Sérgio Bacci diz que processos de compensação permitem que disputa com estaleiros internacionais seja equânime
A retomada na produção de embarcações próprias da Petrobras está em curso com a licitação pública internacional aberta pela Transpetro para a aquisição de quatro navios de 15 a 18 mil toneladas de porte bruto. Parece pouco, mas o presidente da Transpetro, Sérgio Bacci, afirma que é uma forma cautelosa – à luz da fracassada experiência anterior – de gerar oportunidades para a indústria naval brasileira.
Quais são as regras da licitação?
É exclusivamente para atender à demanda da Petrobras. Somos a empresa contratada de logística para fazer o transporte da companhia. Vamos abrir as propostas na primeira semana de novembro. E já temos a perspectiva de, em dezembro, abrir outro edital para navios. A perspectiva é abrir uma nova a cada seis meses. Assim que se completa um processo, abre-se um novo. No total, queremos colocar 25 navios em licitação, sempre por lotes. Fazer tudo de uma vez poderia causar confusão.
Há regra de conteúdo nacional?
Nessa licitação, não tem. A regra de conteúdo local da Petrobras é válida para poço, não para as embarcações. A intenção é permitir que haja competitividade entre estaleiros estrangeiros e brasileiros. O que há é uma regra de equalização de preços.
Como funciona?
O governo publicou uma medida provisória de depreciação acelerada para essas embarcações. Também há o Fundo de Marinha Mercante, que só financia estaleiros nacionais. E nas regras da licitação, são considerados os impostos pagos quando é preciso importar navios. Tudo isso será levado em consideração na hora de avaliar preços nacionais e internacionais. Como podem participar tanto estaleiros brasileiros quanto estrangeiros, foi pensado esse processo de compensação para que a disputa pudesse ser equânime.
É viável que um estaleiro nacional seja bem-sucedido?
Fizemos as regras para que estaleiros nacionais tenham a mesma competitividade dos estrangeiros. Estou esperançoso de que um estaleiro nacional possa ganhar essa licitação. Claro, meu papel nesse caso é mais de torcida, porque as regras devem permitir a participação de todos.
Haverá apenas um vencedor?
Sim, quem ganhar esta licitação vai construir os quatro navios. E não poderá participar das próximas. A intenção de que que um estaleiro diferente ganhe cada uma das licitações, para evitar atrasos na entrega (um dos obstáculos na tentativa anterior de incentivar a indústria naval nacional). Se um estaleiro acumula pedidos, tem problemas para cumprir o cronograma. Há uma vedação para que vitoriosos em etapas anteriores disputem as seguintes.
Quantas rodadas estão previstas?
Quatro licitações já estão no cronograma, fora as destinadas a construção de barcos de apoio. Se queremos indústria naval forte no país, precisamos de demanda perene. O sistema Petrobras está começando a dar esse passo. Isso permite que outras empresas também comecem a contratar no Brasil, de qualquer lugar no mundo. Por que a China e a Coreia do Sul são potências navais? Porque têm essa demanda perene. E não são fruto só de preço mais competitivo.
O que mais ajuda?
Na China, a grande maioria dos contratantes são estaleiros estatais, não de privados. É o governo que encomenda navio para que a indústria que é grande geradora de empregos permaneça lá. Na Coreia do Sul, se diz que é só o mercado, não tem intervenção do Estado. Fui lá para entender e ouvi do vice-presidente da Hyundai que os estaleiros lá estão dando prejuízo há 10 anos. Como o grupo faz carros, equipamentos e navios, há um acordo que o Estado ajuda com incentivos os negócios que têm melhor rentabilidade. A contrapartida é não fechar o estaleiro. Então, existe um subsídio cruzado para manter os empregos nos estaleiros. Há um mito de que não pode haver intervenção do estado em estaleiros. Nos EUA, o apoio à indústria naval, previsto no Jones Act, é a obrigatoriedade de que os navios de cabotagem (navegação na costa do país) sejam construídos em estaleiros americanos.
Essas licitações podem ter efeito semelhante?
Esse primeiro edital é para embarcações relativamente pequenas, de até 15 mil toneladas. Depois, vamos ter gaseiros e navios de até 25 mil toneladas. A escala é de navios de pequeno a médio porte, não vamos fazer dos grandes.
Por quê?
Não é por não ter condições. O Brasil tem condições de fazer um Suexmax. Em Rio Grande tem espaço físico e condições técnicas. Mas optamos por um processo de ir aos poucos, para não correr o risco de dar passos largos e tomar um tombo. Preferimos dar pequenos passos, mas constantes e sem tombo. Quem sabe, lá na frente, possamos construir grandes navios.
Também não há previsão de FPSOs (navios-plataforma usados na produção de petróleo que chegaram a ser montados em Rio Grande)?
Estamos operando sob demanda da Petrobras. Há boa vontade da presidente Magda (Chambriard) de ajudar na retomada da indústria naval. Já está encomendando navios de apoio offshore e falando em fazer retrofit (reforma) de algumas plataformas.