Estaleiro Enseada

Maurício Almeida, do Enseada: segmentação para fortalecer negócios

  • 30/08/2022

Estratégia faz parte do plano de negócios da companhia que, desde a aprovação da recuperação judicial em 2021, vem trabalhando para diversificar e revocacionar suas atividades. Complexo também se prepara para poder fabricar itens para projetos eólicos, como torres, fundações e flutuadores.

O complexo do Enseada passará, futuramente, por um processo de troca de controle societário a fim de fortalecer os principais nichos de atuação: industrial, logístico e portuário. A estratégia faz parte do plano de negócios da companhia que, desde a aprovação da recuperação judicial em 2021, vem trabalhando para diversificar e revocacionar suas atividades. O CEO do Enseada, Maurício Bastos Almeida, explicou que vai ser necessário ter uma composição societária nova para cada um desses segmentos. Ele contou que os novos investidores manterão a operação no Enseada e a carteira de clientes.

O complexo também se prepara para poder fabricar componentes eólicos, como torres, fundações e flutuadores, tanto para os parques terrestres, como para os marítimos. A expectativa é que o mercado de eólicas offshore esteja aquecido a partir de 2026 ou 2027. Almeida ressaltou que o Enseada mantém o olhar para integração e fabricação de módulos de projetos offshore. “O Enseada vive uma fase interessante. Continuamos apresentando nossas propostas para mercado de óleo e gás — módulos principalmente”, contou Almeida, durante a 16ª Navalshore, em entrevista exclusiva à Portos e Navios.

Confira a entrevista com o CEO do Enseada.

CEO do Estaleiro Enseada, Maurício Bastos Almeida

PN: Quais os planos da plataforma do Enseada? O que estão conseguindo prospectar de novos negócios e segmentos de atividades?

Mauricio Almeida (foto): O Enseada vive uma nova fase depois da aprovação do plano de recuperação judicial que aconteceu no ano passado. Isso destravou algumas agendas comerciais e o Enseada passou a ser complexo naval, industrial e logístico. Hoje, além dos mercados de naval e industrial, temos um porto (terminal de uso privado — TUP) homologado por 25 anos todo licenciado, temos uma área alfandegada pela Receita Federal de 750.000 m² onde hoje exportamos através do Enseada minério de ferro, recebemos equipamentos de carga geral. Recentemente, recebemos o primeiro parque eólico completo que chegará por navio em 5 embarques. Criamos uma nova rota logística para recebimento de parques eólicos para Bahia — hoje o estado brasileiro com maior produção de energia eólica onshore.

Acreditamos que esse é o futuro: energia eólica não só na parte logística do Enseada, como também no hub de fabricação de torres metálicas, fundações, flutuadores do offshore, que acreditamos que comece lá para 2026 e 2027. E as empresas precisam estar preparadas para, quando o mercado acontecer e for regulamentado, já estarem aptas a performar, evitando que projetos saiam do Brasil. E que possamos ter empresas e mão de obra qualificadas e produtividade no país para atender a esses projetos.

O Enseada vive uma fase interessante. Continuamos apresentando nossas propostas para mercado de óleo e gás — módulos principalmente e acreditamos que, em breve, teremos novidades.

PN: Após anos de estagnação do mercado, o setor vive outro momento, mesmo sem projetos de plataformas? Com estruturas metálicas e eólicas offshore já se tem algum horizonte para frente?
MA:
 O mercado de FPSO está bem consolidado. Está cada vez mais claro para a indústria nacional a divisão de escopo de como ficará a parte da construção naval fora [plataformas] e módulos offshore aqui no Brasil. A pandemia trouxe certa instabilidade quando se tem uma distância tão grande para deixar tão longe assim projetos necessários para produção de óleo nacional e para a economia. Ficou mais evidente que a participação da indústria nacional também é importante, razão pela qual a quantidade de módulos tem crescido no Brasil. Esse é um mercado que deverá ser bem contínuo e as regras estão bem estabelecidas.

Eólicas offshore são uma tendência natural. Grandes estaleiros que conhecem como trabalhar estruturas metálicas para converterem também para fabricação de torres eólicas, flutuadores e fundações para atender mercado de eólicas offshore, que é mercado grande energia cara, principalmente capex [investimentos]. São projetos de muito capital para ser investido antes de começar a gerar benefício.

Existem indústrias que demandam muita energia e se realmente a indústria do hidrogênio verde no Brasil vier com a pujança que imaginamos que possa acontecer, o país carece de energia para atender a essa indústria. Talvez a energia eólica offshore possa abastecer projetos de hidrogênio e de amônia verde que terão destino, não só para o mercado nacional (amônia para fertilizantes e agronegócio), como para exportação para Europa que vive uma crise energética gigantesca.

PN: Isso daria a escala que o estaleiro do porte do Enseada precisa?
MA:
 O que percebemos, na crise que enfrentamos desde 2016, é que o Enseada, enquanto estaleiro, não tem mais o volume de projetos para o qual ele foi projetado. Por isso diversificamos, deixando de ser um estaleiro e passamos a ser um complexo de negócios: um porto, um estaleiro e uma fábrica futuramente de torres (de energia renovável). A composição desses negócios todos pode promover ao Enseada uma revocação que fará muito bem para a sociedade e para o entorno da região.

