Seja com parcerias ou vendas diretas, países com grande tradição no mercado naval se articulam para ampliar fatia no mercado comprador brasileiro
As exigências de conteúdo nacional para o desenvolvimento da produção de óleo e gás no Brasil não desanimam os fornecedores estrangeiros de equipamentos e serviços. Afinal, o Plano Estratégico da Petrobras prevê investimentos de US$ 220,6 bilhões dos quais US$ 153,9 bilhões em Exploração & Produção até 2030. Ou seja, o bolo é grande e dá para todos. Embora fosse mais fácil e rentável exportar, eles entendem que as regras de fabricação no Brasil vieram para ficar e buscam se adaptar às exigências nacionais e se posicionar da melhor forma junto aos potenciais clientes, especialmente, ao maior deles, a Petrobras.
Em workshop promovido pela Associação Brasileira da Indústria Naval e Offshore (Abenav) durante a Marintec, os representantes do Reino Unido, Noruega e Japão apresentaram suas visões da situação atual e perspectivas de novos negócios.
Em sua apresentação “A Experiência Marítima da Noruega”, a cônsul geral de comércio exterior, HelleMoen, ressaltou a importância das relações comerciais com o Brasil no segmento naval e de óleo e gás. Segundo ela, o Brasil é o segundo maior mercado offshore do mundo, enquanto a Noruega é o primeiro. O Brasil é o terceiro maior mercado para fornecedores noruegueses e segue em crescimento. Em 2012 as vendas chegaram a cerca de US$ 4,36 bilhões (27 billion NOK). Nos últimos anos as empresas norueguesas investiram mais de US$ 24 bilhões no Brasil e atualmente existem mais de 100 delas em operação em território nacional, sendo que 25% da frota de apoio offshore são controladas por empresas daquele país.
Para demonstrar a importância que o mercado de óleo e gás brasileiro tem para a Noruega, HelleMoen explicou que quase 90% das navipeças fabricadas na Noruega são para exportação sendo que em 2012 cerca de US$ 5,5 bilhões (34 bi NOK) foram exportadas diretamente para empresas no exterior, US$ 178 milhões (1,1 bi NOK) exportadas indiretamente via estaleiros e outras empresas, e cerca de US$ 1,68 bilhão (10,4 bi NOK) via serviços fornecidos no exterior.
Ela ressaltou que um dos trunfos dos noruegueses é o forte domínio de alta tecnologia tanto nos estaleiros quanto na fabricação de equipamentos, além da posição de liderança em P&D e força comercial em serviços financeiros e estrutura e política estáveis. A Noruega se aproximou ainda mais do Brasil no início da retomada da construção naval brasileira e com isso suas empresas hoje estão entre as principais parceiras do Brasil no segmento naval e de óleo e gás. A intenção é ampliar ainda mais os negócios.
Já o especialista da agência de fomento britânica UK Trade & Investment, Chris Wall, explicou que o Reino Unido está empenhado em estreitar relações comerciais com o Brasil e considera o setor naval um mercado muito promissor. Aproveitando a realização da Feira, a UKTI promoveu uma missão comercial com a participação de oito empresas que visitaram estaleiros e epecistas. O feedback, segundo ele, foi bastante positivo e algumas delas estudam firmar parcerias com fabricantes nacionais, enquanto outras entendem que a demanda não justifica a produção no Brasil mas esperam atuar no fornecimento de assistência técnica e sobressalentes.
Em sua apresentação “Mecanismos utilizados para o Desenvolvimento da Indústria Local: Oportunidades do Passado, o Desafio do Presente e a Visão do Futuro”, Chris Wall ressalta que no Brasil o setor naval está crescendo há alguns anos, enquanto que o pico da produção no Reino Unido aconteceu na década de 1920 e está em queda há algumas décadas. “O atual perfil dos fabricantes britânicos é exportador e temos um banco de fomento que tem condições de facilitar os negócios”, garantiu.
Entre os pontos fortes dos fabricantes britânicos, ele citou a alta qualidade dos produtos, serviços e equipamentos marítimos, a integração de sistemas, propulsão, eletrônicos de navegação, tratamento de água/instrumentação, HVAC e equipamentos para recolhimento de óleo, entre outros.
O gerente geral do UKTI no Rio de Janeiro, Matt Woods, é ainda mais enfático ao dizer que os segmento naval e de óleo e gás são foco absoluto da entidade no Brasil. “Buscamos entender quais as necessidades do mercado brasileiro, quais os gargalos, etc, para facilitar que as empresas britânicas possam fazer negócios aqui. Brasil e Reino Unido foram parceiros fortes e pretendemos retomar isso. Tanto que fechamos US$ 1,5 bilhão em novos contratos nos dois últimos anos. Desde 2009 o comércio exterior entre os dois países cresceu 69% e a meta é dobrar os negócios, alcançando US$ 4 bilhões/ano até 2020”.
