que o país está desperdiçando oportunidades de se tornar um grande player nessa atividade, que possui uma grande demanda no mundo e poucas instalações de grande porte e certificadas para atendê-la. O desafio passa pela regulamentação do tema, equacionar questões tributárias para importação dos cascos e a busca por certificações e cumprimento das exigências das normas internacionais.
“Hoje existe um contingente enorme de navios no mundo paralisados de grande porte que não tem onde fazer e aqui no Brasil não temos nenhum estaleiro ainda aprovado”, disse o coordenador do comitê técnico de descomissionamento e desmantelamento de navios da Sociedade Brasileira de Engenharia Naval (Sobena), Ronald Carreteiro, na última quinta-feira (27), durante o 5º Workshop/Webinar sobre descomissionamento de plataformas e desmantelamento de navios e ativos Offshore.
Carreteiro acredita que falta ao país instituir formalmente qual é a autoridade competente para fazer a coordenação da autorização do plano de desmonte, que envolve diversos atores. A importação de navios, por exemplo, traz dificuldades adicionais em relação à formação de custos competitivos. Ele frisou que o desmantelamento de navios é uma atividade que precisa de volume e demanda frequente para se sustentar. “A regulação é importante, porém deve observar legislação fiscal adequada para atrair embarcações estrangeiras”, acrescentou.
O engenheiro estima que navios e ativos offshore são mais de 90% comercializáveis. Carreteiro salientou que o preço da sucata está vinculado ao preço do minério, que disparou nos últimos meses. Ele lamentou que navios que trafegam na costa brasileira, ao final de seus ciclos, são desmantelados em outros países. De acordo com a Sobena, o Brasil tem aproximadamente 250 navios já paralisados e alguns afundados na Baía de Guanabara que poderiam gerar trabalho para muitos estaleiros.
Carreteiro explicou que, com as convenções atuais, a maioria dos estaleiros na Europa não tem porte para desmantelamento de navios de grande porte. Ele contou que existe expectativa de que a Índia autorize alguns dos seus estaleiros a se adequar às normas de desmantelamento, atingindo a tonelagem necessária para que a Convenção de Hong Kong entre em vigor de forma efetiva. “Já temos mais países aderentes do que o mínimo necessário, mas faltam volumes. Se a Índia passa a ter estaleiros dentro das normas da União Europeia, passamos a ter convenção de Hong Kong valendo para o mundo inteiro”, projetou.
O professor do Centro de Estudos para Sistemas Sustentáveis da Universidade Federal Fluminense (CESS/UFF), Newton Narciso Pereira, observa que o nível de recuperação de materiais de embarcações ao final da operação é da ordem de 95%. “Isso mostra que reciclar navios traz um benefício significativo ao meio ambiente. Quando feito de maneira adequada, temos a capacidade de reinserir esse material na cadeia reversa, dentro do conceito de economia circular”, defendeu.
Pereira identifica uma série de oportunidades para o setor de reciclagem no país e boas perspectivas considerando a visão integrada entre fontes oriundas
do descomissionamento de plataformas e de embarcações mercantes. Ele considera que existem aspectos regulatórios sendo tratados para impulsionar a indústria de reciclagem de navios, como o projeto de lei 1584/2021 e a nota técnica elaborada pela Sobena, que sugere um arcabouço a ser seguido pelas instalações de reciclagem. Para o professor, o estado do Rio de Janeiro é candidato a player principal dessa atividade, com grande potencial para geração de emprego e renda.