A plataforma P-76 é uma das unidades que vai ajudar a Petrobrás a alcançar a sua meta de aumento de produção de óleo e gás. O FPSO, hoje no estaleiro de Pontal do Paraná, vai ser entregue pela Techint até o final do ano. O projeto é emblemático por conta do seu alto nível de conteúdo local – 70% -, e representa um símbolo da capacidade da indústria naval brasileira. Para o diretor comercial da Techint, Luis Guilherme Sá, a P-76 cumpre o papel de mostrar que o mercado nacional tem condições de atender a demanda futura de novas plataformas. Contudo, existem desafios a caminho após a entrega do navio, no final do ano. A demissão de parte da mão de obra será inevitável, em virtude da falta de novos empreendimentos. “Vamos manter uma atividade mínima, mas o grosso dessas pessoas será dispensado, porque não temos projetos. Os que estão na rua hoje são de baixo conteúdo local”, explicou. Apesar das dificuldades, o diretor tem ainda boas expectativas em relação ao futuro, com a adoção de 40% de conteúdo local para FPSOs em blocos já leiloados no passado. Ele espera, contudo, que esse mesmo percentual seja aplicado também às licitações futuras – já que nos certames mais recentes, como a 5ª rodada do pré-sal, foi adotado o número de 25%.
Gostaria de começar falando sobre a P-76 e desse momento de expectativa em torno da entrega da unidade.
A P-76 é um projeto de sucesso, que estamos concluindo, neste momento, no Pontal do Paraná. Estamos com previsão de saída da plataforma até o final do ano. É um projeto que gerou mais de 5 mil empregos na região. Ele mostrou que é possível fazer conteúdo local competitivo no Brasil. Hoje, estamos com um índice de conteúdo local de 70%. Acho que, realmente, a P-76 cumpre o papel de mostrar que o mercado nacional tem condição de atender a demanda das plataformas futuras.
E o que espera a partir de agora, após as mudanças na política de conteúdo local?
Eu vejo essas mudanças de forma muito positiva. Inclusive, nós contribuímos com a Agência Nacional do Petróleo (ANP). Eu acho que a agência fez um estudo técnico muito sério, coordenado pelos seus técnicos. Eles chegaram a um ponto de equilíbrio onde temos um balanço entre competitividade, valorização da indústria local e empresas que investiram no país, com um índice de 40%. É um número que é razoável, porque oferece a possibilidade de manter uma escala que viabiliza a indústria local, ao mesmo tempo que equilibra a competitividade, trazendo componentes do exterior.
Qual sua expectativa de retomada da indústria naval?
A nossa expectativa é positiva. Analisando o que foi acordado com a ANP e os aditivos que foram assinados, vemos uma perspectiva muito positiva dentro desse cenário. Por exemplo, Libra 1 e Sépia foram ao mercado com uma exigência de conteúdo local de 20%. Dessa forma, não foi gerada demanda de trabalho para nós. Fomos consultados para fornecer dois módulos para Sépia, o que não dá escala. Precisamos de uma escala mínima. Vemos nessa mudança uma perspectiva de termos demanda com mais escala, permitindo usar a capacidade disponível dentro do nosso site.
E quais desafios o setor ainda precisa superar?
O maior desafio é essa regra ser respeitada. Acho importantíssimo. O desafio é sensibilizar o governo para considerar o estudo que foi feito pela ANP, que foi sério e embasado, para as rodadas futuras. Isso porque, hoje, temos uma incoerência. De um lado, temos a ANP dizendo que a indústria é capaz de atender 40% de conteúdo local. Ela identificou que a produção de módulos no Brasil é possível de ser feita de forma competitiva. A agência identificou também que temos desafios em relação a casco.
Por outro lado, você tem uma contradição, porque o governo definiu o índice de 25% de conteúdo local para os leilões [futuros] definidos a partir de 2017, sem um critério técnico muito claro. Até hoje, ninguém soube como foi definido esse percentual. Ele está dentro de um contexto de questionamento do conteúdo local, e um dos argumentos que foi trazido [na época] era de redução do conteúdo local para atrair investimentos para o país. Agora, estamos em um momento onde o petróleo está a US$ 80 e as empresas estão melhorando seus resultados. Toda aquela argumentação em torno de redução de conteúdo local perde o sentido. Então, o desafio é que o governo observe o estudo que foi analisado pela ANP e alinhe a exigência de conteúdo local para os blocos futuros.
Como enxerga os impactos destes aditivos que estão sendo assinados?
No curto prazo, esses aditivos vão oferecer uma série de oportunidades para o mercado. É nisso que apostamos e acreditamos. Mas, a verdade é que os projetos futuros estão indo com 25%. Daqui a oito anos, quando esses projetos começarem a gerar demanda por novas plataformas, teremos um agravamento do problema. Com esses 25%, a indústria voltará a mesma situação: sem escala, criando um ambiente de crise desnecessário. A ANP, de forma criteriosa, mostrou que o caminho seria um ponto de equilíbrio.
Uma decisão sobre conteúdo local não é algo abstrato. Isso envolve pessoas. Estamos falando de milhares de pessoas envolvidas. Quando falamos de um projeto ir para China, estamos falando de 5 mil empregos indo para a Ásia, mais 10 mil indiretos. São famílias que deixam de colocar os filhos na escola e alimentá-los adequadamente. É muito triste isso, porque o Brasil não está valorizando o que tem de mais valioso, que é nossa mão de obra.
E em relação a competitividade da indústria naval? Qual sua visão?
Do portão para dentro, somos competitivos. A questão toda é que, do portão para fora, estamos dentro do Brasil. O que é perverso é que se comenta que as empresas não têm competitividade. Mas no caso da Techint, temos competitividade dentro de padrões internacionais. Isso já foi dito por empresas internacionais que vieram fazer auditoria sobre nossa produtividade. O nosso problema são os custos de encargo social, carga tributária, burocracia e tudo que cerca o Brasil e tira a competividade. Essa é uma discussão que é importante de ser promovida, porque se queremos ter oportunidades para as pessoas progredirem, temos que gerar oportunidades de emprego de qualidade. Dá muita tristeza ver um projeto como a P-76 sair ao final do ano e não termos uma perspectiva de curto prazo. O que estamos apontando é para projetos futuros. Quando a P-76 sair, teremos que dispensar muita gente.
Existe uma perspectiva de quantas pessoas serão dispensadas?
Vamos manter uma atividade mínima, mas o grosso dessas pessoas será dispensado porque não temos projetos. Os projetos que estão na rua hoje são de baixo conteúdo local. Fomos consultados para Sépia e Libra 1, mas não participamos porque não havia condição. Marlim 1 e 2, que estão na rua, tem conteúdo local zero. Búzios V tem conteúdo local de 25%. O que temos de concreto na rua são seis projetos, mas o único que tem possibilidade de oportunidade para o mercado local é Libra 2. O resto, vai tudo para fora do Brasil.
Estamos esperançosos de que, com toda essa mudança, teremos projetos futuros dentro desse novo modelo de 40% de conteúdo local.