PN: Estaleiros brasileiros de grande porte passaram por recuperação judicial e já começam a prospectar novos negócios. No caso do Enseada, como está esse processo? Quais são os próximos passos?
MA:
 O Enseada aprovou um plano muito estável e justo para a companhia e credores. A companhia vive um momento diferente, bom de conquista de contratos, em fase inicial — não na pujança e volume dos contratos anteriores. O Enseada passará por um processo futuramente de troca de controle para novos investidores mantendo operação no Enseada e carteira de clientes, mas com diferentes controladores. Para o novo complexo do Enseada, vai ser necessário ter uma composição societária para cada nicho de atuação. O porto com a composição societária diferente do estaleiro, estaleiro com composição societária diferente da fábrica de renováveis.

A tendência é de haver reorganização societária com novos investidores (segmentando atividades). Dentro do plano de negócios do Enseada, viram empresas: porto, estaleiro e fábrica renovável. A tendência é ter composição societária diferente uma das outras. Aquilo que é uma empresa, virando um cluster.

PN: Quanto à construção de embarcações, ela fica suspensa pelas regras de afretamento trazidas pelo BR do mar (Lei 14.301/2022) e pelas atuais condições e competitividade para construir no Brasil?
MA:
 Por enquanto, não projetamos no nosso plano de negócios a construção de nenhuma embarcação. Não temos hoje um horizonte de projetos e nenhuma empresa que faça sentido ou que contabilizemos um backlog projetado de embarcações para o estaleiro. Somos pragmáticos em relação a isso. Se acontecer um plano de incentivo às construções navais novamente, vamos contemplar isso. Mas, hoje, para construção naval não consideramos que a sobrevivência e perpetuidade da empresa passe por esse vetor de crescimento.

PN: Tem alguma oportunidade relacionada à conversão e/ou upgrade de navios? Para embarcações de suporte a eólicas offshore, por exemplo, pode vir a existir algum tipo de demanda neste sentido?
MA:
 Isso sim. Ainda precisa ser claro quais seriam as regras de utilização das embarcações para instalação de parques eólicos offshore, se terá algum conteúdo local ou não. O fato é que a indústria naval nacional já atingiu níveis de maturidade e produtividade altos. O que nos retira competitividade são gargalos de infraestrutura, gargalos tributários e de custo de capital que não são intrínsecos das nossas empresas, e sim do ambiente onde estamos inseridos.

Para passarmos de indústria produtiva que já somos para indústria mais competitiva, não só estaleiros precisam fazer lição de casa, mas o país precisa voltar a ter política industrial orientada para esse segmento. Precisamos voltar a discutir política industrial com recursos financeiros com garantias e seguros para que estaleiros não fiquem expostos a clientes e a projetos que possam significar novas recuperações judiciais. Então, [para isso] precisa haver uma reformulação de política industrial para o setor.

PN: É momento de requalificar a mão de obra e a cadeia de fornecedores, considerando o tempo que a indústria ficou sem atividades mais consistentes?
MA:
 Não só pelo tempo que a indústria ficou em crise, mas a pandemia deixou as pessoas em casa e elas experimentaram uma realidade diferente do que era realidade de trabalhar na produção, em estaleiro e em obras. Muitos jovens que saíram da faculdade, nunca participaram de projetos dessa magnitude.

O setor de prestação de serviço brasileiro (engenharia industrial e construção naval) precisa qualificar mão de obra e atrair jovens engenheiros para projetos que vamos performar. É um desafio de todos, qualquer industrial hoje atrair jovens a vir exercer profissão de engenharia e vir trabalhar num projeto de construção naval e industrial. Precisamos ter um programa sério de incentivo à educação, orientado para projetos de engenharia.

PN: Descomissionamento também está no radar de vocês?
MA:
 Descomissionamento está no nosso radar. Não temos no nosso plano de negócios neste momento. Temos sido demandados pelos nossos clientes para estudar e oferecer nossos serviços. Mas também não é um vetor de crescimento que colocamos no curto prazo. Continuamos com o porto, ampliando instalações portuárias não só para granéis minerais, como para granéis vegetais futuramente.

O porto vai atender cargas eólicas. Na parte industrial, módulos de FPSO, integração de FPSOs eventualmente e reparos navais. Na parte de indústria pesada, fabricação de estruturas metálicas para eólicas offshore onshore, fundações e jaquetas.

PN: Será necessário obter uma licença específica para descomissionamento?
MA:
 Não demos entrada em nenhuma licença para descomissionamento. Para atuarmos nesse mercado, há um pequeno investimento que precisaríamos fazer para readequar nossas instalações para atender a Convenção de Hong Kong. Já tivemos algumas conversas com certificadoras, vimos que investimento não é muito demorado, nem muito custoso. Mas não vamos fazer investimento esperando o mercado acontecer. Já fizemos investimento de US$ 1 bilhão para um mercado que não aconteceu da maneira que imaginávamos. Estamos mais com os pés no chão, olhando para clientes que precisam de nós nesse momento e revocacionando nossas instalações para esse mercado

O Enseada estabeleceu uma parceria estratégica com a Tenenge, fabricante tradicional de montagem e engenharia industrial do grupo OEC. Hoje, o Enseada e a Tenenge juntos vão atender os mercados de O&G, de módulos offshore e de módulos onshore. Enseada e a Tenenge vão atender plantas petroquímicas ou qualquer instalação industrial onshore que demande um projeto modularizado. A Tenenge tem milhares de trabalhadores no Brasil e exterior e vai agregar com o fortalecimento da nossa mão de obra técnica especializada.

PN: Será bom para participar de novas concorrências?
MA:
 Estamos dando visibilidade para essa parceria. Esperamos atender nossos clientes de forma profissional e com mão de obra qualificada.

Fonte: Portos e Navios – Danilo Oliveira
30/08/2022|Seção: Notícias da Semana|Tags: , |