Petroleira inicia renegociação de contratos com fornecedores de E&P, mirando alívio de caixa para o restante do ano.
Diferimento parcial de pagamento, redução de taxas de afretamento, suspensão temporária de contratos, reuniões virtuais e muita, mas muita urgência. Essa tem sido a estratégia da Petrobras na renegociação dos contratos com grandes fornecedores do setor de óleo e gás em meio à crise em que se combinam a pandemia da Covid-19 e a queda do preço do barril de petróleo.
Segundo mapeamento feito pela Brasil Energia, a Petrobras está levando em consideração as particularidades das atividades e as condições econômicas de seus contratos em vigor. Nessa primeira leva, a petroleira decidiu priorizar as negociações com empresas de FPSOs, sondas, Unidades de Manutenção e Serviço (UMSs), barcos de lançamento de linhas e de apoio.
No caso dos FPSOs e sondas de perfuração, o foco recai sobre o diferimento parcial de pagamento. Já para os PLSVs, a régua de corte da petroleira se mostra mais dura, prometendo impor não somente a paralisação de algumas unidades, como a redução de taxas diárias. Em relação às UMSs e barcos de apoio, a proposta é a suspensão temporária dos contratos.
O objetivo da Petrobras é aliviar o caixa da companhia em 2020, duramente afetado pela crise. Os grupos internos de negociação correm para fechar os acordos com os fornecedores e implantar as mudanças já a partir de maio ou mesmo em abril, a depender da situação.
A estatal alega não ter fôlego para aguentar muito tempo, tendo em vista as atuais condições contratuais e o cenário de crise que ganha forma cada vez mais desafiadora.
Diferimento de 15%
No caso das sondas – mercado que ainda sofre os efeitos da crise vivida em 2014 –, a proposta é de um deferimento médio de 15% no pagamento das taxas diárias das unidades já em operação, no horizonte de maio a dezembro. O valor retido pela petroleira será restituído às empresas entre maio e dezembro de 2021.
Para as unidades já afretadas, mas que ainda estão por iniciar atividades em 2020, a proposta é que comecem a operar apenas no segundo semestre. Hoje, a Petrobras tem em carteira 20 sondas – das quais ao menos três não entraram em operação – além das quatro da Sete Brasil, que aguardam assinatura do contrato.
Diferentemente de outros segmentos, a carteira de sondas da Petrobras conta com taxas bastante distintas. A maior parte dos contratos assinados ao longo de 2019 gira abaixo dos US$ 170 mil/d. No entanto, alguns foram fechados por US$ 135 mil/d.
Os contratos de sondas em vigor foram firmados com a Transocean, Petroserv, Diamond, Ocyan, Constellation, Seadrill e Etesco. As brasileiras Constellation e Ocyan possuem o maior número de contratos, mantendo, juntas, um total de 11 unidades.
As taxas mais baixas são da Constellation. A Ocyan, por ter contratos antigos e não ter participado da renegociação de 2014, lidera a lista das taxas mais altas, próximas do patamar de US$ 300 mil/d, ao lado da Diamond.
Independente dos valores das diárias, a percepção é que as empresas de perfuração trabalham no no limite de suas margens, sem gordura para cortar. A maior parte dos grupos sequer conseguiu dar a volta por cima dos anos de prejuízo impostos pela crise de 2014.
Enquanto a Constellation enfrenta processo de recuperação judicial, multinacionais como a Seadrill e a Pacific Drilling e a brasileira Ocyan ainda buscam se recompor no mercado depois de anos difíceis.
Mais leve
Das cinco frentes de renegociação abertas até o momento, a dos FPSOs é, sem dúvida, a menos dura. A proposta da Petrobras é reter 4,8% do pagamento das taxas diárias entre maio e dezembro, efetuando a compensação dos montantes nos mesmos meses de 2021.
Segundo fontes da petroleira, a negociação é direcionada a todas as empresas com contrato de afretamento em vigor, o que inclui grupos que operam FPSOs definitivos e unidades de projetos itinerantes. As rodadas virtuais de negociação são feitas com Modec, Ocyan, Saipem, SBM e Teekay.
O único grupo a ficar de fora foi a BW Offshore, uma vez que o contrato de afretamento do FPSO Cidade de São Vicente está para vencer, não havendo interesse de renovação.
A convocação das operadoras de FPSOs reforça o peso da atual crise sobre os indicadores financeiros da Petrobras. Como as unidades de produção garantem reforço ao caixa da companhia, tradicionalmente o segmento é poupado de cortes, como aconteceu na última crise, quando foi o único mantido intacto.
