Fortalecimento do setor é estratégico mundo afora; quando será para nós?
Por Claudio Medeiros – Presidente do Sindicato Nacional da Indústria da Construção Pesada-Infraestrutura (Sinicon)
Com a descoberta do pré-sal, em 2006, o Brasil colocou a retomada da indústria naval no centro da reindustrialização do país. Uma política industrial com elevados percentuais de nacionalização foi lançada, justificando que estaleiros fossem construídos e embarcações de alta complexidade fossem feitas no Brasil, gerando riqueza, empregos e conhecimento em território nacional.
Os “estaleiros virtuais”, assim chamados pelos críticos do passado, foram construídos através da grande capacidade técnica e associativa das empresas de engenharia brasileiras e transformados em complexos industriais de 5ª geração, padrão classe mundial. Sondas de perfuração para exploração do pré-sal, encomendadas pela Sete Brasil, já estavam em estágio final de construção quando o projeto foi subitamente interrompido devido a problemas do cliente.
Em 2014, surge a Operação Lava Jato, que em pouco tempo paralisou a indústria da construção pesada e rasgou uma importante política industrial no meio do jogo. Somente no Enseada, estaleiro localizado no Recôncavo Baiano, mais de 8.000 empregos diretos foram perdidos, deixando um investimento privado de cerca de US$ 1 bilhão, realizado por três construtoras brasileiras (Odebrecht, OAS e UTC, além da japonesa Kawasaki), sem nenhuma encomenda. Hoje, esse complexo industrial preserva sua vocação de construção naval & offshore, mas teve que realizar um reposicionamento estratégico que permitiu ultrapassar o momento de paralisia e distorções, alimentado por retrocessos como parte da lei 14.301/22, também conhecida como “BR do Mar”, e flexibilizações na política de conteúdo local, que resultaram na transferência das encomendas para o exterior e, consequentemente, na perda de milhares de empregos no Brasil.
Em recente reunião no gabinete da Vice-Presidência da República, o presidente da Transpetro, Sergio Bacci, revelou que 100% da frota da companhia, hoje formada por 25 navios —no passado chegou a 70— são de fabricação brasileira, o que demonstra a capacidade e importância da indústria naval como geradora de riqueza e garantia da soberania nacional. Por outro lado, decisões tomadas no passado fizeram com que a Petrobras tenha hoje 120 navios de bandeira estrangeira, com tripulantes estrangeiros, navegando em águas brasileiras.
Enquanto alguns formadores de opinião seguem estritamente alinhados aos interesses internacionais, criticando a decisão política anunciada em 2023 pelo governo federal de retomada da indústria naval, países como Estados Unidos, Japão, China, Coreia do Sul, Singapura, Dinamarca, Noruega, Austrália e Índia reforçam políticas que asseguram o fortalecimento da construção naval em seus territórios. É estratégico para eles. Quando será para nós?
O Brasil já demonstrou que tem competência técnica e mão de obra produtiva e de qualidade para ser um “player” neste mercado, como nas construções da P59, P60 e PRA-1, todas realizadas no Recôncavo Baiano com elevados índices de nacionalização. Cabe agora enfrentar o que está fora dos muros dos estaleiros, o chamado “custo Brasil” (trabalhista, ambiental, tributário etc.) e sedimentar o fortalecimento desta indústria numa perspectiva de longo prazo, com previsibilidade de demanda, escala, taxas competitivas e subsídios —como os que a indústria automobilística conta há quase 50 anos no Brasil. O Brasil é capaz.