A Transpetro estudará, até o final do primeiro semestre, as condições e as características dos navios para a ampliação da frota da companhia. O prazo de dois meses foi definido para o grupo de trabalho, criado na primeira reunião da nova diretoria realizada no final de abril. O GT fará um levantamento sobre as demandas necessárias de navios, quais os estaleiros que podem construí-los e os respectivos custos. O presidente da Transpetro, Sérgio Bacci, enfatizou que a decisão de construir em estaleiros nacionais será tomada de forma responsável
“O Brasil tem pressa, precisamos gerar empregos no país. Vamos construir navios no Brasil, mas não será a qualquer preço e a qualquer prazo. Temos que ter parâmetros para construir esses navios sem ter problemas”, reforçou Bacci, durante sua primeira coletiva de imprensa, no começo de maio, na sede da Transpetro, no Rio de Janeiro.
Na ocasião, Bacci chamou a atenção para que, apesar de a produção de petróleo ter aumentado no país nas últimas décadas, a frota da Transpetro hoje totaliza 26 navios próprios, de cabotagem e de longo curso — menos da metade dos 57 navios que havia a partir de 1997, período em que a produção de petróleo no Brasil sofreu aumento significante.
Os 26 navios em operação correspondem às entregas do Programa de Modernização e Expansão da Frota da Transpetro (Promef). “Se não fosse o Promef, muito possivelmente a Transpetro não teria absolutamente nenhum navio. Isso mostra a importância de construir navio no Brasil”, salientou Bacci, que foi secretário de fomento para ações de transportes no Ministério dos Transportes no primeiro mandato de Lula (2003-2006) e atualmente ocupava o cargo de vice-presidente executivo do Sindicato Nacional da Indústria da Construção e Reparação Naval e Offshore (Sinaval).
Ele ponderou que a Transpetro seguirá as orientações que vierem da Petrobras, sua controladora, e, consequentemente do governo federal, principal acionista da companhia. “Estamos conversando para entrar no hall de prioridades do governo federal que o presidente Lula deve anunciar em breve”, adiantou.
Além do GT, a Transpetro também se juntará à Petrobras numa comissão mista montada pela companhia e o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) para discutir financiamentos. Bacci salientou que as embarcações demandarão recursos do Fundo da Marinha Mercante (FMM), principal instrumento de fomento setorial para financiar a indústria naval e a marinha mercante brasileira.
As conversas abertas são no sentido de identificar quais tipos de navios são necessários para atender a Petrobras. A idade média da frota da Transpetro atualmente é de oito anos, sendo que um petroleiro costuma operar, em média, entre 20 e 25 anos. Além dos 26 navios de cabotagem e longo curso próprios, a Transpetro conta com 10 navios aliviadores (shuttle tankers) afretados do exterior. Bacci disse que a disponibilidade de navios específicos como esse na bandeira brasileira seria importante para dar segurança para o transporte da produção das plataformas marítimas para o continente, sobretudo em caso de algum problema na oferta dessas embarcações estrangeiras.
A Transpetro opera navios para produtos claros e produtos escuros, além de navios de longo curso que levam petróleo cru ou combustível refinado para o exterior e opera aliviadores. A expectativa, segundo Bacci, é que a incorporação futura de navios de bandeira nacional à frota reduza os custos com afretamento de navios de bandeira estrangeira. “Se construirmos navios para atender à Petrobras, vamos interferir no preço do afretamento. Mais demanda, interferimos diretamente no preço desses afretamentos. O motivo econômico é razoável”, defendeu.
Ele explicou que hoje a frota da Transpetro atende basicamente a Petrobras, que continuará a ser seu principal cliente, fortalecendo o papel da subsidiária de braço logístico da controladora. Bacci mencionou que a Transpetro possui um contrato de afretamento para operação de um navio na rota Coari-Manaus. O presidente da Transpetro ressaltou que foi uma oportunidade identificada para um navio que estava ocioso. “Cliente para utilizar navios no Brasil não faltam, existem várias operadoras que precisam de navios. Podemos contribuir com a Petrobras para reduzir custo de afretamento que ela tem com terceiros”, avaliou.
Nos primeiros dias de sua gestão, Bacci se reuniu, em Brasília, com representantes da Controladoria-Geral da União (CGU) e do Tribunal de Contas da União (TCU). O objetivo do encontro foi pedir aos órgãos de controle um parecer sobre a situação dos estaleiros nacionais para uma eventual participação em concorrências futuras para a construção de navios da frota da subsidiária da Petrobras.
Ele destacou que essa primeira viagem dele na presidência foi para conversar para que os órgãos de controle acompanhem de perto os projetos de construção de navios, desde o marco zero, a fim de evitar quaisquer irregularidades. “Temos condição de construir esses navios sem nenhum tipo de problema. As duas instituições se colocaram à disposição para fazer o acompanhamento do projeto de construção de navios”, afirmou na coletiva.
Bacci contou que apresentou uma lista com os nomes de potenciais estaleiros que podem se interessar em participar de processos licitatórios. A lista apresentada inclui empresas e estaleiros instalados em diferentes regiões do país, como EAS (PE), Enseada (BA), Vard Promar (PE), grupo Synergy (RJ), Ecovix (RS), QGI (RS), EBR (RS), Mauá (RJ), Jurong (ES) e KeppelFels (RJ). “[Os órgãos de controle] Ficaram de fazer uma análise e dizer quais processos vão poder andar. Possivelmente, pode ter um ou outro (estaleiro) que não possa recorrer. É uma decisão da CGU”, ressaltou.
