Em requerimento encaminhado a senadores, comissão de assuntos regulatórios da Ordem apontou que texto proposto prejudica concorrência. Projeto de lei pode ser votado esta semana no Senado.
A comissão de assuntos regulatórios (CAR) do Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) sugeriu a senadores a retirada da urgência constitucional do projeto de lei 4.199/2020 (BR do Mar), que dispõe sobre mudanças na navegação de cabotagem. No requerimento, a comissão alegou “riscos graves à segurança nacional e ao interesse público”, se não houver uma avaliação de impacto regulatório e legislativo consistente na matéria. A CAR entende que o texto proposto apresenta regras que podem prejudicar a concorrência. O ofício foi encaminhado ao presidente do Senado, ao relator, senador Nelsinho Trad (PSD/MS), à secretaria geral da mesa diretora e à comissão de infraestrutura.
O PL 4.199/2020 visa aumentar o uso do transporte por cabotagem, por meio da flexibilização das regras de afretamento e da diminuição de barreiras para utilização de embarcações estrangeiras. No entanto, a comissão avaliou que o novo cenário para afretamento previsto no PL coloca uma ‘cortina de fumaça’, no que tange a dispensa do lastro de embarcações nacionais, o que poderia reduzir investimentos (capex) das empresas brasileiras de navegação (EBNs). A CAR considera que a previsibilidade de determinação a posteri das condições de afretamento de embarcações estrangeiras pode consistir em vício de natureza legal, uma vez que haveria, em tese, ‘usurpação de competência’ na iniciativa de legislar.
No atual modelo, uma embarcação estrangeira somente pode atuar no mercado, caso ocorra afretamento por EBN, sendo a inexistência ou indisponibilidade da embarcação de bandeira brasileira, do tipo e porte adequados, a hipótese mais comum. A combinação desses elementos, de acordo com a comissão, reforça a necessidade de as empresas brasileiras recorrerem ao mercado internacional, para o afretamento de navios. A carta cita o PLS 3.129/2020, da senadora Kátia Abreu (PP-TO), que busca impedir que a regulação limite o alcance do marco regulatório do setor (Lei 9.432/1997), principalmente quanto ao afretamento por tempo. O argumento é no sentido de garantir maior poder de escolha e negociação por parte dos embarcadores na cabotagem, permitindo maior abertura de afretamento das embarcações estrangeiras. O PLS de autoria da senadora tramitará em conjunto com o PL da cabotagem.
O ofício da CAR analisa que, embora o PL tenha entre as diretrizes a necessidade de fomentar a competição entre os agentes do segmento de cabotagem, o texto traz barreiras ao desenvolvimento das pequenas e médias empresas, sendo um grande fator de concentração de mercado, conforme manifestação do Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade). Baseado no órgão antitruste, o documento cita que o afretamento de embarcação estrangeira de empresa subsidiária e capacidade da embarcação afretada limitada à determinada proporção da capacidade da frota própria tende a manter elevados os níveis de concentração do setor e dificultar a entrada e expansão de novas empresas no mercado.
Além disso, o requerimento menciona que a possibilidade de se usar embarcações de bandeira estrangeira para bloqueio de circularizações reforça os efeitos concorrenciais negativos, decorrente dos critérios propostos para o afretamento por tempo. Outro ponto de atenção apontado é que, no caso dos afretamentos a casco nu, verifica-se que pode propiciar aumento da oferta de embarcações, porém a total liberalização ocorrerá apenas em janeiro de 2023. Dessa forma, sob a ótica concorrencial, o entendimento é que seria preferível que a remoção de barreiras ocorresse o quanto antes.
A CAR destacou que a abertura do mercado, com estímulo à competitividade no setor de transporte de cargas, é fundamental para o desenvolvimento da logística do país. “O projeto de lei é extremamente complexo, pois envolve diversos interesses contrapostos. Por isso, é necessário a construção de uma agenda de diálogo com os agentes setoriais para a consolidação sustentável da cabotagem no Brasil”, sugeriu no requerimento.