Ariovaldo Rocha,
presidente do SINAVAL
Como todos sabem, a construção naval tem passado por ciclos de progresso, infelizmente entrecortados por períodos sombrios. Isso ocorre, em uma análise genérica, por insensibilidade de governos. Não é segredo que o setor tem dependência direta das autoridades públicas, pois qualquer alteração na política de importação – como ocorreu na década de 1980 – ou desvio de recursos do Fundo de Marinha Mercante (FMM) – como se registrou no Governo Fernando Henrique Cardoso – impacta os estaleiros. Desde 2003, no primeiro Governo Lula, o setor voltou a brilhar.
As razões do êxito são muitas, como a política de conteúdo local, pela qual navios e plataformas não são encomendados na China ou Coréia, mas no Rio, Bahia, Pernambuco e Rio Grande do Sul. Além disso, não só o FMM foi mantido intocado – sem transferência de seus recursos para pagamento de juros da dívida interna – como o ministro da Fazenda, Guido Mantega, ainda fez aportes adicionais para financiar obras necessárias. Esse dinheiro, é claro, vai voltar aos cofres públicos.
O resultado está à vista de todos: uma produção que cresce bem acima da expansão do Produto Interno Bruto (PIB) e contratação de mão-de-obra direta em torno de 80 mil pessoas – com perspectiva de chegar a 100 mil em meados do próximo ano. Velhos estaleiros foram reativados e, entre outros, estão em fase de implantação três grandes projetos: Jurong, no Espírito Santo; Wilson, Sons, no Rio Grande do Sul e Enseada Indústria Naval, na Bahia.
Com o pré-sal – e a definição do governo por encomendas no mercado interno – as perspectivas se revelam fantásticas, com obras de US$ 100 bilhões para as próximas décadas. Se houver mudança de governo, nas próximas eleições, espera-se que não se perca o bom senso e que contratos que geram empregos para brasileiros não sejam, como ocorria antes, transferidos para a Ásia.
Desde que a construção naval ressurgiu, o Sinaval bate em uma tecla importante. A de frisar que os custos nacionais precisam diminuir, para que a indústria se imponha por sua própria competitividade, se possível, exportando, para marcar definitivamente sua capacidade de concorrer com o resto do mundo. Há que se levantar exceção em relação a países asiáticos, que lançam mão de subsídios, abertos e ocultos, e de política cambial direcionada para lhes dar uma competitividade excessiva. A construção naval brasileira, no entanto, sabe que, para o futuro, depende de crescente eficiência para seguir à frente com suas próprias pernas, dependendo dos governos apenas em relação a mercado e crédito.
No entanto, o Custo Brasil, como um todo, é um enorme desafio para governos e sociedade. O presidente da Câmara Naval e Offshore da Associação Brasileira da Indústria de Máquinas e Equipamentos (Abimaq), Marcelo Campos, admitiu que é difícil fornecer peças e equipamentos nacionais para os estaleiros. Disse ele, em depoimento aos organizadores da feira marítima Marintec/Navalshore, que será realizada nos próximos dias, no Rio de Janeiro: “O Brasil tem a mais alta carga tributária do mundo. Torna-se muito difícil competir com o fabricante internacional, principalmente porque os estaleiros precisam comprar pelo menor preço possível. O custo unitário dos produtos fabricados no país não é baixo e o resultado é a falta de investimentos nessa indústria uma vez que os fabricantes nacionais não têm garantia de demanda a médio e longo prazos.”
Disse ainda: “A solução está nos investimentos em capacitação e em uma agenda comum entre governo, indústria e estaleiros, de forma a direcionar políticas sustentáveis para o setor, em benefício de toda a cadeia produtiva, pós pedidos do pré-sal.”
Eis a questão: a construção naval não quer viver de ciclos, mas se perenizar, tornando permanentes e seguros os benefícios que oferece à sociedade. Mas, como bem frisa o setor de navipeças, o país precisa cortar seus custos, de ponta a ponta: dos serviços telefônicos ao preço do aço e de exigências ditas ambientais ao custo da energia elétrica. Isso não é tarefa de um governo, mas um dia tem de ser iniciada, para que navios, carros, navipeças, televisores e tudo mais, acompanhados de uma política cambial consistente, permitam ao país competir e fortalecer sua indústria.
Em relação a impedimentos noticiados nos estaleiros Eisa (RJ) e Iesa Óleo e Gás (RS), são problemas localizados, causados por temas específicos e que deverão ser resolvidos de forma positiva. Não se trata de qualquer disfunção geral e igualmente não representa qualquer ruptura com o maior cliente do setor, Petrobras/Transpetro, uma vez que a estatal mantém sua confiança e seus compromissos com o setor e o Brasil.
Ariovaldo Rocha
Presidente do Sindicato Nacional da Indústria da Construção Naval e Offshore (Sinaval), escreve no Monitor Mercantil toda primeira sexta-feira do mês