RIO – A diretora-geral da Agência Nacional do Petróleo (ANP), Magda Chambriard, disse nesta terça-feira que o governo prepara mudanças na política de conteúdo local. A alteração na política ocorre após muita pressão da indústria e o fracasso da última rodada de leilão de petróleo, que ocorreu no último dia 7, quando apenas 14% dos blocos foram arrematados.
Segundo Magda, o governo prepara um decreto com mudanças nas regras. Mas ela evitou dar detalhes e prazos. As mudanças já são esperadas pelo mercado, que prevê a contratação de equipamentos e serviços do exterior. As principais novidades, conforme fontes que não quiseram se identificar, incluem a possibilidade das empresas acumularem bônus de conteúdo local em diferentes casos. — Vai poder acumular créditos se uma petroleira contratar uma empresa que vai precisar abrir uma unidade fabril para construir equipamentos. É essa unidade vai valer como crédito. Também poderá ser usado como crédito se a empresa contratar equipamentos com tecnologia desenvolvida no Brasil — disse essa fonte.
Caso a petroleira exporte itens produzidos no país, destacou a fonte, também poderá usá-los na conta de créditos de conteúdo local. O secretário executivo do Instituto Brasileiro do Petróleo (IBP), Antônio Guimarães, disse que a ideia do governo é criar um comitê que vai determinar as novas regras. Segundo ele, o decreto vai levar em conta algumas iniciativas que já são feitas pelas empresas, como os investimentos na cadeia de fornecedores. — Toda a iniciativa é boa, mas não sabemos qual vai ser o impacto — disse ele, que também participa da feira.
Política de governo
Por sua vez, Magda Chambriard afirmou ainda que o conteúdo local é uma política do governo e que continua trabalhando no assunto. — Temos um sucesso com o conteúdo local inequívoco, como os equipamentos subsea (submarinos), que são até exportados. Eles já têm prazo e qualidade. Mas quando olhamos para outros tipos de equipamentos, como sonda de perfuração e plataforma, ainda restam questões como prazo, preço e qualidade a serem atingidos. O que estamos fazendo agora é trabalhar para ter produtos com preço e qualidade a nível internacional. Em relação ao decreto, eu vou deixar para o ministro de Minas e Energia, Eduardo Braga, contar. Estamos trabalhando no aperfeiçoamento (das regras) — disse Magda, que participou da abertura da OTC, principal feira do setor de petróleo, que ocorre no Riocentro, no Rio de Janeiro.
Mas fez questão de avisar ao mercado que o waiver (perdão previsto em contrato para o não cumprimento do conteúdo local) é uma anormalidade. — O waiver em conteúdo local é uma anormalidade. O waiver só funciona para item e subitem e não atinge o número global (do projeto). Essa é a interpretação — disse Magda.
Benefícios mensurados
Segundo o Ministério de Minas e Energia (MME), “está em estudo a edição de aprimoramentos para a Política de Conteúdo Local do setor de óleo e gás”. Em nota, o MME disse que “foi identificado que, ao longo do tempo, alguns operadores do setor de petróleo realizaram iniciativas que geraram impactos positivos para a indústria brasileira, mas que não são conceituadas na regulamentação atual como itens de cumprimento da política de conteúdo local. A medida permitirá que tais benefícios passem a ser mensurados e reconhecidos no cumprimento de metas das empresas.
Por exemplo, a medida em estudo permitirá computar para fins de Conteúdo Local engenharia desenvolvida localmente, assim como o desenvolvimento local de tecnologia e iniciativas com elevado potencial de geração de empregos qualificados”.
O geólogo Pedro Zalan, consultor da ZAG, disse que as mudanças na política de conteúdo local são necessárias em um momento em que indústria de petróleo passa por uma retração no número de negócios com a queda no preço do petróleo.
— É importante flexibilizar os percentuais de conteúdo local que as empresas são obrigadas a contratar no Brasil. E, mesmo que a companhia se comprometa a ter determinado índice, e se ela comprovar que não consegue atingir esse número, que não sejam cobradas multas. Isso é essencial e vale para toda a cadeia — disse Zalan.
Segundo ele, essas novas regras vão permitir mais rapidez na entrega dos equipamentos da área de produção, como plataformas e tubulações. — Hoje, o Brasil ainda não tem competitividade no setor de produção. Por isso, as obras levam mais tempo e custam mais caro — destacou Zalan.
Realismo e ajustes
Professor da Coppe/UFRJ e conselheiro da Petrobras, Segen Estefen, também avalia que o programa de conteúdo local deve passar por ajustes, mas não deve ser abandonado. — Sou favorável ao realismo. Se o conteúdo local está inviabilizando projetos, devem ser feitos ajustes. Não sou contra o conteúdo local e acho que não se deve jogar tudo fora porque senão vamos apenas produzir petróleo. É preciso ver as áreas com maior dificuldade. A indústria naval não performou e é preciso ver o que aconteceu. Mas não é só o conteúdo local que está atrapalhando. Há muitos desafios ainda com o desenvolvimento de tecnologia, e os problemas vêm desde o ensino básico — disse Segen.
O presidente da Abespetro, Paulo César Martins, disse que as mudanças ocorrem após pressão da indústria e do resultado da décima terceira rodada. — É um sinal de que o governo ouviu a mensagem da indústria – disse ele, lembrando que a Abespetro representa cerca de 50 empresas de serviços do setor.