Segundo a presidência do estaleiro no Grande Recife, reoneração deixa a mão de obra 20% mais cara e diminui a competitividade devido aos preços mais altos na venda dos navios.
Trabalhadores do Estaleiro Atlântico Sul (EAS), no Complexo Portuário de Suape, no Grande Recife, estão preocupados com o impacto causado na indústria naval pela decisão de reonerar a folha de pagamento, sancionada por Michel Temer para encerrar a greve dos caminhoneiros. Segundo a presidência do estaleiro, o impacto é de R$ 35 milhões por ano e vai pesar na competitividade.
O governo federal fez um acordo reduzindo R$ 0,46 no preço do óleo diesel, mas, para isso, decidiu reonerar a folha de pagamento de setores como o comércio varejista, hoteleiro e a indústria. Na prática, a reoneração significa cobrança de impostos pra compensar a renúncia fiscal com a isenção da cobrança do PIS/Cofins sobre o óleo diesel, em atendimento às exigências dos caminhoneiros.
Segundo o presidente do estaleiro, Harro Burmann, a reoneração deixa a mão de obra 20% mais cara. Segundo ele, os últimos quatro navios têm previsão para serem entregues até julho de 2019 e não há novas encomendas, o que pode piorar com a reoneração, porque o estaleiro fica menos competitivo pelos preços mais altos na venda dos navios.
“A gente está dando passos para trás, não está indo ao encontro do que o cliente deseja. Se pensar no mercado de cabotagem, em que a gente tem uma expectativa muito grande de fazer navios conteineiros e graneleiros, temos um desafio tremendo pela frente, porque ninguém vai querer pagar mais só porque o presidente Temer vetou a desoneração do estaleiro”, disse Harro.
O governo do estado, que investiu R$ 2 bilhões na implantação da estrutura para instalação da indústria naval, prevê um impacto para a economia de Pernambuco com a reoneração do setor. Segundo o secretário de Planejamento e Gestão do estado, Márcio Stefani, o governador Paulo Câmara foi com a direção do estaleiro aos bancos financiadores e a bancada pernambucana votou a favor da desoneração, antes da decisão vinda de Brasília.
“O prejuízo é imenso, fora o que já foi investido, com operações de crédito que serão pagas por todos nós, pernambucanos. Nós investimos também na formação de gente. Tiramos pessoas dos canaviais para fazer navio”, afirmou Stefani.
Apenas com salários, o estaleiro movimenta R$ 500 milhões por ano e gera 18 mil empregos indiretos. Cerca de 90% dos trabalhadores são de Pernambuco. No começo, eram 40%. Foram 10 anos de investimento e capacitação da mão de obra local.
“Um projeto aqui demora 12 meses para ser idealizado e 12 meses para ser construído. Estamos em junho de 2018 e temos projetos até julho de 2019. A cada mês que passa, os empregos no estaleiro estão, sim, em risco”, explicou Harro.
O gerente de produção do estaleiro, Lucas Fortes, chegou à empresa como estagiário e agora comanda 250 funcionários. Segundo ele, a produtividade melhorou durante os dez anos de operação do estaleiro.
“Somos competitivos com o mercado asiático, que é nosso principal concorrente. Conseguimos reduzir nossos custos, melhorar nossa produtividade e nossos processos e conseguimos recordes. Foi um investimento de R$ 30 milhões, que nos elevou para outro patamar de produtividade”, disse Lucas.
Líder de grupo do estaleiro, Derivaldo Costa tem orgulho de trabalhar no estaleiro e pede oportunidades para o setor naval brasileiro. “Nós temos 11 navios transportando petróleo e as riquezas do nosso país e isso tem feito que a empresa venha aparecer no cenário nacional. Passamos pela curva do aprendizado e agora precisamos da oportunidade para expandir nosso conhecimento e produzir cada vez mais”, comentou Derivaldo.
Férias coletivas
No dia 1º de junho, o EAS decidiu dar férias coletivas a cerca de 3.100 funcionários, o que equivale a aproximadamente 90% do total, após passar três dias sem funcionar por falta de matéria-prima. A decisão foi tomada por meio de votação em uma assembleia de trabalhadores. Eles voltaram ao trabalho na segunda (11).
Materiais como gás para os equipamentos e solda não chegaram ao estaleiro por causa da paralisação dos caminhoneiros, que bloquearam pontos de rodovias em todo o país e limitaram o fluxo de veículos no Porto de Suape, em Ipojuca, no Grande Recife. De acordo com o EAS, o prejuízo por dia útil não trabalhado chegou a R$ 2 milhões.
A decisão de conceder as férias coletivas teve o objetivo de reduzir os prejuízos ocasionados ao estaleiro, durante os dias com as atividades paralisadas.