Empreendimento sugere que navios estrangeiros estariam sendo usados no transporte do petróleo do pré-sal, o que infringe as regras da cabotagem e debilita ainda mais a indústria naval brasileira
Com 10 anos de produção, o Pré-Sal já gera 1,5 bilhão de barris de petróleo por dia. O número é celebrado pela Petrobras porque já supera a produção do Reino Unido e ainda deve crescer. Porém não anima a indústria naval brasileira. O Estaleiro Atlântico Sul (EAS), situado no Litoral Sul de Pernambuco, explica que, apesar de os estaleiros nacionais estarem precisando de encomendas para se manter em atividade, há indícios de que a maior parte desse óleo não tem sido transportado por navios fabricados no Brasil, mas por embarcações importadas da China.
Segundo o presidente do EAS, Harro Burmann, essa informação foi ventilada em um evento que reuniu representantes do setor naval e do Governo Federal. Por isso, será investigada pelo estaleiro pernambucano. “Foi dito que já há 40 navios trabalhando no Pré-Sal, sendo 24 da Petrobras. São navios que transportam óleo da plataforma para o terminal ou para o porto de tratamento, em uma operação que se caracteriza como cabotagem (navegação entre portos do mesmo país) e que necessita de bandeira brasileira. Porém, no sistema da Marinha, só encontramos 19 navios com autorização para esse tipo de serviço”, relatou Burmann, dizendo que, por isso, será apurada a procedência das outras 21 embarcações.
“Teoricamente, esse é um mercado que deveria ser de bandeira brasileira e que poderia ajudar a colocar o setor naval de pé”, justificou Burmann, dizendo que, já no evento, circularam informações de que esses navios realmente estariam tentando contornar as regras da cabotagem. “Disseram que eles saem das águas brasileiras para transbordar para outro navio, que vai trazer esse óleo de volta, só para não ter bandeira brasileira”, revelou o presidente do EAS, pontuando, contudo, que tudo isso será investigado a partir de agora. E esse trabalho vai contar com a ajuda do Sindicato Nacional da Indústria da Construção e Reparação Naval Offshore (Sinaval). “Estamos trabalhando juntos, porque a Petrobras não pode virar as costas para o País e continuar fazendo encomendas à China”, afirmou o vice-presidente-executivo do Sinaval, Sergio Bacci.
Eles argumentaram que, desde 2014, 30 estaleiros pararam de funcionar no Brasil justamente por conta da falta de encomendas. E os que ainda estão em operação também estão sofrendo para se manter de pé. O EAS, por exemplo, conclui suas últimas encomendas em meados do próximo ano, mas ainda não conseguiu novos contratos que possam assegurar os 3,3 mil empregos gerados atualmente. “Só no EAS, a Petrobras cancelou a encomenda de sete desses navios que estão sendo usados no Pré-Sal. Eles cancelaram aqui para fazer na Coreia e na China”, reclamou Burmann, dizendo que a fabricação no Oriente é mais barata por conta da alta carga tributária brasileira. “Mas é preciso lembrar dos empregos que são gerados pelo setor. A indústria naval já chegou a empregar 84 mil pessoas no País em 2015”, defendeu Bacci, dizendo que, por conta desses e de outros cancelamentos, esse número de empregos já caiu para 25 mil.
Procurada pela reportagem, a Petrobras ainda não se manifestou sobre o assunto. Nesta semana, contudo, a empresa divulgou nota comemorando os 10 anos do Pré-Sal e também os seus planos de ampliação. Segundo a Petrobras, até 2022, o Pré-Sal vai ganhar mais 13 plataformas e mais US$ 35 bi em investimentos. “De cada quatro projetos de produção programados para os próximos anos, três serão instalados nessa camada”, disse a empresa. “Demanda de navios não falta. Por isso, vamos tentar trazer isso para o Brasil”, avaliou Burmann.