Com a perspectiva de aumento expressivo da oferta de gás natural no país, principalmente na camada pré-sal, nos próximos anos, as comercializadoras de energia elétrica estão investindo em um novo ramo: a gestão do consumo de gás e, futuramente, as operações de compra e venda do energético. De acordo com o Plano Decenal de Expansão de Energia (PDE) 2023, a produção de gás natural brasileira deverá crescer dos atuais 62,2 milhões de metros cúbicos diários para 134,31 milhões de metros cúbicos diários em dez anos.
O estudo, feito pela Empresa de Pesquisa Energética (EPE), também indica que a demanda pelo energético no Brasil crescerá de 82,5 milhões de metros cúbicos diários para 127,7 milhões de metros cúbicos diários, no mesmo período. Considerando apenas o segmento industrial – principal nicho de mercado para as comercializadoras – a demanda saltará de 32,2 milhões de metros cúbicos diários para 54,3 milhões de metros cúbicos diários, até 2023.
De olho nesses números, a Comerc, tradicional comercializadora de energia do país, criou este mês uma joint-venture com a consultoria Gas Energy para prestar serviços na área de gás natural. Chamada de Comerc Gás (na qual a Comerc tem 60% e a Gas Energy, 40%), a empresa já negocia contratos para realizar a gestão do consumo de gás de três potenciais grandes clientes.
A nova empresa prevê um crescimento de 40% para o mercado industrial de gás natural nos próximos cinco anos, com a comercialização de mais de 40 milhões de metros cúbicos por dia. A Comerc Gas prevê começar a atuar no mercado livre de compra e venda de gás natural a partir de 2017, quando estiver disponível uma grande oferta do energético proveniente da camada pré-sal.
“Mais de 90% do gás do pré-sal é associado ao petróleo. Esse gás contínuo não servirá para térmicas. Ele terá de ser disponibilizado para o mercado firme”, disse Pedro Franklin, diretor da Comerc Gas. O executivo está na Comerc desde abril, quando começaram os estudos para a abertura da empresa. Antes, Franklin era responsável pela contratação de gás natural e energia do grupo Votorantim.
Segundo Franklin outra oportunidade de negócios é a tendência de queda do preço do gás natural no mercado internacional, devido à previsão de aumento da oferta do gás não convencional americano e, futuramente, australiano. A redução do preço do energético no mercado global vai desestimular uma eventual exportação do produto pelo Brasil, assegurando, assim, um volume maior de gás no mercado interno.
Outra comercializadora que também passou a investir no setor de gás natural é a Ecom Energia. A companhia, que criou uma área de negócios para esse mercado, com a contratação de um ex-técnico da Petrobras, já faz a gestão de contratos de consumo de gás de seis indústrias, que somam R$ 300 milhões por ano. Dessas empresas, quatro estão situadas no Sudeste e duas no Sul.
Márcio Sant’Anna, sócio diretor da Ecom Energia, faz um paralelo do mercado livre de energia com o de gás natural Segundo ele, no início dos anos 2000, o mercado livre de energia também era incipiente. “No médio e longo prazo, [o mercado livre de gás natural] vai acontecer”, disse.
Ao contrário do setor elétrico, porém, o mercado de gás natural ainda é muito concentrado nas mãos da Petrobras, que detém o monopólio de fato da venda do energético. Para o presidente executivo da Associação Brasileira dos Comercializadores de Energia (Abraceel), Reginaldo Medeiros, falta vontade política do Ministério de Minas e Energia para reduzir a participação da estatal e estimular o mercado de gás.
Para Walfrido Ávila, presidente da Tradener, a primeira comercializadora de energia do país, apesar da aprovação da Lei do Gás (11.909/2010), o mercado de gás ainda tem muita burocracia e gera insegurança para o investidor.