A trajetória da construção naval no mundo tem ciclos. No Brasil não é diferente. Os êxitos são muitos, como construção de navios de guerra, fabricação de unidades em série, projetos e navios premiados no mundo. Merece destaque a publicação da Norma Regulamentadora 34 (NR-34) resultado do trabalho de uma comissão tripartite – Ministério do Trabalho, estaleiros e trabalhadores – considerado exemplo de boas práticas em segurança do trabalho em estaleiros pela Organização Internacional do Trabalho (OIT).
Na década de 80, o país construiu os dois maiores navios de sempre: Tijuca e Docefjord, com 331 mil toneladas, um porte difícil de ser superado, como prova de eficiência e qualidade. Mais recentemente, um estaleiro do Nordeste fabricou seu primeiro navio de grande porte, que, apesar de atrasos, singra os mares de Norte a Sul.
A fase atual no Brasil é de intensa demanda. Por isso a redução das encomendas é difícil de compreender e explicar. Do ponto de vista industrial dos estaleiros, a interrupção das encomendas representa uma fratura, com a desmobilização das equipes. Engenheiros de projeto em pouco tempo estão empregados na área de vendas de outro setor e causam perda de memória do setor. Trabalhadores igualmente se misturam na massa industrial e deixam de lado suas habilidades duramente ensinadas pelos próprios estaleiros.
A construção naval é indústria de ciclo longo e necessita de um horizonte de planejamento de quatro anos. Sem uma programação de encomendas o setor perde energia e inicia desmobilização.
A indústria fornecedora aos estaleiros, muitas integrando grandes grupos internacionais, conhecedora das fases de altos e baixos do setor, age com cuidado nos investimentos em instalações locais, nas fases de sucesso, temendo os altos e baixos já conhecidos.
Em 2002, a construção naval mal tinha mil empregados em todas suas instalações. Em muitos locais, havia apenas seguranças, destinados a manter a integridade das instalações. O clima de desolação era total.
Em 2003, o então presidente Lula – chocado ao ver teias de aranha no estaleiro Verolme, em Angra dos Reis – partiu para a recuperação do setor vendo a enorme contribuição que os estaleiros poderiam prestar ao país, na produção de navios e plataformas e para gerar empregos. Os recursos do Fundo de Marinha Mercante (FMM), antes contingenciados no orçamento federal, voltaram a ser aplicados na implantação de estaleiros e construção de navios, acrescidos de sólidos aportes do orçamento fiscal.
Ao final de 2012, além mais de 300 obras em andamento, o setor tinha pela frente novos desafios. A todo o momento, eram anunciadas necessidades de mais plataformas, trabalhos de construção e conversão de cascos para plataformas, no Brasil e no exterior, e navios de apoio marítimo, sendo necessários cerca de cinco para cada nova plataforma.
Com a construção de crescente número de supply boats, a presença da bandeira brasileira ficou equilibrada em relação aos navios de bandeiras internacionais, até 2008. Assim, como dois e dois são quatro, vê-se que o esforço teria de ser hercúleo para cumprimento da lei que dá preferência a barcos nacionais, diante da demanda do pré-sal.
Mas, para preocupação das pessoas responsáveis na atividade, houve mudanças no cenário, com o país parcialmente sucumbindo à tentação internacional. Com o mundo em crise e estaleiros reduzindo atividades no resto do mundo, e certa incerteza cambial, os produtos estrangeiros voltaram a ser ameaça à construção de navios e plataformas. Em barcos de apoio, a situação é pior, pois as unidades estrangeiras são antigas, em comparação com embarcações nacionais novas.
Além de pagar o Custo Brasil, não há como se competir na comparação de barcos novos com usados. E é imperioso constatar que a Petrobras reduziu seu ritmo de licitações no mercado interno e há mais de um ano e meio não faz novas contratações de barcos de apoio para construção em estaleiros locais.
O elevado volume de encomendas nos estaleiros reativados ofusca a percepção sobre o horizonte de planejamento futuro, indicando que a demanda existe mas não está mais direcionada aos estaleiros locais.
E, por último e não menos importante, há que se frisar que o empresariado aceitou o desafio no Governo Lula, e hoje há inúmeros projetos de instalação de novos estaleiros – com a garantia de grupos fortes e respeitados – além da expansão e modernização dos atuais.
Em resumo, a construção naval louva a linha dos governos Lula e Dilma, não só em relação a encomendas como quanto ao conteúdo local, por sinal marcantes políticas de brasilidade, mas frisa que descontinuidade de encomendas causa instabilidade em um setor que passou por amargas crises em sua história.
Dos 2 mil trabalhadores de 2002, a realidade hoje é de mais de 54 mil empregados diretos, número que é ampliado no emprego indireto e beneficia as famílias de cada trabalhador empregado. Se não houver surpresas, novos empregos serão gerados. Esse é o projeto de governo no qual apostaram empresários e trabalhadores.