A situação é crítica no polo naval do Rio Grande há algum tempo, mas o horizonte não traz boas notícias. A retomada da construção da P-71, que era uma das esperanças locais, não está nos planos da Petrobras, segundo o presidente Pedro Parente, que alegou “não ter uso” para a plataforma – inicialmente prevista para operar a partir de 2018 na área Noroeste de Iara, no pré-sal da Bacia de Santos, sob o regime de Cessão Onerosa. As informações foram dadas pelo executivo nesta semana em entrevista à Rádio Gaúcha, do grupo RBS, em que Parente atuou por vários anos em cargos de alto comando, inclusive no conselho de administração, antes de assumir a estatal.
O executivo afirmou ainda que a Petrobras deu recursos para o estaleiro Ecovix funcionar por um ano em busca de novos investidores, de modo a manter as atividades, além de indicar que a companhia não pretende mais construir cascos de plataformas no Brasil, deixando para os estaleiros nacionais apenas a integração das unidades com os módulos.
Veja alguns trechos da entrevista abaixo:
– Recursos recuperados com a Lava Jato
“Já recebemos cerca de R$ 660 milhões. Esse dinheiro entra para compensar o prejuízo que registramos em 2015, da ordem de R$ 6 bilhões [com corrupção]. Do ponto de vista de patrimônio da empresa, ainda temos muito a recuperar. Tem ações com potencial de recuperar 5,5 bilhões de reais”, afirmou, ressaltando que há outros valores sendo bloqueados no mundo, o que pode elevar o total.
– Polo de Rio Grande
“Quero me solidarizar com todos que estão sofrendo as consequências das políticas desastrosas que foram praticadas no passado. (…) Lamento bastante. Mas a questão relevante aqui é exatamente o que é possível fazer para compatibilizar as necessidades da Petrobras com a capacidade de entrega daquilo que se produz no País. E, infelizmente, o histórico de produção naval destinado à Petrobras, especificamente no caso das plataformas, foi muito ruim para a empresa, muito ruim. Eu pediria que todos compreendessem isso. (…) Atrasos em média de três anos, preços acima do estipulado. E um atraso de três anos para uma plataforma causa um enorme problema para a Petrobras, que está com tudo pronto para produzir [e não recebe no prazo]”.
“Fizemos um acordo recentemente com as pessoas que estavam administrando a Ecovix, e tivemos a preocupação de dar recursos da própria empresa para dar tempo a esse estaleiro tentar se recuperar. Para que ficasse em condições de funcionamento em um ano, para ver se era possível ele encontrar interessados que possam voltar a investir no setor”.
– Erros estratégicos da Petrobras
“Tem duas questões importantes. A primeira é: teríamos mesmo condição de entregar nos prazos prometidos? E esses prazos foram prometidos. Então a evidência que temos coletado é que não havia condição de entregar nesses prazos.
A outra questão que temos é: faz sentido – ou fazia sentido – o grande número de estaleiros que foram incentivados a se instalar no País, sabendo que existe uma indústria de produção naval que é muito competitiva e trabalha com alta qualidade em outros países do mundo? Então que queria deixar isso mais como perguntas do que como afirmações.
Em relação ao tempo de entrega, é evidente que não funcionou e isso fracassou, trazendo muitos problemas para a Petrobras”.
– Está querendo dizer que as novas plataformas serão feitas no exterior?
“Estou querendo dizer que a gente está trabalhando sob o regime de leasing, em que a responsabilidade do prazo de entrega é das empresas contratadas. E quando estabelecemos esse contrato, também há exigência de conteúdo local. Isso passa a ser uma decisão dessas empresas, exatamente em função do prazo em que elas se comprometem a entregar e do requerimento de conteúdo local.
É importante mencionar que tem outras coisas que a gente pode fazer nos estaleiros brasileiros, que é a integração das plataformas. Não necessariamente construir o casco, onde já tivemos os maiores problemas, mas fazendo a integração das plataformas. O casco sozinho não está preparado para se transformar numa plataforma de produção. Para isso, ele precisa receber cerca de 22 sistemas no topside. Geradores, sistemas de separação etc. Após a integração desses sistemas, ele se transforma numa plataforma.
Nós temos condições de construir parte desses sistemas no Brasil e a integração é feita nos estaleiros brasileiros. Então não é apenas a construção. O grande problema foi a construção dos cascos, com atrasos que nos prejudicaram muito”.
– A retomada do casco da P-71 está descartada?
“Não gosto de dar informações imprecisas, então eu gostaria de confirmar, mas tenho a impressão que sim. Porque nós não temos uso para essa plataforma. Como posso explicar para os meus acionistas, sendo que a maior parte deles é a sociedade brasileira, que eu vou investir em um equipamento que custa bilhões de dólares e que eu não preciso dele. Então é difícil… de novo, eu me solidarizo com essas pessoas, entendo a frustração, a ansiedade que isso gera, mas gostaria de pedir a todos para tentarem entender o nosso lado. Para recuperar a empresa depois de tudo que ela passou. Dos escândalos, da roubalheira… Não faria o menor sentido a gente contratar uma plataforma para a qual não temos uso”.
– Fim do polo naval de Rio Grande?
“Não posso ir tão longe. Acho que o Rio Grande tem boas condições, mas tem que ser uma coisa realista. E, lembrem-se, a Petrobras é uma empresa. Ela não pode ser responsável por uma política pública. A política é responsabilidade dos governos, do poder público. Parte dos argumentos falsamente usados no passado usavam essa ideia de que a Petrobras tem que se responsabilizar pelo desenvolvimento, não sei o quê, não sei o quê…
Ela tem é que produzir ao menor custo possível, para evitar esse tipo de problema que aconteceu no passado, e cumprir a sua responsabilidade legal, que é explorar, produzir, refinar e distribuir óleo e gás”.