Advogado recomenda cautela para que índices não gerem aumento de custos. Para Sinaval, percentuais de itens nacionais nos projetos merecem ser estudados com cuidado porque também há exemplos de metas abaixo da capacidade na parte de E&P
As discussões sobre como viabilizar novos projetos da indústria naval sem repetir erros cometidos em ciclos anteriores e alcançando bons níveis de competitividade continuarão na agenda do setor nos próximos meses. Rogério Campos, sócio da área marítima e portuária do Veirano Advogados, avalia que projetos na construção naval, inclusive fora do Brasil, enfrentam o desafio de encontrar um equilíbrio entre o apoio estatal mínimo necessário e índices de conteúdo local factíveis para que a indústria seja efetivamente competitiva.
O advogado considera que, se por um lado é uma decisão de Estado porque trata-se de uma indústria intensiva em mão de obra que gera valores relevantes, por outro requer esses incentivos para ser competitiva de forma internacional. Ele observa que países tradicionalmente fortes na indústria naval contam com apoio estatal de subsídios muito fortes. Campos recomenda cautela para uma eventual retomada das atividades de construção em estaleiros nacionais. “No passado, o Brasil fechou o mercado e forçou, via conteúdo local, a construção aqui que gerou preços mais altos e prazos mais longos na indústria internacional”, lembrou o advogado.
Para Campos, muitas lições parecem ter sido aprendidas e, tanto os órgãos de controladoria, quanto as empresas do setor estarão mais atentas às questões de gestão e de governança. “Não podemos repetir erros e colocar por decreto um conteúdo local inatingível, forçando renegociações como vimos no passado e/ou atrasos e aumento de custos dos projetos. Um atraso de entrada de operação de um FPSO causa prejuízos maiores ao país do que o aumento de conteúdo local exigido lá atrás”, analisou.
Ele alertou que, apesar das melhores intenções de aumentar o conteúdo local e a participação do mercado brasileiro e dos estaleiros, é importante haver um equilíbrio fino para fortalecer essa indústria, a qual considera estratégica e indutora de outras indústrias. “Se essas exigências passarem determinados patamares, começam a gerar aumento de custos, atrasos nas entregas e, na minha visão, o prejuízo do atraso de projetos de E&P é muito maior do que um eventual ganho de margem desse conteúdo local. É um equilíbrio complexo para essa indústria relevante para o país”, afirmou Campos.
O diretor da área marítima da Gallagher, Guilherme Mattoso, observa que o governo, ao assumir o apoio à construção naval como uma de suas bandeiras, sinaliza para a necessidade de expansão da frota da Transpetro, que hoje possui embarcações próprias, mas compõe parte dela com navios construídos no exterior. Ele lembrou que, durante o último ciclo da construção naval forte no país, os programas de expansão das frotas da Transpetro (Promef) e de apoio marítimo que atende a Petrobras (Prorefam) incentivaram a construção naval brasileira e a criação de estaleiros.
“Os estaleiros não estão 100% parados, estão com alguns reparos, pequenas obras e construções de menor porte. Se retomar o ‘Promef’, voltaremos a construir navios de grande porte e voltaremos a discutir a mão de obra, a necessidade de treinamentos e os equipamentos dos estaleiros”, projetou Mattoso.
O Sindicato Nacional da Indústria da Construção e Reparação Naval e Offshore (Sinaval) considera que as chances de reafirmação das atividades são reais, se a crescente demanda por novos navios e plataformas de petróleo for direcionada aos estaleiros brasileiros. A expectativa do sindicato é que a indústria atinja níveis comparáveis aos observados antes da desmobilização, que ocorreu por volta de 2014, quando a carteira de encomendas começou a minguar e a crise se instalou por quase uma década. O Sinaval reconhece que há muitos desafios a serem vencidos e que os próximos anos serão decisivos para a indústria naval e offshore se reerguer.
Para o Sinaval, essa questão do conteúdo local merece ser estudada com cuidado. “Concordamos que índices irreais, acima da capacidade da indústria brasileira como um todo — não só a indústria naval e offshore, mas também a indústria fornecedora de insumos e partes — não devem prevalecer. Mas, os índices atualmente em vigor para as atividades de exploração e produção de petróleo estão muito abaixo dessa capacidade. Acreditamos que o Conselho Nacional de Política Energética (CNPE), em breve, promoverá discussões no sentido da revisão dos índices atuais”, comentou o presidente do Sinaval, Ariovaldo Rocha.