O Brasil é globalmente o terceiro país com maior número de medidas de exigências de conteúdo local, que favorecem a compra de produtos e serviços produzidos no país em detrimento de importações, revela estudo da Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE).
De 138 medidas adotadas desde a crise financeira iniciada em 2008, os Estados Unidos lideram a imposição com 23 medidas, seguidos pela Indonésia, com 18, e o Brasil, com 17. Mas o estudo conclui que o impacto negativo é mais generalizado na economia brasileira que em outros países.
Ao estudar as exigências de conteúdo local sobre os fluxos comerciais (e não sobre investimentos) em dois dos 17 setores atingidos – automotivo e telecomunicações – no Brasil, a entidade conclui que o custo se propaga para todos os setores não alvejados, como agricultura e manufaturas, resultando em menos disponibilidade de insumos e menos produção.
Calcula que o total importado pelo Brasil caiu 0,56% somente como resultado do requerimento de conteúdo local nos setores automotivo e de telecomunicações. Mas o impacto foi maior na importação de componentes intermediários, com queda de 1,12%.
Conforme o relatório, também as exportações brasileiras caíram 0,57%, resultando em perda de fatia de mercado para produtos brasileiros no exterior. A perda de competitividade internacional normalmente ocorre nesses casos, assim como menor participação nas cadeias globais de valor.
Outros estudos da OCDE apontam forte vínculo entre importação de insumos intermediários e produtividade. “Isso implica um potencial declínio na produtividade na economia brasileira”, avalia a autora do relatório, Susan Stone.
Normalmente, parte das exigências de uso de conteúdo local se inserem no âmbito de compras governamentais. Outra parte, que provoca mais tensões entre parceiros comerciais, é condicionada a concessões de subsídios para regular investimentos visando promover um setor específico da produção nacional.
O estudo da OCDE rompe com a percepção convencional de que a exigência de conteúdo local é imposta basicamente por economias fechadas. Os EUA são a quarta economia mais fácil para se fazer negócios, mas tem bom número de exigências de conteúdo local em compras governamentais.
No entanto, a composição setorial das medidas é apontada como fator mais determinante dos efeitos de conteúdo local do que o tamanho da economia. Assim, a Venezuela, com peso econômico menor, sofre maior efeito comercial com suas medidas (sobre setores de petróleo, gás, automotivo) do que os EUA, mas menos que a Indonésia.
O documento conclui com uma série de alternativas para exigência de conteúdo local. Para Susan Stone, “as causas subjacentes de desenvolvimento lento ou estagnação, como política tributária, questão da educação e acesso a financiamento devem ser identificados e políticas apropriadas adotadas para resolver essas deficiências do mercado”.
O relatório da OCDE coincide com a aproximação do Brasil junto a essa entidade que é considerada uma espécie de clube de países ricos. Depois de anos martelando na importância de manter um perfil mais próximo dos países em desenvolvimento, o governo brasileiro liderado pelo PT assinou recentemente um acordo que pode pavimentar o terreno para maior participação brasileira na OCDE.
O ministro das Relações Exteriores, Mauro Vieira, participará em junho de atividades na entidade, retomando uma presença mais importante da delegação brasileira. O futuro embaixador brasileiro em Paris, que representará o país na OCDE, Paulo Cesar de Oliveira, não discorda de quem prevê que o Brasil poderá aderir à entidade até o final do atual governo.