Chegando um pouco mais tarde que os demais, nem por isso os japoneses têm planos menos ambiciosos de estreitar laços comerciais com mercados tão aquecidos. Em sua apresentação cujo tema foi “A Participação da indústria japonesa nos estaleiros brasileiros: Desafios, Perspectivas e Tecnologia”, o ministro dos Transportes e Infraestrutura do Japão, Schinichiro Otsubo, traçou um retrospecto da trajetória da indústria naval japonesa desde que intensificou a construção em larga escala de navios padronizados ainda na década de 1940, passando pela etapa de crescimento do tamanho das embarcações até o período em que a crise do petróleo levou à queda no volume de encomendas. Com o avanço da produção naval na Coreia e já na virada do século XXI com o crescimento absurdo da construção naval chinesa, o Japão optou se posicionar em nichos e voltou a crescer com a fabricação de conteineiros, navios ro-ro e graneleiros.
Atualmente, a tendência é de construir navios gaseiros e navios com baixo consumo de combustíveis e alta eficiência energética, os chamados eco-friendly. No alvo da indústria japonesa também está o mercado offshore, com a construção de FLNG, LNG Shuttle Tanker, barcos de apoio, FPSO, LNG Tankers e plataformas logísticas (MegaFloat). Outro mercado em foco é o de energia eólica, com a construção e manutenção de turbinas e usinas.
Otsubo explicou que a indústria japonesa se antecipou ao boom deste mercado de eficiência energética, se esforçou e foi bem-sucedida no desenvolvimento de novas tecnologias voltadas para economia de energia e redução do consumo de combustíveis. “Com o aumento da rigidez nas regulamentações sobre emissões de CO² e o contínuo aumento dos preços de combustíveis, a tendência é que a demanda por eco-ships não pare de crescer. E novas regras se tornarão mandatórias em fases até 2025”, afirma ele, lembrando que o Japão hoje dispõe de uma ampla gama destes equipamentos eco-friendly.
Segundo o ministro, entre os principais desafios a serem enfrentados pelo Japão, estão a estagnação dos preços dos navios nos últimos anos e as taxas de câmbio desfavoráveis (o yen tem se enfraquecido frente ao dólar desde o ano passado). Sendo que nesse caso o problema acaba se apresentando como uma boa oportunidade para a compra de equipamentos de eficiência energética e eco-ships de alta qualidade.
Consciente de que está atrás dos demais concorrentes, o governo japonês busca o que fazer para retomar posição de destaque no mercado internacional de indústria naval. Analisando os pontos fortes do Japão, Otsubo ressaltou a credibilidade na qualidade e performance da indústria nipônica, o know-howacumulado, alto nível do gerenciamento da produção e clusters marítimos fortes e com players de peso (não só de construção mas também armadores e fornecedores de equipamentos). Entre os pontos fracos ele cita o número insuficiente de engenheiros, a produção descentralizada (o que limita a economia de escala) e o fato de estar chegando atrasado no estabelecimento de alianças com outros países. Outro ponto lembrado é a característica nipônica de cautela para assumir riscos nos negócios.
Já no que diz respeito aos fatores externos positivos ele lembra a expansão nos mercados offshore e de óleo e gás e o fato de ter instituições financeiras fortes e em busca de novos alvos de investimento. Quanto aos fatores externos tidos como ameaças, Otsubo lembrou que o enfraquecimento do poder econômico do Japão e a não-existência de campos de óleo e gás por perto, o que dificulta o treinamento e outras oportunidades de experimentação.
Em sua apresentação, Otsubo reconheceu que o Brasil pode ser a única porta de entrada do Japão no mercado offshore. Para ele, entre as necessidades do Brasil está o estabelecimento de indústria marítima local para ter condições de lidar com a forte e crescente demanda para exploração de campos de óleo e gás. Entre os pontos fortes ele enfatizou a riqueza de recursos naturais e humanos e a tecnologia state-of-the-art no setor offshore, especialmente no subsea.
Por outro lado, o Japão tem como vantagens uma variedade de companhias líderes e que podem oferecer“soluções completas”, inclusive de logística, grande experiência com investimentos externos e cooperação, incluindo a valorização de mão de obra local, além de opções financeiras competitivas. Como desvantagem está justamente o fato de estar chegando atrasada e ter que se empenhar ainda mais para recuperar o tempo perdido. A julgar pela disposição e rapidez com que eles estão se envolvendo com os estaleiros e obras no Brasil, essa desvantagem não se prolongará por muito tempo.
Fonte: Portos e Navios