O presidente da Transpetro disse que, durante a reunião com os representantes da CGU e do TCU, foram discutidos os modelos adotados pela Marinha do Brasil nos processos para obtenção do navio de apoio Antártico (NapAnt) e das quatro fragatas classe Tamandaré (PFCT). Segundo Bacci, os órgãos consideram exitoso o modelo da força naval, que é aberto com sondagens de mercado (RFI — request for information) e com a formação de uma sociedade de propósito específico (SPE) para assinatura e execução do contrato.
Ele pediu para os membros do grupo de trabalho (GT) da Transpetro que estuda as possibilidades para a volta da construção de navios da companhia no Brasil que se reúnam com representantes da Marinha do Brasil para ter uma melhor compreensão do que foi feito nesses processos recentes.
O governo voltará a discutir a questão do conteúdo local para projetos da indústria naval e offshore. O presidente da Transpetro observa a necessidade de uma revisão dos percentuais, de forma a adequá-los aos tipos de projetos e ao momento atual dos estaleiros e da cadeia de suprimentos, que foi desmobilizada nos últimos 10 anos. Ele ponderou que a decisão passa pelas instâncias de governo e pela Petrobras, mas disse que pode sugerir que seja adotado um modelo de escalonamento desses índices que dê tempo para atração da indústria de navipeças para o Brasil e torná-la sólida.
Bacci simulou que um índice de 65% para uma sonda, por exemplo, dificilmente seria alcançado no curto prazo porque a indústria de navipeças ainda não estaria recomposta novamente. Ele propõe que seria necessário começar com índices menores e reavaliá-los de tempos em tempos, conforme as características de evolução da cadeia de suprimentos e do perfil de equipamentos das sondas, petroleiros, gaseiros, barcos de apoio marítimo, balsas e outros tipos de embarcações.
O presidente da Transpetro contou que a Casa Civil está trabalhando no tema da retomada da construção naval sob a ótica da geração de empregos. Ele considera o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) um entusiasta dessa indústria, que é tema recorrente nas agendas dele no estado do Rio de Janeiro. “Hoje, a indústria naval é um segmento da economia que pode ajudar muito na questão do emprego”, afirmou Bacci.
Segundo ele, a CGU está disposta a dialogar para buscar soluções para que estaleiros brasileiros possam novamente construir embarcações no Brasil. Ele afirmou que os órgãos de controle estão convencidos de que é preciso virar a página e lembrou que muitas das empresas investigadas na Lava Jato fecharam acordos de leniência e regularizaram suas situações. Bacci acrescentou que órgãos de controle e empresas hoje possuem sistemas de governanças rígidos que ajudam a evitar possíveis problemas de desvios.
A Transpetro possui um comitê independente que analisa processos de fornecedores e aprimorou processos para evitar problemas no futuro, com utilização de due diligences para saber quais fornecedores apresentam problemas e se entregam dentro do prazo. “O processo que o país passou nos últimos anos ajudou a construir essa governança para evitar problemas no futuro. Estamos muito melhor calçados do que estivemos no passado”, garantiu. Bacci acrescentou que o BNDES vai avaliar as situações das empresas na hora de decidir sobre o financiamento dos projetos.
Ele valia que a diferença de agora em relação à época do Promef é a história e o aprendizado. “Ao chamar CGU e TCU, damos um recado concreto de que não queremos ter problemas. Precisamos construir uma política industrial de longo prazo no país, e ela passa pela indústria naval. O setor dificilmente se recompõe se tiver problema. Queremos ter um programa de construção de navios do ponto de vista econômico, da necessidade e dos controles. Esta é a grande diferença do passado”, frisou.
O GT da Transpetro que estuda a demanda e as condições para construção de navios no Brasil também prevê que os futuros projetos de contratação incluam no escopo tecnologias verdes de navegação. O presidente da empresa disse ainda que as mudanças na indústria marítima mundial estão ocorrendo rapidamente e que o GT criado pela nova diretoria buscará soluções sustentáveis para a ampliação de sua frota. Bacci ressaltou que a Transpetro já adotou uma série de intervenções na frota para reduzir emissões, como pintura que reduz atritos com o mar, além de equipamentos específicos e da análise criteriosa por meio de sistemas para que a rota do navio reduza o consumo de combustível.
Ele explicou que somente as modificações já feitas em grande parte dos 26 navios próprios da frota a Transpetro economizou o equivalente às emissões de dois navios pelo período de um ano — como se, neste período, duas embarcações operassem com nível zero de emissões de poluentes. “Temos um caminho longo para perseguir para que tenhamos efetivamente uma frota verde na Transpetro e que possamos ser exemplo para outras operadoras no Brasil”, disse.
Bacci enfatizou que o meio ambiente também está na pauta do novo governo e da Petrobras, controladora da Transpetro. “O mundo está preocupado com a redução de emissões de gás de efeito estufa e devemos incorporar essa questão. Por isso, o projeto de contratação dos futuros navios prevê que eles terão tecnologias verdes de navegação”, afirmou.