Com a queda dos preços do petróleo, as grandes petrolíferas enfrentam um desafio que no passado seria uma heresia: a necessidade de encolher.
Mesmo antes de os preços da commodity nos Estados Unidos começarem a recuar para perto de US$ 80 por barril, em meados do ano, as três maiores companhias de petróleo do mundo ocidental já registravam margens de lucro menores que dez anos atrás, quando vendiam petróleo e gás natural pela metade do preço atual, segundo análise do The Wall Street Journal.
Apesar de terem lucrado juntas US$ 18,9 bilhões no terceiro trimestre, Exxon Mobil Corp., Royal Dutch Shell PLC e Chevron Corp. estão agora engavetando planos de expansão e vendendo operações com margens mais baixas.
A razão para a mudança está no custo crescente de extrair petróleo e gás. Exxon, Chevron e Shell, assim como a BP PLC, têm lucros menores hoje do que tinham há dez anos. Combinadas, as quatro petrolíferas registraram, na média, uma margem de lucro de 26% sobre suas vendas de óleo e gás nos últimos 12 meses, comparado com 35% há dez anos, de acordo com a análise.
A anglo-holandesa Shell informou, na semana passada, que sua produção de petróleo e gás caiu ante dez anos atrás e alertou para novas quedas nos próximos dois anos. A produção da americana Exxon recuou para seu menor nível em cinco anos, depois que ela se desvencilhou de campos menos lucrativos no Oriente Médio. A Chevron, que também é sediada nos EUA e cuja produção ficou estável em 2013, está adiando grandes investimentos devido a preocupações com custos.
Já a britânica BP PLC fez um corte mais agressivo, tendo vendido US$ 40 bilhões em ativos desde 2010, principalmente para pagar despesas jurídicas e de limpeza ligadas ao vazamento de petróleo no Golfo do México.
É verdade que a meta de longo prazo das empresas é produzir mais. Na semana passada, Exxon e Chevron reafirmaram planos para elevar a produção até 2017.
“Se voltarmos dez anos no tempo, a ideia de cortar gastos porque o petróleo estava em US$ 80 [o barril] deixaria todo mundo espantado”, diz Dan Pickering, um dos presidentes do banco de investimento Tudor, Pickering, Holt & Co. “A lucratividade inerente ao setor diminuiu.”
Não são só as grandes que estão se retraindo. No mundo todo, petrolíferas cancelaram ou adiaram mais de US$ 200 bilhões em projetos desde o início de 2013, segundo estimativa da firma de pesquisa Sanford C. Bernstein.
No passado, a prioridade das grandes petrolíferas era descobrir e explorar novas reservas de petróleo e gás o mais rápido possível, tanto para substituir reservas esgotadas como para mostrar a investidores que as empresas ainda podiam crescer.
Mas o tamanho das empresas significava que apenas projetos imensos, complexos e caros poderiam ter algum impacto sobre suas reservas e receitas.
Como resultado, Exxon, Shell e Chevron exploraram desde grandes formações de areias betuminosas no Canadá até as estepes frias da Ásia Central, perfurando poços a grandes profundidades no Golfo do México e construindo fábricas para liquefazer gás natural numa ilha remota da Austrália. As três investiram juntas cerca de US$ 500 bilhões entre 2009 e 2013, gastando três vezes mais por barril que concorrentes menores que se concentram em formações de xisto nos EUA.
Alguns dos maiores projetos ainda não começaram a produzir. Enquanto os investimentos das seis maiores petrolíferas na exploração de petróleo e gás subiram 80% entre 2007 e 2013, segundo a JBC Energy Markets, a produção conjunta de petróleo e gás recuou 6,5% no período.
Vários grandes projetos, porém, devem entrar em operação dentro de um ano, o que pode melhorar o fluxo de caixa e os lucros, dizem analistas.
Durante décadas, o setor de petróleo dependeu do que o diretor financeiro da Shell, Simon Henry, chama de “passado colonial” para ter acesso a reservas volumosas de baixo custo em lugares como o Oriente Médio. Isso começou a mudar na década de 70, diz ele, quando os governos começaram a endurecer as negociações com as empresas.
Ainda assim, as petrolíferas continuaram tentando produzir mais petróleo. No fim dos anos 90, “seria inaceitável dizer que a produção iria cair”, diz Henry. Na época, as empresas estavam tentando agradar os investidores com promessas de elevar a produção e cortar investimentos. “Prometemos tudo”, diz Henry. Agora, diz, “estamos colhendo o que plantamos”.
A Shell tem “cerca de um terço da carteira desses ativos gerando retorno zero”, disse o diretor-presidente da empresa, Ben van Beurden, em entrevista recente ao WSJ. Os projetos da Shell deveriam ter uma margem de lucro de pelo menos 10%, segundo ele. “Se isso significar uma empresa substancialmente menor, estou preparado para fazer isso”, disse.
No fim de 2013, a Shell cancelou um projeto de US$ 20 bilhões para converter gás natural em diesel no Estado americano da Louisiana. Neste ano, interrompeu um projeto de gás na Arábia Saudita, onde investiu milhões de dólares. Ela também reduziu a exploração de campos de xisto nos EUA e Canadá e desistiu de suas metas de produção.
No início do ano, a Exxon deixou uma licença expirar em Abu Dhabi, onde extraiu petróleo por 75 anos, e vendeu uma participação num campo de petróleo no sul do Iraque porque não oferecia retornos vantajosos. A Exxon está investindo “não para aumentar o volume, mas para agregar valor”, disse na sexta-feira o diretor de relações com os investidores, Jeff Woodbury.
Até a Chevron, que ainda promete aumentar a produção até 2017, reduziu suas projeções no início do ano. Para cortar custos, a empresa adiou planos de desenvolver um grande campo de gás no Reino Unido. Ela recentemente adiou um projeto de exploração marítima na Indonésia.
A reavaliação que as empresas estão fazendo também vem do fato de que estavam gastando mais que faturando. Em nove dos dez últimos trimestres, a Exxon, por exemplo, gastou mais com dividendos, recompra de ações e custos de capital e exploração do que gerou com suas operações e vendas de ativos.
Embora as operações de refino tenham atenuado o golpe da queda nos preços, as petrolíferas já indicaram que precisarão se endividar mais se o produto ficar ainda mais barato. O petróleo nos EUA caiu 2,2% ontem, para US$ 78,78 o barril, afetado pelo anúncio da Arábia Saudita de que vai reduzir os preços que cobra dos EUA e elevar os que cobra da Ásia, seu principal mercado, pela primeira vez em cinco meses.
Patricia Yarrington, diretora financeira da Chevron, diz que a empresa planeja seguir adiante com seus projetos principais e está disposta a recorrer à sua reserva de US$ 14,2 bilhões em dinheiro para pagar dividendos e recomprar ações. “Não estamos incomodados no momento”, diz. “Obviamente não podemos fazer isso por um longo período.”