O Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) aumentou o rigor para negociar empréstimos com empresas de alguns grupos relacionados às investigações da Operação Lava-Jato, conduzida pela Polícia Federal.
Banqueiros e fontes próximas a empresas do setor afirmam que o BNDES colocou o pé no freio enquanto avalia os riscos e a situação de cada grupo. A instituição estaria mais exigente nos pedidos de documentação e nas garantias dos contratos de longo prazo.
Camargo Corrêa, OAS, Mendes Junior, Engevix, Galvão Engenharia, UTC, Queiroz Galvão, Iesa, Andrade Gutierrez e Odebrecht estão entre as companhias investigadas pela Polícia Federal.
Fonte de uma empresa de infraestrutura ouvida pelo Valor diz que a companhia enfrenta dificuldades para negociar um empréstimo do banco, que estaria pedindo garantias não usuais. Ela atribui o entrave aos efeitos da Lava-Jato.
Na tranche de longo prazo dos financiamentos de projeto, cujo risco em tese é concentrado no veículo criado para abrigar a operação, o banco estaria pedindo garantias adicionais dos acionistas.
Um alto executivo de um banco nacional afirma que o BNDES está adotando em relação às companhias investigadas o mesmo grau de exigência que tem mostrado com a Sete Brasil. De acordo com ele, a instituição tem pedido uma série de informações adicionais para liberar operações com essas empresas.
No caso da Sete Brasil, empresa formada pela Petrobras e por sócios financeiros para a contratação de sondas para exploração do pré-sal, um empréstimo de US$ 3,1 bilhões autorizado pelo BNDES no início do ano passado ainda não foi liberado. A companhia já enfrentava dificuldades e as investigações sobre um esquema de corrupção envolvendo a Petrobras criaram entraves extras para o acesso aos recursos.
Agora, há no governo uma tentativa de resolver o impasse, já que a crise da Sete Brasil criou um efeito em cascata nos estaleiros contratados pela companhia. Enquanto os recursos do BNDES não saem, a Sete Brasil deve receber um empréstimo-ponte de cerca de US$ 500 milhões de bancos comerciais. No entanto, a expectativa de um acionista da empresa é que mesmo esse dinheiro de curto prazo leve até 90 dias para sair. “Bancos estrangeiros envolvidos na transação estão olhando os documentos com lupa”, diz.
Segundo a Sete Brasil, “esse processo [de liberação do empréstimo do BNDES] está em fase de elaboração das minutas contratuais, etapa complexa que requer um tempo maior para sua conclusão”.
Fonte próxima ao setor afirma que algumas construtoras começam a esbarrar na classificação de risco de crédito do BNDES, o que dificulta o acesso aos recursos.
A instituição tem um cadastro com o perfil de risco de todas as empresas que pedem financiamento. Segundo fontes que acompanham as negociações, o BNDES não mudou a forma de analisar os pedidos por causa da Lava-Jato. Porém, quando uma companhia é envolvida em escândalos como esse, “flutua” dentro desse cadastro. O spread cobrado da empresa tende a ficar maior e ela pode ter mais dificuldades para obter crédito.
Em nota, o BNDES afirma que sua postura geral tem sido a de fazer uma análise rigorosa dos projetos e da capacidade financeira das empresas que pleiteiam recursos. “Esse trabalho de análise de risco subsidia a decisão de apoiar ou não um determinado projeto e ajuda a determinar o custo do financiamento ao tomador”, diz.
Desde novembro, quando a Lava-Jato entrou em sua sétima fase, as notas das empreiteiras foram cortadas pelas agências de classificação de risco. O movimento reflete uma piora no acesso dessas companhias ao crédito. Além do BNDES, bancos comerciais apertaram os empréstimos ao setor, conforme já noticiou o Valor.
Um comunicado divulgado pela Petrobras no fim de dezembro impondo um “bloqueio cautelar” a companhias de 23 grupos econômicos também contribuiu para agravar a situação. Não ficou claro, no texto, se a estatal estava suspendendo novos negócios com todas as empresas desses grupos ou só com algumas. A dúvida gerou uma cautela adicional nas instituições financeiras.
As próprias companhias estão com dificuldade para esclarecer junto à Petrobras qual o alcance das sanções. O Valor apurou que a restrição vale para companhias específicas, mas as construtoras temem que a falta de clareza contamine o financiamento a empresas de seus respectivos grupos que não têm relação com a Lava-Jato.
No fim do ano, o BNDES consultou a Advocacia Geral da União (AGU) e o Banco Central (BC) para saber como proceder em relação aos pedidos feitos por empreiteiras investigadas. A AGU recomendou que o banco seguisse analisando os projetos e adotasse o mesmo protocolo usado nas demais solicitações. O Banco Central deu parecer similar.
Também em dezembro, o presidente do BNDES, Luciano Coutinho, afirmou que iria aguardar as implicações legais da Lava-Jato. Ele observou que essa não é uma situação “simples e homogênea”, pois há conglomerados com diversas subsidiárias. Por isso, defendeu, é preciso saber separar as diversas situações para não prejudicar “o sistema empresarial como um todo”.
Fonte: Valor Econômico — Fábio Pupo, Talita Moreira e Elisa Soares