Percepção é que mercado deve se aquecer em menos de 5 anos e diversificar portfólio dos principais players da construção naval. Setor aguarda definições sobre regras e defende política que aumente competitividade para construção de embarcações de suporte a esse segmento.
O aumento do número de projetos de parques eólicos offshore no Brasil vem cada vez mais despertando a atenção de estaleiros nacionais. A expectativa do setor é que, num horizonte de cinco anos, o segmento esteja aquecido e demandando novas oportunidades para a indústria naval, principalmente para as instalações próximas ao estado onde o estaleiro está localizado. A avaliação dos construtores é que haverá oportunidades para diversificar as atividades, que nos últimos anos sofreram com a escassez de grandes construções e hoje ainda estão muito baseadas em reparos.
O Estaleiro Atlântico Sul (EAS) enxerga o mercado ainda na fase de prospecção pelos operadores e grandes empresas já com projetos em desenvolvimento. A avaliação, porém, é que ainda existem questões a serem resolvidas, como a conexão das linhas de transmissão de energia, o tipo de base que as torres terão (concreto, flutuadores, jaqueta ou outros) e a comparação entre os custos de instalação onshore versus offshore. A expectativa do EAS é que esses projetos se tornem realidade em menos de cinco anos.
A CEO do EAS, Nicole Terpins, observa que o mercado eólico offshore vem apresentando um relevante progresso nos últimos meses, principalmente com a discussão do projeto de lei 576/2021, que define regras para a exploração e desenvolvimento da geração de energia a partir de fontes offshore. Esse PL atualmente se encontra em discussão na Comissão de Infraestrutura do Senado Federal.
Nicole destacou que o EAS conta uma estrutura fabril capaz de produzir equipamentos tanto para as eólicas onshore quanto para as offshore (torres e estruturas de fundação), com processos de fabricação e pessoal capacitado. Ela acrescentou que a localização do estaleiro com acesso ao mar se torna uma vantagem relevante do ponto de vista logístico, tanto para recebimento de matérias-primas quanto para a expedição de produtos acabados. “Com a grande capacidade de içamento de nossos pórticos Goliath, podemos carregar estas estruturas prontas diretamente de nosso cais para balsas ou embarcações heavy lift”, disse Nicole.
Atualmente existem cerca de 55 projetos (130 GW) em processo de licenciamento ambiental no Ibama. Apesar da maioria estar em fase preliminar, o EAS vem analisando todos os projetos para uma definição mais detalhada sobre as prioridades. A presidente do estaleiro contou que algumas empresas já visitaram as instalações do estaleiro com foco tanto na fabricação das torres como das estruturas de base para essas estruturas. “Os próximos passos que esperamos serão a realização de leilões específicos para a fonte offshore, detalhamento sobre o uso de bens da União, mediante outorgas e o alinhamento com um futuro marco legal para o hidrogênio verde”, analisou Nicole.
A direção do EAS acredita que as atividades relacionadas ao offshore, entre elas o descomissionamento de plataformas, podem naturalmente crescer, juntamente com os demais produtos e serviços do estaleiro, por não concorrerem diretamente com a capacidade de fabricação disponível. “Essa diversificação pode ser positiva para manter uma estabilidade da ocupação fabril ao longo dos anos, por conta de eventuais sazonalidades dos ramos de negócio”, explicou Nicole.
A leitura, num primeiro momento, é que ainda serão realizados leilões específicos pelo governo e que os agentes ainda buscarão baratear o custo da geração e dos equipamentos para esses projetos. As instalações eólicas offshore hoje podem ter torres maiores que os empreendimentos em terra, porém existem requisitos que podem encarecer o custo do projeto e da energia. A avaliação é que usinas mais próximas da costa, por exemplo, facilitam a ligação com mercados consumidores.
O diretor operacional da Ecovix, Ricardo Ávila, observa que o Rio Grande do Sul possui capacidade em áreas de profundidade de até 50 metros, segundo alguns estudos e o Plano Nacional de Energia. Ávila contou que a Ecovix olha para oportunidades de construção e logística das estruturas para os parques offshore, assim como para atuar como uma base de apoio à operação e à manutenção desses ativos. O Estaleiro Rio Grande (RS) recebeu visitas de empresas interessadas, mas a Ecovix acredita que a demanda deva se materializar entre 2023 e 2024.
Ele adiantou que o perfil dos interessados é de players internacionais da área de energia que estão licenciando e desenvolvendo esses parques, ou que tenham projetos no estado. A empresa vê competitividade do ERG principalmente em projetos no Rio Grande do Sul por causa da proximidade. Ele acredita que esse segmento abra o campo para estaleiros de outras regiões, como o EAS (PE) e o Enseada (BA), no Nordeste. “Não tem volta. Esse mercado vai se desenvolver pela necessidade de energia limpa”, comentou.
Ávila ressaltou que, assim como a região Nordeste, os estados do Sul têm grande potencial de projetos de parques eólicos no mar, o que torna esse mercado bastante promissor. Apesar de existirem empresas especializadas em outros mercados, como Europa e Ásia, Ávila identifica possíveis demandas para novas embarcações e para construção e montagem das torres. A fundação delas, dependendo dos estudos sobre solo, poderá ser executada em diferentes tipos de bases.
O diretor operacional da Ecovix observa que as embarcações que apoiam a construção e a montagem dos parques são de porte relativamente grande e que não existem muitas disponíveis no mundo atualmente. Ele contou que ouviu de um player desse mercado que a construção de torres está com poucas janelas, o que, numa primeira análise, poderia representar uma demanda para utilização de embarcações desse tipo. Um dos parques que pediram licença ao Ibama, citou, prevê a instalação de 480 turbinas, cuja instalação em águas rasas deverá precisar de grandes embarcações e guindastes.
O Sindicato Nacional da Indústria da Construção e Reparação Naval e Offshore (Sinaval) também informou que mantém conversas com players para entender de que forma o setor pode aproveitar suas instalações para atender projetos para geração de energia a partir dos ventos no mar, desde as estruturas das torres até a construção de embarcações de apoio a esse segmento. Uma das possíveis demandas são embarcações para lançamento de linhas para interligar as torres no mar ao continente e embarcações para levar essas grandes estruturas para o alto-mar.
O vice-presidente executivo do Sinaval, Sérgio Bacci, considera que pode ser um caminho para novos negócios na indústria naval, porém é preciso garantir uma política pública e condições competitivas para que os estaleiros reúnam condições para competir por projetos, principalmente em relação aos custos para embarcações de suporte aos parques. “Os otimistas dizem, com base no estudo da EPE (Empresa de Pesquisa Energética) que fala das demandas (‘road map’ eólicas offshore), que é possível ter uma demanda grande de embarcações de apoio, parecido com o que houve para o petróleo. Precisamos garantir que isso seja feito no Brasil”, ponderou Bacci.