Com uma emissão de bônus equivalente a quase € 3,8 bilhões, a Petrobras abriu a temporada de captações externas de companhias brasileiras em 2014. A oferta sinaliza qual deve ser o perfil das emissões nos próximos meses: a procura pelo dinheiro barato da Europa num momento de alta dos juros dos títulos do Tesouro americano.
O próximo na fila é o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), que contratou quatro instituições financeiras (Banco do Brasil, Deutsche Bank, J.P. Morgan e Santander), para coordenar uma emissão de bônus no mercado europeu. A captação poderá ser feita ainda nesta semana, segundo fontes a par do assunto.
Nos bancos que estruturam captações externas de dívida, a expectativa é que as próximas duas semanas sejam movimentadas. Há bancos, mineradoras, siderúrgicas e frigoríficos estudando a possibilidade de ir a mercado, conforme fontes do setor.
Os começos de ano são tradicionalmente aquecidos para captações externas. No entanto, este início de 2014 poderá ter um volume maior de operações por dois motivos. De um lado, por causa de ofertas que ficaram represadas nos últimos meses, quando piorou o clima em relação ao Brasil. De outro, pela tentativa das companhias de antecipar captações e evitar os meses de Copa do Mundo e eleições.
Lançada e concluída ontem, a captação da Petrobras foi dividida em quatro tranches. A estatal emitiu € 3,05 bilhões em títulos denominados na moeda europeia com prazos de quatro, sete e 11 anos. Também foi feita uma emissão de 600 milhões em libras esterlinas com prazo de 20 anos.
Os títulos pagarão retornos ao investidor (“yields”) de 2,829% a 6,732% ao ano, sendo o menor valor para o vencimento de quatro anos e o maior para os papéis que expiram em 2034. Por meio de nota, a Petrobras informou que o dinheiro será usado para “financiar os investimentos previstos no plano de negócios e Gestão 2013-2017 da companhia”.
A emissão foi a maior já feita por uma companhia de país emergente no mercado europeu, disse Alexei Remizov, diretor de mercado de capitais do HSBC. A instituição coordenou a oferta ao lado de BB Securities, BNP Paribas, Bradesco BBI, Crédit Agricole, Mizuho e J.P.. Bank of China e Standard Chartered atuaram na emissão. “A Petrobras fez essa operação em um bom momento, pois as condições estão particularmente favoráveis”, disse.
A operação marcou a volta da Petrobras ao mercado externo desde maio do ano passado, quando levantou US$ 11 bilhões, um recorde para empresas brasileiras. Foi a primeira captação da companhia na Europa desde outubro de 2012. Na ocasião, a petroleira emitiu € 2 bilhões em bônus em euros e outros 450 milhões em libras.
A estatal pagou taxas mais elevadas agora do que na última operação no mercado europeu. Porém, de lá para cá os custos de captação subiram para emissores emergentes em geral e para brasileiros em particular. Além disso, o volume levantado pela Petrobras ontem foi maior. Ao mesmo tempo, a companhia teve um ganho na arbitragem entre as taxas de juros em euros e dólares. Somando o volume captado nas quatro tranches, a Petrobras teve uma economia de cerca de 50 pontos-base em relação ao que pagaria se captasse em dólares. Essa vantagem deve incentivar outras companhias a acessarem o mercado em euros, segundo analistas.
A emissão da Petrobras em euros era aguardada desde o fim do ano passado. Segundo fontes, a estatal cogitou emitir bônus em dezembro, mas desistiu e nem chegou a lançar a operação. Naquele momento, a frustração dos investidores com o processo de reajuste dos combustíveis afetou as ações e, em menor escala, os bônus da empresa. Se fosse a mercado, a estatal pagaria prêmios maiores.
“Não mudou nada em relação à empresa, mas o mercado teve tempo para digerir o assunto”, afirmou Rodrigo Fittipaldi, diretor de mercado de capitais do BNP Paribas. Segundo ele, dois outros fatores ajudaram a Petrobras. Um deles foi a definição sobre o processo de retirada do programa de estímulos monetários nos EUA. O anúncio feito no mês passado pelo Federal Reserve retirou do horizonte um fator que vinha provocando volatilidade no mercado. O outro foi o fato de a operação ter saído no primeiro dia útil do ano na Europa após as festas. “A Petrobras aproveitou as condições favoráveis e tomou a liderança”, disse Fittipaldi.
Não havia captações de emissores brasileiros desde o fim de novembro, quando o Banco do Brasil levantou 275 milhões de francos suíços (cerca de US$ 300 milhões) por meio de uma oferta de bônus. Nos últimos meses do ano passado, poucas empresas fizeram captações no exterior. Além do fato de que boa parte delas não tinha urgência em obter recursos, pesou o mau humor dos investidores em relação à política econômica brasileira, que encareceu as operações. Enquanto companhias de outros países latino-americanos continuaram emitindo bônus, as brasileiras colocaram o pé no freio.
Ontem, a operação da Petrobras mostrou que o clima melhorou e o mercado está aberto ao menos para os grandes emissores do país. Os bônus da estatal tiveram demanda equivalente a US$ 15 bilhões e atraíram principalmente investidores institucionais, gestoras de recursos e fundos de pensão, majoritariamente europeus, segundo Remizov, do HSBC. “Isso representa uma contínua diversificação da base de financiamento da companhia”, observou o executivo.
Para a analista Karina Freitas, da corretora Concórdia, a empresa aproveitou uma oportunidade. Ela alertou, porém, para o elevado nível de endividamento da petroleira. “A preocupação é com o nível de alavancagem da companhia”, disse. No fim de setembro, o endividamento da Petrobras era de R$ 250 bilhões, 70% em moedas estrangeiras, disse.
Fonte: Valor Econômico / Aline Oyamada e Talita Moreira | De São Paulo