Desde o início da crise do setor, há quatro anos, a indústria naval perdeu 67% dos empregos, indo de 82.472 postos de trabalho em dezembro de 2014 para 26.944 posições em junho deste ano. Os dados são do Sindicato Nacional da Indústria da Construção e Reparação Naval e Offshore (Sinaval), que credita o cenário adverso a uma série de fatores, como as crises do setor de petróleo e da Petrobras, a Lava-Jato e a política de redução do conteúdo local.
“O principal fator foi a decisão da Petrobras de não construir mais nada no Brasil. Diversas empresas estão operando muito abaixo da capacidade instalada, atuando apenas em serviços, reparos ou terminando alguma obra”, diz Sérgio Bacci, vice-presidente-executivo do Sinaval.
Ele afirma que, se não forem recompostos os índices de conteúdo local, dificilmente o setor vai se recuperar. O índice anterior era de 65%, mas, de acordo com Bacci, o setor de óleo e gás pressionou para sua extinção. Surgiu a proposta de um índice de 25%, e, após negociações, chegou-se em abril a um meio termo de 40%.
“Isso é válido apenas para o passado, para os contratos da 7ª à 10ª rodada. Para os contratos futuros, incluindo os do pré-sal, a ANP (Agência Nacional de Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis) fixou em 25%. Só o subsee [equipamentos submersos que têm de ser produzidos no país] já consome esses 25%. A estratégia é continuar negociando com o governo para ampliar o conteúdo local.”
Outra iniciativa é abrir um diálogo com os presidenciáveis sobre o potencial do setor. O vice-presidente do Sinaval afirma que, em 2013, a indústria gerava o equivalente a dois terços dos postos de trabalho da indústria automobilística, sem os mesmos incentivos.
As últimas encomendas do sistema Petrobras são os cinco navios que o EAS, de Pernambuco, deve entregar até 2019 à Transpetro, além dos navios plataformas (FPSO) P68 e P70, com integração de módulos no Estaleiro Jurong, no Espírito Santo.
Principal polo da indústria naval brasileira, o Rio de Janeiro vive um cenário ainda mais desanimador. Segundo a Federação das Indústrias do Estado do Rio de Janeiro (Firjan), foi observada, entre 2013 e 2017, uma redução de mais de 30 mil postos de trabalho no mercado de petróleo, gás natural e indústria naval no Estado.
“Na área naval, passamos de 30 mil postos para 8,8 mil no Rio de Janeiro até junho. Há poucos estaleiros em atividade, como o Brasfels, que produz plataformas em Angra dos Reis e, inclusive, acaba de ganhar um contrato da Modec para fabricação e integração de um módulo do FPSO Carioca MV30. Isso talvez sinalize o início de recuperação do mercado com a retomada dos leilões de exploração de petróleo”, acredita Thiago Valejo, coordenador de conteúdo estratégico de petróleo e gás natural e naval da Firjan.
Anderson Dutra, sócio para a área de petróleo e gás da KPMG, diz que a indústria naval foi afetada pela mudança de ciclo do setor de óleo e gás, que passou, de uma fase de exploração e investimentos para a de produção. Só que a queda de preço da commodity foi mais acentuada do que se esperava, devido à desaceleração da economia da China e ao posicionamento da Opep para impedir os EUA de ganharem market share.
Ele explica que, quando o preço do petróleo cai, operadoras de países como o Brasil, que têm ponto de equilíbrio (break even) alto na exploração, começam a rever seus portfólios de projetos. Some-se a crise da Petrobras, que vinha muito alavancada e paralisou todos os projetos, afetando principalmente a indústria naval.
Para Dutra, os estaleiros precisam rever seu modelo de negócio e dar foco maior em serviços de manutenção, buscando capturar outras oportunidades.