Em termos comerciais, a opção pela estratégia do diferimento parcial de pagamento utilizada para renegociação dos contratos de sondas e FPSOs foi bem vista pelas empresas de ambos os segmentos. A avaliação é que o estrago poderia ser ainda maior se a petroleira impusesse corte nas taxas de afretamento ou paralisação dos contratos.
“É óbvio que o impacto disso será muito ruim para as empresas, que ainda estavam se recuperando de anos e anos de crise, mas, diante do cenário, atual e do que vem sendo proposto a outros setores, dos males, o menor”, avalia uma fonte do setor.
Proposta amarga
Enquanto operadoras de FPSOs e de sondas sentem um misto de preocupação e alívio, empresas especializadas no lançamento de linhas acendem luzes de alerta, já antevendo que processo de renegociação ameaça impactar duramente seus indicadores financeiros.
A petroleira propôs que Sapura, Subsea 7 e TechnipFMC coloquem, cada uma, dois de seus contratos em stand by até o final do ano, indicando ainda a necessidade de renegociação das taxas diárias para o patamar médio de US$ 170 mil/d – valor de um dos contratos atualmente em vigor.
A frota de PLSVs da Petrobras é composta por 15 barcos de lançamento, sendo cinco da Sapura, seis da TechnipFMC e quatro da Susbsea 7 – a maioria com taxas diárias girando em torno dos US$ 300 mil. Obtendo êxito nas negociações, a petroleira ficaria com apenas nove barcos, com os contratos suspensos voltando a vigorar em 2021.
Especialistas temem que algumas empresas não tenham fôlego para absorver as medidas restritivas da Petrobras. No caso da Subsea 7, por exemplo, a medida imporia redução de 50% da frota contratada. Por outro lado, não há dúvida que a petroleira não tem demanda para tantas embarcações, sobretudo diante do corte de investimentos já aprovado para 2020.
Com os projetos do pré-sal performando cada vez melhor e propiciando a redução do número de poços, a avaliação é que a frota de 15 embarcações passou exceder a demanda, até mesmo antes das medidas de resiliência, quando a companhia tinha uma longa lista de projetos de desenvolvimento da produção em carteira e nenhuma previsão de corte.
Floteis paralisados
Em outra frente, a Petrobras negocia a interrupção imediata das atividades dos cinco floteis que integram sua carteira no momento: Safe Eurus e Safe Notos, da Prosafe; OOS Tiradentes, da CIMC; Aquarius, da Sembcorp Marine; e Posh Xanadu, da Posh.
A petroleira quer que as empresas suspendam os trabalhos por quatro meses, período que será estendido após o final do prazo contratual original. Durante a interrupção das atividades, a Petrobras fornecerá o diesel às unidades, que serão mantidas com tripulação reduzida.
Queda de braço
Nas reuniões virtuais realizadas com executivos e representantes de empresas dos cinco segmentos, os gerentes da petroleira que lideram as negociações têm pedido a colaboração dos fornecedores para atravessar o momento delicado.
Sem mencionar qualquer informação sobre juros, a petroleira garante a continuidade dos contratos, o que, em tempos de crise aguda, pode ser visto como espécie de contrapartida, já que algumas companhias optam por recorrer à justiça a fim de assegurar o cancelamento de contratos com base no recurso de força maior.
É possível antever que, apesar da urgência da Petrobras, a conclusão das negociações não será nada fácil. Em 2014, por exemplo, os acordos levaram, em média, seis meses para serem fechados.
Ainda que a Petrobras tenha vantagem de ser a contratante em tempos de crise, em alguns casos é projetada queda de braço pesada entre as partes, com alguns fornecedores impondo resistência.
Não se pode perder de vista que muitas das unidades afretadas estão financiadas e que, por conta disso, qualquer acordo demandará o aval das entidades garantidoras. No caso das empresas em recuperação judicial, as negociações precisarão ser previamente validadas pelos representantes legais.
Deflagradas no início de abril, as negociações são conduzidas por equipes da Petrobras do Rio de Janeiro e de Macaé, vinculadas à Gerência Executiva de Suprimentos de Bens e Serviços. A área é subordinada à Diretoria de Assuntos Corporativos, que, a partir de maio, será remanejada para a Diretoria Financeira e de Relacionamento com Investidores, comandada por Andrea de Almeida.
Cumprida a primeira leva de negociações focadas nos segmentos de FPSOs, sondas, UMSs, barcos de lançamento e embarcações de apoio, a petroleira poderá se voltar a outros segmentos, caso a crise ganhe contornos ainda mais fortes.