A Agência Nacional do Petróleo (ANP) vai mudar o procedimento de análise dos pedidos de perdão por descumprimento de percentuais de conteúdo local pelas companhias de petróleo. A agência passará a fazer audiências públicas para confirmar as afirmações feitas pelas empresas sobre a inexistência de itens. A primeira será para verificar a existência de embarcações marítimas capazes de realizar pesquisas sísmicas construídas ou reformadas no Brasil entre 2008 e 2015.
O resultado vai subsidiar a análise dos cerca de 70 processos com pedidos de perdão por impossibilidade de aquisição de bens e serviços no Brasil a preços justos encaminhados pelas petroleiras. A diretora-geral da ANP, Magda Chambriard, disse ao Valor que o objetivo das consultas é “perguntar para os fornecedores se eles não têm o que as petroleiras alegam que eles não têm”.
Segundo Magda, será feita consulta pública sempre que uma companhia solicitar um perdão (waiver) por descumprir os percentuais previstos nos contratos, o que evita multas milionárias.
“Toda vez que existir uma solicitação de waiver para a ANP, e a petroleira disser que esse bem ou esse serviço não existe no Brasil, vamos checar no mercado. Estamos aprimorando esse procedimento e transformando essa pesquisa de mercado em audiência pública, porque não tem nada mais transparente do que fazer isso”, explicou Magda.
Como maiores percentuais de conteúdo local melhoram a oferta nos leilões, as companhias estão sujeitas a multas caso não contratem no Brasil o prometido para cada fase do processo de exploração de uma área. Entre 2011 e 2015 foram aplicadas multas de R$ 516,9 milhões por descumprimento dos percentuais de conteúdo local acertados em contrato. A maior multa foi aplicada à britânica BG, no valor de R$ 270 milhões.
Como existe a possibilidade de um desconto de 30% quando não há recurso – e algumas companhias não contestaram as multas -, a ANP recolheu no período quase R$ 352,2 milhões em penalidades. A agência já analisou os percentuais de conteúdo local dos contratos até a 7 a rodada, e faltam concluir os da 8ªaté a 13ª rodadas de licitação. O que não significa que a agência reguladora não está atenta, afirma Magda.
Ela explicou que a ANP tem um banco de dados com informações sobre investimentos feitas em todas as concessões, e por isso pode fazer auditorias em quesitos considerados prioritários, como a perfuração de poços. “Nós auditamos como a Receita Federal, e também temos uma malha fina”, disse Magda.
Até o momento a norueguesa Statoil foi a única empresa que conseguiu “perdão” da ANP pelo descumprimento do conteúdo local na aquisição de tubos sem costura usados na exploração dos blocos C-M-529, na bacia de Campos, onde descobriu o campo Pitangola. A agência reconheceu a ocorrência de preço excessivo no processo e o perdão vale para a aquisição de equipamentos para perfuração e completação de poços. Mas a Statoil continua obrigada a cumprir o conteúdo local global previsto no contrato.
A agenda de temas sensíveis na mesa da diretoria da ANP também inclui as discussões com a Petrobras sobre a revisão do contrato da cessão onerosa, pelos quais a estatal adquiriu 5 bilhões de barris de petróleo no pré-sal na capitalização, em 2010. A estatal pagou R$ 74,808 bilhões, equivalentes a US$ 42,5 bilhões pelos barris.
O contrato original prevê a revisão dos valores atribuídos a cada barril de petróleo nos diferentes campos depois da declaração de comercialidade dos blocos, o que já ocorreu. A revisão vai considerar a produtividade dos reservatórios e custos de desenvolvimento da produção, assim como os preços do petróleo. O resultado poderá significar uma quantia bilionária paga pela União à Petrobras ou vice-versa.
A ANP vai estender por mais seis meses o contrato com a certificadora Gaffney, Cline & Associates que a assessora no processo de revisão. Tanto a agência reguladora quanto a Petrobras terão que apresentar laudos independentes, como prevê a Lei 12.276/10. A certificadora da Petrobras para o processo é a DeGolyer & MacNaughton.
A revisão prevê a análise de dados geológicos, geofísicos, de engenharia e parâmetros econômico-financeiros das áreas. Os campos receberam novos nomes da Petrobras, sendo que Franco (rebatizado de Búzios) é o maior.
Segundo a ANP, o contrato de cessão onerosa não estipula prazo para finalização do processo de revisão. Apesar da quantidade de temas difíceis na mesa, Magda diz ver com “bons olhos” a iniciativa da Petrobras de colocar à venda campos em bacias maduras.
Magda estima que existam cerca de 400 campos com potencial para oferta ao mercado, sendo que 15 deles com produção acima de 50 mil barris por dia. “Acreditamos firmemente na melhora produtiva dessas áreas, se elas estiverem sendo operadas por empresas de porte adequado.”