O horizonte permanece nublado para a indústria naval, que sobrevive sem saber ao certo como será o volume de pedidos para os próximos cinco anos. Incertezas em relação à retomada das encomendas pela Petrobras, sobre o nível de conteúdo nacional e o lançamento de medida provisória que permitirá a destinação de recursos para que a Marinha do Brasil encomende embarcações a estaleiros do país colocam uma interrogação sobre o nível de produção e de emprego no setor a partir de meados de 2019, quando serão entregues cinco navios petroleiros e uma plataforma de produção de petróleo.
“O horizonte é bastante incerto, pois não há previsão de novas encomendas em curto prazo e os estaleiros que ainda estão com obras encerrarão as atividades entre 2019 e 2020, se não houver novas demandas. O sindicato conversa com a Petrobras e outros players, buscando solução para a situação atual”, afirma Sergio Bacci, vice-presidente executivo do Sindicato da Construção Naval (Sinaval). Estão sob ameaça cerca de dez mil empregos nos estaleiros, caso os pedidos não sejam retomados.
Em paralelo, as empresas tentam diversificar sua atuação. Algumas estudam participar da licitação da Marinha para construção de quatro corvetas (navios de guerra). Para o consultor da Ivens Consult, Ivan Leão, a preocupação atual é com o Estaleiro Atlântico Sul (EAS), em Pernambuco, que entrega no ano que vem os últimos navios petroleiros para a Transpetro e o Estaleiro BrasFels, no Rio de Janeiro, controlado pela Keppel Marine, de Cingapura, que finalizou a integração de módulos do FPSO Campos dos Goytacazes para a japonesa Modec. Depois de perder mais de 50 mil vagas de trabalho nos últimos quatro anos, a indústria naval deve seguir sem demissões significativas até o final de 2018 pelo menos, segundo pesquisa da UBM Brazil.
A esperança da indústria naval nacional está no Congresso, na Petrobras e em conversas com o governo federal, que tem dado sinais de estar atento ao problema. “Os ministérios da Defesa e dos Transportes estão buscando aprovar Medida Provisória que fomente a indústria naval ampliando recursos para o Fundo da Marinha Mercante”, disse o vice-almirante Marcelo Campos, em evento em junho em São Paulo. “Essa questão está há quase um ano sendo debatida. O processo está há quatro meses na Casa Civil, aguardando a assinatura do Presidente da República para publicação da Medida Provisória”, informa Bacci, vice-presidente executivo do Sinaval.
A MP reservaria 10% da arrecadação anual do Fundo da Marinha Mercante (FMM) para as encomendas de navios militares à indústria nacional, o que poderia representar mais de R$ 300 milhões, diz um executivo. O Fundo, do Ministério dos Transportes, Portos e Aviação Civil, já financiou R$ 9,39 bilhões, de 2010 até hoje, para a construção de 27 embarcações de cabotagem. A indústria se ressente do financiamento mais caro com a mudança dos financiamentos do BNDES, que no lugar da Taxa de Juros de Longo Prazo passou a adotar, desde janeiro, a Taxa de Longo Prazo, com juros menos subsidiados e próximos aos do mercado.
Outro fator de alento que poderia alterar o cenário é a Petrobras. Até 2022, a estatal prevê a entrada em operação de 19 sistemas, 14 deles referentes às operações em campos do pré-sal. Três serão afretados, com o resto de frota própria, segundo informações da assessoria de imprensa da empresa, que trabalha no planejamento das encomendas do próximo ciclo. Em entrevista recente ao “O Globo”, o diretor de desenvolvimento da produção e tecnologia da Petrobras, Hugo Repsold, disse que a empresa considera contratar estaleiros nacionais para ter plataformas próprias e começaria um mapeamento da indústria nacional. Segundo estimativas, a estatal deve contratar 80 plataformas, 160 navios aliviadores e 50 de cabotagem nos próximos 25 anos para atender à demanda do pré-sal.
Diante das incertezas em relação à MP e ao plano de investimentos da Petrobras, já há empresas discutindo a possibilidade de encerrar atividades no próximo ano por falta de encomendas ou analisando a possibilidade de dispensar temporariamente parte dos seus funcionários. O locaute dos caminhoneiros piorou o cenário: alguns estaleiros paralisaram parcialmente pedidos por falta no recebimento de insumos no Nordeste. As preocupações já foram levadas à Câmara, em encontro com o presidente da Casa, Rodrigo Maia.
Parte da preocupação dos empresários em relação ao futuro do segmento se refere à China, cujo excesso de mão de obra e de aço tornam as embarcações do país competitivas em relação a qualquer país do mundo. Teme-se que grande parte dos pedidos possa ser feito com a China, mesmo de empresas que não a Petrobras, já que hoje cerca de 20% do petróleo extraído no Brasil está fora das mãos da estatal.