A Petrobras recebeu dos estaleiros, no ano passado, nove plataformas de produção de petróleo. A capacidade instalada destas unidades totaliza 1 milhão de barris por dia – quase 50% do que a empresa produziu em novembro passado, que foi de 1,9 milhão de barris/dia. Ainda que capacidade instalada e produção efetiva sejam diferentes, e que uma parte dessa produção será dos sócios, há uma expressiva ajuda a caminho na oferta interna de óleo bruto.
De acordo com a Petrobras, a sua produção de petróleo, em 2017, vai alcançar 2,7 milhões de barris/dia, por conta da chegada das novas plataformas. Depois, a meta da companhia é chegar a 2020 com produção diária de 4,2 milhões de barris.
A principal notícia envolvendo as plataformas, contudo, não foi esse aumento da oferta futura, mas seu impacto nas exportações brasileiras. Dessas nove, uma veio da China e oito foram produzidas no Brasil, das quais sete foram registradas como exportação ainda em 2013, em um procedimento contábil que segue orientações internacionais.
Exportadas, unidades não podem virar investimento no PIB
Em nota, o Ministério do Desenvolvimento (Mdic) explicou que “nessas operações, há troca de titularidade do bem entre uma empresa nacional (o estaleiro fabricante) e uma sediada no exterior (a empresa adquirente), com a consequente entrada de divisas no Brasil para pagamento da transação em moeda estrangeira. São, portanto, operações de exportação. Após a exportação, o equipamento é alugado por uma empresa petrolífera nacional, sob a forma de leasing ou afretamento, e as remessas ao exterior para o pagamento deste aluguel são contabilizadas na Conta de Serviços do Balanço de Pagamentos.”
Além dessa explicação, o Mdic também ponderou que “a apuração estatística da referida operação na exportação brasileira está em concordância com as recomendações do BPM6 (Balance of Payments Manual do Fundo Monetário Internacional) e do Sistema de Contas Nacionais das Nações Unidas, de metodologia e produção estatística de comércio exterior, do qual o Brasil é signatário.”
No registro contábil, a exportação das plataformas produzidas no Brasil representou uma receita de US$ 7,7 bilhões. Agregadas ao total das vendas externas do país, elas ajudaram a reduzir o frágil comportamento das exportações brasileiras no ano passado, que caíram 1% em 2013 na comparação com 2012. Sem as plataformas, cairiam 2,8%.
Para alguns, o registro das plataformas como exportação seria mais um exemplo da atual “contabilidade criativa” do governo brasileiro para mascarar o mau momento da economia. Bobagem, pois desde 2004 esse é o procedimento. Naquele ano, por exemplo, a exportação de uma plataforma somou US$ 461 milhões, valor pequeno para um superávit de US$ 30,3 bilhões.
Além disso, esse modelo foi criado para que a produção local pudesse usufruir de benefícios fiscais presentes na exportação. Ou seja, o beneficiário da contabilidade é também o setor privado nacional (pelo menos é isso que se imagina). A questão vai além de discutir se o governo está fazendo contabilidade criativa no comércio exterior ou não. Afinal, o governo “perde” outro lado nessa história. Ao seguir essa regra de registro, as plataformas deixam de ser o que efetivamente são: investimento produtivo. Ao serem consideradas uma exportação, elas não podem integrar o aumento da formação bruta de capital fixo (nome oficial do investimento nas contas nacionais) dentro da conta do Produto Interno Bruto (PIB) brasileiro. Afinal, elas “saíram” do país.
O economista-chefe da LCA Consultores, Bráulio Borges, tem chamado atenção para essa situação. Nos seus cálculos, o crescimento do investimento dentro do PIB – estimado por ele em 6,5% em 2013 – seria de 8,5% com a incorporação das plataformas. E mais unidades virão em 2014, 2015, 2016, 2017 e podem continuar fora da conta do investimento no PIB.
Procurada, a Petrobras não informou quantas plataformas estão hoje em construção no Brasil, ou no mundo, contratadas pela estatal. Mas aqui e ali, entrevistas já publicadas indicam que mais 11 plataformas serão licitadas em 2014, pelo menos outras 4 estão em produção e a exploração do campo de Libra exigirá entre 12 e 15 unidades. Quando chegar 2017, se a Petrobras alcançar a produção diária de 2,7 milhões de barris/dia, já terá um excedente bom para a exportação e também terá reduzido a importação de derivados. Na média dos últimos dois anos, por exemplo, o déficit nesse segmento ficou em torno de US$ 8 bilhões, bem pior do que a estabilidade de 2010 (modesto saldo positivo de US$ 265 milhões em 2010).
O estranho é que a produção que vai reverter essa situação em 2017 virá de um ativo fixo que não está sendo registrado na conta da formação bruta de capital fixo do país. Virá de um ativo fixo registrado nas estatísticas de exportação, como se estivesse gerando riquezas em outras águas, que não as brasileiras. Elas vão voltar como aluguel, mas equipamento alugado não é ampliação fixa de capacidade produtiva.
Investimento puxa investimento, e é disso que o Brasil mais precisa. Se as plataformas fossem registradas como formação bruta de capital fixo, o país alcançaria mais facilmente taxa de investimento superior a 20% do PIB.
Do ponto de vista da balança comercial, a questão não é se as plataformas nos salvaram de um déficit comercial de US$ 5 bilhões, mas por que as importações continuaram crescendo acima da produção nacional e em um ritmo superior ao das exportações. Sem falar que as próprias plataformas são compostas por importações. A plataforma P-61, que seguiu para o campo de Papa Terra no início de dezembro, teve a construção do casco e integração realizados no Estaleiro BrasFels em Angra dos Reis, e a construção do topo foi feita em Cingapura.
Fonte: Valor Econômico/Denise Neumann