Alardeado pelo governo federal, o bilionário programa de recuperação da indústria naval está bem longe de atingir seus objetivos. Auditoria realizada pelo Tribunal de Contas da União (TCU) concluiu que os estaleiros contratados para a construção dos navios não demonstraram, até agora, condições de realizar o serviço dentro dos parâmetros estabelecidos no Programa de Modernização e Ampliação da Frota, o Promef.
Diante desse quadro, os técnicos do TCU responsáveis pela fiscalização recomendaram que, se acatada pelo plenário, pode jogar por terra todo o discurso do governo em defesa do programa. O relatório sugere que as próximas encomendas da Transpetro – subsidiária da Petrobras em transporte de combustíveis – retirem a exigência de pelo menos 65% de conteúdo nacional nas embarcações.
O relatório técnico foi apreciado ontem pelos ministros do TCU, mas o relator do processo, Vital do Rêgo, preferiu não acatar o pleito dos técnicos. Em seu voto, aprovado por unanimidade, o ministro determinou que a Transpetro apresente relatório detalhado da situação de todas as embarcações contratadas, bem como estudo sobre o impacto dos atrasos nas entregas dos navios por parte dos estaleiros. A depender do que for apresentado, Vital pode levar novamente ao plenário do tribunal o pedido de derrubada do conteúdo nacional mínimo.
Os auditores do tribunal avaliaram as três fases do Promef, que englobam pedidos de 46 navios e 20 comboios, a um custo total de R$ 11,11 bilhões. Estão incluídos no pacote petroleiros, navios de produtos, gaseiros e comboios, encomendados a cinco estaleiros localizados no Rio de Janeiro e em Pernambuco.
“Não obstante o estaleiro já ter um grande incentivo para ser produtivo, o papel da Transpetro como fomentadora é necessário para que se cumpra a premissa do Promef de tornar os estaleiros nacionais competitivos. Só assim teria justificativa a contratação, supostamente mais custosa, com exigência de conteúdo nacional mínimo”, diz o relatório do TCU, antecipado na manhã de ontem pelo Valor PRO, serviço de informações em tempo real do Valor.
De acordo com o documento, houve atrasos em praticamente todas as contratações da Transpetro, sendo mais preocupantes os registrados no Estaleiro Atlântico Sul (EAS), em Pernambuco. Inaugurado com pompa pelo ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, o EAS é o dono da maior carteira de pedidos, com 22 embarcações encomendadas. Desse total, o estaleiro entregou seis navios, com atraso médio de dois anos. Os problemas afetaram, naturalmente, a construção das demais embarcações. A previsão é que as últimas sejam entregues à Transpetro com atraso médio de quatro anos em relação ao cronograma original.
A Transpetro informou ao TCU que a Petrobras deu prioridade às áreas de exploração e produção nos últimos anos, o que se refletiu em orçamento mais enxuto do setor de abastecimento, onde está o Promef. Devido aos atrasos nas entregas, a Transpetro teve que afretar embarcações estrangeiras, mas a empresa não detalhou o tamanho do custo dessas operações. Nos bastidores do TCU, o afretamento de navios é visto como uma das principais caixas pretas da Transpetro.